Andreia Rangel, Deloitte: «Alargar a atracção de talento a outras geografias vai ser um dos grandes desafios das empresas»

Como todas as empresas, a Deloitte teve que ajustar os seus processos e práticas como resposta aos condicionalismos trazidos pela pandemia, mas numa óptica em que as pessoas estão sempre no centro da experiência. Assumindo como uma espécie de mantra a expressão “You will never work alone”, quer que os colaboradores saibam que nunca trabalharão sozinhos.

 

Desde sempre que a Deloitte tem pautado a sua existência e actuação de acordo com um propósito, pretendendo causar um impacto que genuinamente faça a diferença junto dos seus clientes e dos seus colaboradores, logo no primeiro contacto. E durante o actual contexto de pandemia tem conseguido, através de valores como a inclusão, a colaboração e o cuidar de todos, ir ultrapassando os desafios e dificuldades inesperadas que se lhe foram apresentando.

A imprevisibilidade exigiu da empresa uma rápida adaptação, exigência essa que se estendeu a cada um dos seus colaboradores. Mas Andreia Rangel, head of People da Deloitte, garante que não só estiveram à altura do desafio, como os «tornou muito mais conscientes e muito mais unidos, o que trouxe uma maior proximidade e confiança à organização. A adversidade fez com que nos preocupássemos de uma forma ainda mais genuína uns com os outros», afirma.

Outro factor positivo que se pode retirar da pandemia é que funcionou como incentivador e promotor da aceleração da transformação digital e de novos modelos de trabalho, caminho transformador esse que a Deloitte já vinha a percorrer. Curiosamente, duas semanas antes do primeiro confinamento, tinham anunciado a possibilidade de todos os colaboradores poderem trabalhar um dia por semana fora das instalações da empresa. «Claro que com a COVID-19 passámos a estar todos a trabalhar desde casa, o que, de um ponto de vista tático, levou à criação de uma task force especial para garantir que todos tinham os meios necessários para continuar a trabalhar com a mesma produtividade, conforto e segurança», conta a responsável. «Isso exigiu muita disciplina, mas também muita flexibilidade e agilidade.»

Num momento inicial, e porque não existia, de facto, nenhuma preparação para os altos níveis de imprevisibilidade que se vieram a verificar, foi preciso haver alguma relativização. Andreia Rangel explica: «Fez com que a Deloitte, uma empresa super organizada e muito rigorosa, se tornasse de alguma forma mais pragmática, o que se percebe na forma como a empresa interage agora internamente. E aquilo que, num primeiro momento, surgiu como um desafio, tornou-se uma oportunidade que, de uma forma genuína, ajudou a cimentar a confiança e a aceitar a imprevisibilidade de uma forma muito mais natural, tornando-nos muito mais resilientes. Este é um “músculo” que tem vindo a ser trabalhado ao longo do último ano e que nos mostra o quão diferente está hoje a organização.»

Claro que foi preciso ultrapassar desafios. A head of People identifica dois principais: garantir a segurança e saúde de todos e a conexão e proximidade. Explica: «A partir do momento em que, de forma repentina e inesperada, o trabalho remoto tomou conta da organização, foi um desafio para a Deloitte, pois recebemos anualmente centenas de novos colaboradores – só analistas foram 400 –, e são pessoas que temos que impactar, assim como as equipas que antes estavam presencialmente nos escritórios. Temos mantido a proximidade através de novos processos virtuais.»

Por outro lado, e «com a convicção de que para o sucesso, a produtividade, a criatividade e a inovação é necessário que as pessoas se sintam bem consigo mesmas, a preocupação com a saúde e o bem-estar dos colaboradores mantém-se como prioritária», realça. «Acreditamos que é preciso estimular os colaboradores para que atinjam o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal, ou seja, lembrando-os que é preciso tirarem tempo para desligar. Tivemos o cuidado de, no modelo virtual, fazer com que os colaboradores tivessem consciência da necessidade absoluta de gerirem o seu tempo, investindo em si próprios, de modo a que o retorno fosse muito mais positivo.»

Neste sentido, em Janeiro, a Deloitte lançou o “People First Program”, que veio «reforçar ainda mais a cultura organizacional, fazendo com que os colaboradores se sintam conectados com a empresa e percebam que a Deloitte não deixa ninguém perdido ou para trás. Através deste programa são disponibilizadas iniciativas de aconselhamento psicológico, financeiro, jurídico/legal, coaching, entre outros», explica Andreia Rangel.

 

Remodelar a experiência para o virtual
Estas acções acabam por reforçar a experiência do colaborador, tendo em conta as suas necessidades neste novo contexto. Assim, também o plano estratégico de Employer Branding da Deloitte foi revisto, com o acentuar dos esforços em termos de employee experience, e não só. A responsável exemplifica: «Em Julho de 2020 a Deloitte reforçou a sua oferta de benefícios, proporcionando a todos os colaboradores a oportunidade de os adequar às suas necessidades, ou seja, demos a possibilidade de uma personalização dos benefícios. Como temos connosco diferentes gerações, de facto acreditamos no princípio de que “one size fits one”.» Entre os novos benefícios contam-se por exemplo a possibilidade de ter mais cinco dias de férias por ano.

