Carlos Oliveira, CEO da Fundação José Neves: «O conhecimento é a chave para aumentar a competitividade das nações»

A edição de 2021 do Building the Future – que se apresenta como o maior evento de transformação digital do ecossistema empresarial português, liderado pela Microsoft e desenvolvido pela imatch – está a decorrer, sendo o dia de amanhã dedicado à Educação. Carlos Oliveira, presidente executivo da Fundação José Neves será um dos oradores e, em jeito de antevisão, falou à Human Resources sobre o imperativo de os sistemas de educação e formação de todo o mundo mudarem de paradigma de forma a serem mais ágeis para responderem aos novos desafios e garantirem a formação dos cidadãos para as novas competências.

 

Por Sandra M. Pinto

 

O Building the Future está a decorrer desde dia 26 e acaba amanhã, propondo-se, através das suas mais de 100 sessões e 200 oradores, ajudar a definir a forma como iremos inovar, melhorar as competências digitais, gerar novas oportunidades de negócio, fomentar o mercado e aproximar empresas de todos os sectores da actividade económica. No último dia do evento o foco é a Educação.

Carlos Oliveira defende que Portugal tem que apostar na educação para as competências do futuro, e essa educação tem que ser ao longo da vida e de acesso generalizado. «É necessária uma forte aposta na reconversão das pessoas para as apoiar na adaptação aos seus empregos e aos novos empregos. (…) E é crucial apoiar as pessoas na aquisição das competências que serão mais solicitadas.» Para isso é fundamental que «o sector da educação se adapte de uma forma muito veloz à futura nova realidade».

 

De que forma a tecnologia está a redefinir o progresso humano?
A evolução civilizacional aconteceu sempre alavancada em novas tecnologias e aplicação do conhecimento à resolução de problemas da sociedade. Sabemos que a transformação digital a que estamos a assistir tem um impacto relevante nas nossas vidas e na forma como nos desenvolvemos enquanto indivíduos e sociedade. Basta apenas um exemplo das ferramentas de comunicação que hoje temos à disposição, desde as mensagens instantâneas, aos emails ou às videoconferências – todas elas estão a alterar a forma como os humanos se conectam e estão permanentemente em ligação.
Para termos uma ideia, o estudo “O Futuro do Trabalho em Portugal: o Imperativo da Requalificação”, elaborado pela Nova School of Business & Economics em parceria com a CIP, estima que 50% do tempo despendido em tarefas profissionais pode ser automatizado com a tecnologia existente. E este número pode crescer para 67% até 2030.
Por outro lado, a digitalização e as novas tecnologias vão criar novos empregos que envolvem sobretudo tarefas altamente cognitivas e complexas.

Em Portugal, estima-se a criação de pelo menos 600 mil novos empregos até 2030, em resultado do envelhecimento da população, do progresso tecnológico, da economia verde e de outras tendências. São muitas as mudanças que estão a ocorrer, e a ambição é que nos permitam evoluir para uma sociedade mais conectada e com pessoas mais realizadas e felizes.

 

Quais os maiores desafios do futuro? Empregabilidade e o desenvolvimento de competências?
As rápidas e profundas transformações que a sociedade, as empresas e o mundo enfrentam estão a acelerar o surgimento de um elevado número de novas ocupações que em muitos casos requerem novas competências. O mundo está a mudar rapidamente e Portugal e os portugueses têm de preparar-se hoje para estas mudanças. Se tivéssemos de apostar apenas numa opção para acompanhar esta tendência, apostaria na educação para as competências do futuro.
O conhecimento é a chave para aumentar a competitividade das nações.
Os grandes desafios que temos é fazer evoluir o nossos sistema de ensino-aprendizagem para que possam rapidamente incorporar formação nas competências de futuro e também na criação de programas de formação mais focados em competências e de curta duração, para que possamos ter um modelo de educação ao longo da vida que permita uma continua aprendizagem. Uma população com melhor educação e qualificação tem impacto no crescimento económico e no desenvolvimento de cada país.

 

Com a nova realidade do mundo, quais as competências que devem ser desenvolvidas, nomeadamente para desenvolver novas carreiras, inclusive as tecnológicas?
Essa é uma pergunta cuja resposta depende de múltiplos factores, conjunturais e estruturais, como comprova o momento de pandemia que estamos a atravessar e que transformou de uma forma acelerada as nossas vidas e a sociedade em que vivemos. Mas aquilo que temos assistido é à predominância a ao crescimento das competências relacionadas com a tecnologia, como demonstra a plataforma da Fundação José Neves Brighter Future.

Por exemplo, é possível verificar que de 2010 para 2018, das cinco profissões com maior crescimento percentual do número de trabalhadores, quatro estão relacionadas com novas tecnologias: programador de software, programador web e de multimédia, especialista de redes informáticas e especialista em bases de dados e redes. E ainda que, apesar de continuarem entre as aptidões menos utilizadas no mercado de trabalho, ciências e programação foram as aptidões que ganharam mais relevância no mesmo espaço temporal. Sabemos também que as competências mais emocionais e das chamadas soft skills serão cada vez mais o diferenciador para o sucesso.

