A lei existe mas um mercado de trabalho inclusivo para pessoas com deficiência (ainda) não

As políticas de inclusão vão aos poucos sendo abraçadas pelas empresas, mas ainda há um longo caminho a percorrer para que os cidadãos com deficiência ganhem um lugar inquestionável nas estruturas corporativas.

 

Por Fábio Alves, Consultor, Michael Page

 

Desde o início de 2019 que todas as empresas públicas e privadas de média e grande dimensão estão legalmente obrigadas a contratar pessoas com deficiência. Embora muitos discutam, e até contestem, a necessidade de impor quotas para pôr fim às discriminações que se verificam no mercado laboral, o certo é que, não prevalecendo o bom senso, esta medida legislativa acaba por se assumir como essencial para fazer justiça e corrigir o status quo desde há muito instalado mas, sobretudo, alertar as consciências.

É que, em Portugal, existem qualquer coisa como 1,9 milhões de deficientes, muitos deles mais do que válidos trabalhadores que podem e devem dar um contributo fundamental para a evolução da sociedade e a progressão da economia, sendo, portanto, óbvio que as políticas de igualdade e inclusão, a todos os níveis, têm de sair do papel e colocadas rapidamente em prática.

Atingir, até 2030, o emprego pleno e produtivo e o trabalho decente para todas as mulheres e homens, inclusive para as pessoas com deficiência, é um dos objectivos de desenvolvimento sustentável das Nações Unidas, e não se trata apenas de uma prioridade a nível global. A revitalização económica em Portugal passa pela promoção de políticas que incentivem o empreendedorismo e a criação de empregos de forma sustentável e inclusiva, nas quais as pessoas com deficiência têm um papel activo e relevante no caminho da estabilidade e sustentabilidade do país.

O relatório “Pessoas com Deficiência em Portugal – Indicadores de Direitos Humanos 2018” mostra um retrato da situação. De acordo com este documento, apresentado em Dezembro de 2018 pelo Observatório da Deficiência e Direitos Humanos, em 2017 havia cerca de 13 mil pessoas com deficiência inscritas em situação de desemprego nos centros de emprego, registando-se um aumento de 24% face a 2011, dados que, aliás, contrastam em absoluto com a queda acentuada do desemprego registado na população geral: reduziu 34,5% entre 2011 (576 383 inscritos) e 2017 (377 791 inscritos).

Tendo em conta estes números, talvez daí se explique o facto de, em 2019, segundo o Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), apenas 28 entidades, na sua maioria empresas, autarquias e organismos de economia social, tenham obtido a distinção de Marca Entidade Empregadora Inclusiva, atribuída aos empregadores que contribuíram para a implementação de um mercado de trabalho inclusivo e que se distinguiram por práticas de referência em domínios como o recrutamento, desenvolvimento e progressão profissional, manutenção e retoma do emprego, acessibilidades, serviço e relação com a comunidade.

Em resumo, a questão da inclusão de deficientes no mercado de trabalho e a necessidade de legislar em seu favor deveria ser um não-assunto de tão obrigatório que é.

Realço que não basta legislar mas, sobretudo, mudar mentalidades em todos os campos da sociedade. Só a partir daí é que passaremos a olhar para os portadores de qualquer tipo de deficiência ou incapacidade de igual para igual. Nem que seja para se atingir uma das metas do Programa Operacional Inclusão Social e Emprego, um instrumento do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, que, até 2023, pretende integrar 39 700 participantes com deficiência e incapacidade em ações de reabilitação profissional.

 

Ler Mais