O desafio aumenta quando se trata de novas contratações. E, em 2021, a Deloitte espera contratar cerca de 1000 profissionais. O onboarding, ou seja, a integração e acompanhamento dos novos talentos, desde há um ano que é feito através de um conjunto de acções virtuais, «remodelando-se toda a experiência para um formato digital. Planeámos uma agenda muito robusta com meet-ups, newsletters e acções com diferentes líderes da organização para partilharem quem são além de profissionais da Deloitte, com a finalidade precisamente de criar um momento de proximidade. Tudo foi repensado numa óptica em que as pessoas estão sempre no centro da experiência», sublinha Andreia Rangel.

O mesmo é válido quando se trata de atrair talento. A Deloitte tem parcerias estabelecidas com a maior parte das universidades nacionais, mantendo essa actividade de uma forma regular, mas agora de uma forma virtual. «Em Maio foi organizada a primeira “Deloitte Tech Week”, de forma a atrair jovens talentos nas áreas de tecnologia e mostrar que somos uma empresa tech», partilha. «No Verão, realizámos os habituais estágios, ainda que numa versão mais curta e digital; e revisitámos o nosso programa de recrutamento de recém-graduados para as áreas de business e tecnologia, apelidado de “Deloitte Journey”, e que se efectuou totalmente em formato virtual também.» Os resultados «foram excelentes», com uma vantagem: «Alargámos o nosso campo de atracção de talento a outras geografias, algo que nos parece vai ser um dos grandes desafios das empresas no futuro.»

Assim, apesar do contexto não ser favorável e de a complexidade ter sem dúvida aumentado, a head of People garante que, na Deloitte, «passados os primeiros seis meses, onde tudo era novo e inesperado, a verdade é que tudo está a correr bem. Mas começamos a sentir que as pessoas têm muitas saudades da conexão e da proximidade com os colegas», ressalva. Isto levou à criação de “comunidades virtuais” de acordo com três interesses: “Working Parents”, “D.Runners” e “Wellbeing”, para promover uma «organização muito mais autêntica, em que as pessoas possam ser elas próprias».

Para ter a certeza de que está no bom caminho, a Deloitte faz questão de ouvir os seus colaboradores. Para isso, realiza um survey e cria focus-groups, para perceber como está a ser a experiência de trabalho nesta realidade remota. «Queremos que as pessoas sejam uma voz activa e que tragam para a empresa as suas próprias ideias, que possam ser implementadas e lideradas por essas mesmas pessoas.»

 

Uma nova liderança
Estas mudanças e adaptações motivadas pela pandemia só foram bem sucedidas – como Andreia Rangel reitera – porque as lideranças foram capazes de transformar a forma como trabalham. «A verdade é que toda esta nova realidade nos fez repensar que estilo de liderança queremos implementar na empresa e qual o nosso objectivo, que se manteve inalterado: reforçar a proximidade, conexão e agilidade na comunicação com as equipas, tendo uma liderança mais próxima dos colaboradores pela via virtual.»

Mais: «Nos últimos 12 meses, a Deloitte reinventou a experiência de gestão de performance e talento. Se antes tínhamos o potencial versus a performance, hoje esse processo foi completamente redesenhado, garantindo que o tornamos muito mais ágil, dinâmico e positivo. Este modelo preconiza que aconteçam conversas regulares entre o líder e as suas pessoas, as quais estão alavancadas na conexão e no feedback construtivo e orientado para o futuro. Se antes a gestão do talento estava alavancada nos pontos de melhoria, hoje a Deloitte acredita que é nos pontos fortes que deve estar o investimento da empresa, porque é aí que o crescimento é exponencial», afirma Andreia Rangel.

E é aqui, nesta nova realidade, que a comunicação interna viu reforçado o seu papel fundamental, pois «é o que permite que aconteça um alinhamento entre os colaboradores e o propósito da organização. É a cola que une todos dentro da organização, que integra cerca de 3500 pessoas, pelo que hoje é muito mais estratégica e pró-activa do que antes», reconhece Andreia Rangel. E dá um exemplo: «Foi criada uma newsletter chamada de “Connected Anywhere”, agora transformada na “Magazine Stay Connected” e onde são abordados temas relevantes de todas as áreas da empresa para que continue a existir orgulho e união dentro da organização.»

Com esta estratégia, a Deloitte está empenhada em reforçar o seu Employee Value Proposition (EVP), o que se reflecte na campanha “You will never work alone”, «uma espécie de mantra da organização que mostra aos colaboradores que, na Deloitte, nunca trabalharão sozinhos. Temos de nos entreajudar, porque é aí que reside o nosso sucesso», acredita.

Centrando na experiência do colaborador, a consultora promove os valores da transparência, coragem na liderança e construção de resiliência. «A nossa prioridade são e serão sempre as pessoas, não apenas as pessoas como indivíduos, mas as equipas, e as equipas de equipas, porque nestes três níveis há formas de trabalhar e de conectar diferentes. A unir tudo isto, está o empenho em construir um ambiente de segurança e de confiança, onde as pessoas sentem que são vistas, ouvidas e consideradas», concluiu.

 

Este artigo faz parte do Especial “Employer Branding”, publicado na edição de Abril (n.º 124) da Human Resources, nas bancas.

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