 

Que mudanças devem acontecer no ensino perante a nova realidade do mercado?
Vivemos um tempo excepcional. O ano de 2020 foi um laboratório de testes acelerado para o mundo e para cada um de nós com o despoletar do vírus SARS-CoV-2. Algumas mudanças são já evidentes, mas é ainda prematuro percebermos a intensidade, a profundidade e as alterações estruturais dessas alterações, e se elas serão permanentes ou não.
Uma das grandes mudanças provocadas pela pandemia, e que já é possível medir, prende-se com a aceleração da adopção do digital em todas as áreas da sociedade.
As mudanças passam também pelas escolas e pela educação, que hoje recorrem às aulas à distância para darem seguimento ao programa de ensino. O sector da educação terá que se adaptar de uma forma muito veloz à futura nova realidade. A reconversão de competências será central para que as pessoas possam procurar oportunidades de emprego em áreas distintas das suas áreas de formação base. As instituições de ensino terão que criar novos curricula de curta duração adaptados às novas necessidades.

 

Qual o papel desempenhado por iniciativas como o Building the Future?
A parceria da Fundação José Neves com a Microsoft tem como objectivo partilhar a ambição de transformar Portugal numa sociedade do Conhecimento através da Educação e do Desenvolvimento Humano. Acreditamos que a concretização desta nossa visão só será possível com uma forte e determinada aposta na Educação, focada no investimento em competências que estejam alinhadas com as oportunidades e com os desafios do futuro. Este ano, o Edu Day do Building the Future, um dia inteiramente dedicado à educação, tem a curadoria da Fundação José Neves e a participação de nomes como John Elkann, Presidente da holding EXOR e da Fiat Chrysler Automobiles, e ainda muitos outros.
É com muita ambição que a Fundação José Neves se associa ao Building the Future, o mais conceituado evento de transformação digital nacional. Estamos certos de que poderemos dar um contributo importante para apoiar a Microsoft no seu objetivo de “Ativar Portugal” para os desafios da inovação nas diversas áreas da sociedade, contribuindo assim para o desenvolvimento do país e de um futuro melhor para todos. Este evento tem a capacidade única de pensar a inovação, o reforço das competências digitais e novas oportunidades de negócio do futuro, aproximando e interligando os vários key players nacionais e internacionais da atividade empresarial e económica.

 

O que é a plataforma Brighter Future?
O Brighter Future é uma plataforma da Fundação José Neves única e inovadora em Portugal, com informação sobre Emprego, Educação e Competências. É gratuito, anónimo e de livre acesso. O maior contributo do Brighter Future é permitir a todas as pessoas, estudantes ou profissionais à procura de um rumo ou de um novo rumo para as suas carreiras, tomarem as melhores decisões para o seu futuro, com base em factos e informação relevante sobre o mercado de trabalho, as competências e os empregos. A informação contida no Brighter Future pode ser utilizada também por todas as entidades que trabalham no setor da educação.
No total, o Brighter Future reúne 50GB de dados sobre quatro mil cursos e formações; 200 profissões e mais de 200 competências. Transforma esses dados em conhecimento, ao reunir e interligar indicadores, dados estatísticos e toda a informação relevante sobre estas áreas.
É a maior base de conhecimento sobre estas matérias. Permite identificar as grandes tendências em relação às profissões mais representativas do mercado de trabalho, às profissões mais procuradas, às competências mais valorizadas pelas empresas e a empregabilidade das diversas áreas de formação, entre muitas outras. Pode ainda oferecer um contributo decisivo para todos os agentes que gravitam em torno da educação, nomeadamente governantes e até mesmo os jornalistas que escrevem sobre estas matérias.

 

Temas como o acesso à educação, ao desenvolvimento pessoal e às competências devem estar na linha da frente das preocupações?
É crucial o reforço da aposta na educação para as competências do futuro e ao longo da vida e que sejam de acesso generalizado. Os sistemas de educação e formação de todo o mundo terão que mudar de paradigma de forma a serem mais ágeis para responderem aos novos desafios e garantirem a formação dos cidadãos para as novas competências. E isso passa também por atrair adultos a participarem em formação, um número que teima em manter-se muito baixo. Apenas 10,5% dos portugueses adultos participaram em alguma formação durante o ano de 2019. O relatório da OCDE Getting Skills Right revela que, num conjunto de 34 países, Portugal é aquele que tem mais urgência em preparar o seu sistema de aprendizagem ao longo da vida.
A educação ao longo da vida terá de ser o novo normal. Porque um mundo que muda a alta velocidade exigirá aos cidadãos uma permanente atualização do conhecimento.
É necessária uma forte aposta na reconversão das pessoas para as apoiar na adaptação aos seus empregos e aos novos empregos. É crucial apoiar as pessoas na aquisição das competências que serão mais solicitadas .

 

Qual a importância da ligação entre tecnologia, liderança e educação?
Neste triângulo, a educação deve ser o foco e aquilo que nos permite obter o conhecimento para termos inovação e a liderança necessárias a um país mais competitivo e com pessoas mais satisfeitas e felizes.

 

Como devemos olhar para 2021 e que tendências identifica como mais urgentes/importantes?
Há na ordem do dia e devido à conjuntura atual preocupações fortes sobre o ensino à distância e a preparação para as competências do futuro. O grande desafio da maioria das nações e de cada um de nós enquanto indivíduos é antecipar o futuro e acompanhar as necessidades deste mundo global, interligado e cada vez mais digital.
A Fundação José Neves está a trabalhar nestas frentes em parceria com muitas entidades, seja através dos ISA, que dão acesso à educação para as competências, seja através do Brighter Future, que permite o acesso a dados sobre Educação, sobre Competências e Empregabilidade, para permitir aos portugueses tomarem as melhores decisões para um futuro melhor.

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