Alexandra Barosa, ABP Corporate Coaching: Liderança, reinar para dividir?!

A liderança consegue facilmente assumir poder sobre a inteligência colectiva, pois temos indivíduos que, apesar de cada vez mais qualificados, contraditoriamente, não têm tempo para questionar, aprender e agir. Os líderes que ambicionam promover o bem-estar de todos são os que promovem o (auto)questionamento.

 

Por Alexandra Barosa, directora Executiva do curso de Coaching Executivo da Nova SBE e managing partner da ABP Corporate Coaching

 

Recentemente, ocorreu em Portugal um incidente entre a polícia e um indivíduo em perseguição que terminou tragicamente numa morte. Rapidamente comecei a receber mensagens de amigos, em diferentes locais do mundo, transmitindo muita indignação perante o racismo crescente que se estava a instalar em Portugal. De facto, assistimos, no espaço público, aos líderes políticos a utilizarem este caso para defenderem as suas ideias extremadas.

O mesmo fenómeno aconteceu quando Vladimir Putin utilizou credos e convicções para iniciar uma guerra, quando os líderes de Israel e da Palestina alegaram propriedade de território em nome de religiões, ou quando Donald Trump comunicou que, em Springfield, os imigrantes comiam animais de estimação.

Nunca a máxima “dividir para reinar” teve tantos exemplos práticos. E arrisco-me a dizer que está a ir ainda mais além – os líderes estão neste momento a querer reinar para dividir!

Podemos questionar se este estilo de liderança é ético, mas é legítimo e, com os recursos adequados, muito mais fácil. Por recursos, entenda-se a acessibilidade a canais de comunicação onde a informação circula agora a um ritmo exponencial – as redes sociais. E, por isso, é tão importante fazer circular diariamente mensagens populistas no Twitter/X ou no TikTok. Mensagens que todos compreendem e não questionam.

Estes exemplos retratam realidades concretas de como a liderança consegue facilmente assumir poder sobre a inteligência colectiva utilizando para tal ameaças a cinco necessidades essenciais que os indivíduos tentam a todo o custo proteger. Os líderes conseguem conduzir os indivíduos à resistência à mudança para a inclusão mediante mensagens que indiquem ameaças às necessidades de estabilidade, equidade, interacção, autonomia e reconhecimento.

Estudos também comprovam que a dor de perder é duas vezes mais forte do que o prazer em ganhar algo. Através de mensagens que indiciam a perda de alguma dessas necessidades, contribuem para a divisão e o confronto entre indivíduos, entre comunidades, entre povos e nações. É fácil! E assim também será fácil reinar para continuar a dividir e para manter interesses próprios ou de apenas alguns sob o controlo desejado. Será sempre uma maçada quando, em alturas em que indivíduos estão mais informados, estes começam a questionar o exercício do poder.

Em tempos de excesso de estímulos, a liderança de controlo, através de um poder polarizado entre “o eu” e “os outros”, limita o poder da diversidade da inteligência colectiva, conduzindo-a em pólos extremos perante o desconforto e o medo.

Vivemos tempos complexos, em que temos indivíduos cada vez mais qualificados, mas em que a aceleração dos tempos não lhes permite, contraditoriamente, questionar, aprender e agir. Quantos de nós vamos investigar a informação para a interpretarmos e construirmos o conhecimento? Quantos fomos investigar de que forma incidentes acontecem no exercício de um trabalho policial, independentemente da cor da pele das vítimas? Quantos de nós nos questionamos que outras razões podem estar na origem de guerras entre Estados? Ou quantos exploram porque é tão importante reinar?

Quando a (des)informação é facilmente acedida por todos os líderes da esfera pública ou privada, que ambicionam uma mentalidade que promova a sustentabilidade com vista ao bem-estar de todos são os que promovem o (auto)questionamento, anunciam transformações, mas também reforçam o que permanecerá igual, e, incentivando a educação e o debate para conhecimentos divergentes, suavizam os impactos da perda e promovem o equilíbrio das necessidades essências na procura de fazer e ser diferente.

E, depois, existem os outros líderes também…

 

Este artigo foi publicado na edição de Novembro (nº. 167) da Human Resources, nas bancas.

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