Clara Raposo, presidente do ISEG: «Queremos ter a nossa inteligência na cabeça ou no computador?»

O encerramento da XX Conferência Human Resources foi assegurado por Clara Raposo, presidente do ISEG – Instituto Superior de Economia e Gestão, que falou sobre as profissões ou funções que vão acabar, da importância do reskilling, daquelas que são tidas como as competências fundamentais para o futuro, mas alertou para o risco de desumanização e para a importância de não descurar outras áreas do conhecimento não tecnológicas.

Por Margarida Lopes | Foto Nuno Carrancho, NC Produções

 

Clara Raposo começou por partilhar um vídeo do World Economic Forum, que mostrou que o futuro do trabalho foi acelerado com a pandemia e que obrigou a que muitos colaboradores passassem a trabalhar remotamente e usassem novas formas de trabalho. Partindo dessa vídeo, a dean do ISEG fez notar que «a automação associada à recessão que ainda vamos sofrer traz pressão adicional para as empresas, porque há uma preocupação com a sobrevivência da organização, para além de com a saúde das pessoas e com a enorme transformação na capacidade de trabalho e na forma de trabalhar de todos, o que é um desafio enorme.»

E salientou: «A mensagem que é passada por estas organizações é que, com uma actualização da forma de trabalhar das pessoas, com novos skills, por exemplo fazendo um reskilling, pessoas que desempenhavam uma tarefa que vai acabar, se calhar podem ser formadas para trabalhar numa outra área, em que conseguirão desempenhar novas funções que estão a surgir agora no momento.»

Para Clara Raposo, «há a oportunidade de fazer reskilling ou upskilling de profissões ou funções que vão acabar, e há muitas oportunidades de formação. A mesma coisa no que diz respeito a necessidade tecnológicas que estão sempre a surgir e mesmo pessoas que já trabalham nesse sector têm de fazer um esforço adicional sistematicamente de fazer o tal upskilling.»

De acordo com vários estudos, o activo mais valioso de qualquer organização é necessariamente o seu capital humano. Mas Clara Raposo tem dúvidas. E explica porquê: «Não sei se isto é exactamente verdade, porque são as pessoas, mas se calhar têm ser as pessoas certas, e este é um momento muito importante para reflectir e tomar decisões, no sentido de ver para que funções é que as pessoas têm capacidade de adaptação e se vão ser felizes e capazes de desempenhar aquelas funções.»

Ainda com base no World Economic Forum, a responsável destacou aquelas que são identificadas como as cinco profissões do futuro:

1. Engenheiros;

2. Especialistas em inteligência artificial;

3. Gestores de marketing digital;

4. Especialistas em aquisição de talento;

5. Especialistas de sucesso do cliente;

 

Dado este ranking, alertou: «Tudo parece muito virado para a componente de digitalização destas profissões. À medida que se desenvolvem competências de inteligência artificial, mesmo as funções do Recursos Humanos vão poder passar a ser desempenhadas de forma automatizada. Ou seja, há uma certa desumanização nestas profissões para as quais estamos a olhar». Depois, questiona Clara Raposo, será que são estas as competências que temos de ter no futuro? «Não temos a certeza, mas sabemos que o tipo de competências digitais de inteligência artificial presentes nas profissões enunciadas são competências em que temos de ter formação.» E recordou as 10 competências que o World Economic Forum identifica como as que serão mais relevantes em 2025:

1. Pensamento analítico e capacidade de inovação;
2. Capacidade de aprender;
3. Capacidade de resolver problemas complexos;
4. Pensamento e análise crítica;
5. Criatividade, originalidade e iniciativa;
6. Liderança e influência;
7. Uso de tecnologia;
8. Programação;
9. Resiliência, flexibilidade e tolerância ao stress;
10. