Ana Rita Lopes, Delta Cafés: Depois da tempestade, o anticiclone

Mais do que uma tempestade que passou, temos agora o desafio de gerir o anticiclone que veio para ficar. Mas será que as organizações já investiram tempo para perceber do que realmente precisam para os próximos tempos?

 

Por Ana Rita Lopes, directora central de Recursos Humanos do Grupo Nabeiro/ Delta Cafés

 

Muitos têm sido os fóruns e os debates sobre o novo normal. As discussões veiculam mais ou menos os mesmos temas: será que o regime de trabalho mais ajustado é o presencial, o remoto ou o híbrido? Será que temos os espaços de trabalho mais ajustados às novas formas de trabalho?

Cada empresa terá já nesta altura adaptado um ou mais modelos, com mais ou menos flexibilidade, e terá já algumas evidências do impacto dessa opção na satisfação dos seus colaboradores e na atracção do talento no mercado.

Quanto aos espaços, algumas empresas repensaram por consequência o seu espaço físico, não só optimizando-o como também investindo em espaços com ambientes variados, consoante as necessidades das equipas actualmente: espaços de colaboração, espaços de concentração, de lazer ou social, de descanso ou meditação, etc.

Há ainda fóruns onde o tema central é o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. E nesta matéria várias têm sido as iniciativas para promover a saúde e bem–estar dos colaboradores, entre acções ligadas à nutrição e hábitos de alimentação saudável, parcerias para apoio psicológico, rastreios à saúde, iniciativas de bem- -estar de desenvolvimento pessoal ou promotoras de uma socialização entre colegas, num contributo para formas de vida mais sustentáveis e conscientes.

Mas será que depois da sucessão de acontecimentos e imprevistos com os quais fomos todos confrontados nos últimos anos, teremos já evidências do impacto destas alterações para perceber do que realmente precisam as nossas organizações para os próximos tempos e se estamos na orientação certa? Que desafios esta nova realidade traz para as nossas organizações, para os nossos líderes e para as áreas de Gestão de Pessoas?

Uma certeza que temos hoje é de que iremos continuar a gerir num mundo de constante mudança e de incerteza permanente, onde a gestão do imprevisto fará seguramente parte do dia-a-dia das organizações. E, perante isto, as organizações têm de estar preparadas para este desafio, para antecipar e não apenas reagir.

As hard skills continuarão a ser críticas para desempenhar uma função ou apresentar um nível de expertise, mas serão as soft skills, como a flexibilidade cognitiva, a capacidade analítica ou a capacidade de antecipar soluções, as competências que vão marcar a diferença nos próximos tempos. São transversais a todos os níveis hierárquicos e a toda a tipologia de actividades, e serão determinantes para definir a transformação, o futuro e o sucesso das empresas, constituindo também uma fonte de atracção de talento mais eficaz.

E o que é considerado talento nestas novas gerações e neste “novo normal”? São os alunos que se distinguem no seu percurso académico ou aqueles que mais se adaptam a qualquer contexto, aqueles que conseguem propor soluções com os dados de que dispõem a cada momento, que trabalham em vários contextos e agarram as oportunidades resistindo às adversidades? Cada vez mais, as médias finais de curso são um referencial de observação, mas apenas um ponto entre tantas outros factores, como sejam as competências a avaliar em simulações ou casos de análise e que poderão determinar a adaptação ou não ao contexto empresarial.

E os líderes? Estarão todos certos para onde têm de remar, sabendo como mudar o rumo de forma ágil, caso necessário? Constroem pontes entre si ou preferem viver na sua ilha? Temos líderes que precisam de um chefe que lhes mostra o caminho a cada momento? Ou em grupo desbravam o caminho e escrevem o futuro?

Também nesta área, as organizações estão a investir no desenvolvimento e adaptação dos seus líderes, nos vários níveis da organização, responsabilizando-os individualmente e tentando dotá-los das competências necessárias para desenvolver as suas equipas e serem promotores deste reforço de forma conjunta e coesa.

Para debater estas e outras questões, os gestores de Recursos Humanos têm um papel fundamental, não só em provocar o debate como em unir todos estes temas. A reflexão e discussão sobre estas temáticas é fundamental para que possam ser encontradas acções que permitam desenvolver as pessoas e as organizações, no sentido de fazer face ao futuro incerto ao desafiante. Desenvolver acções que tornem a organização mais ágil e robusta. Começámos um processo, mas ainda temos muito trilho para caminhar.

 

Este artigo foi publicado na edição de Julho (n.º 139) da Human Resources, nas bancas.

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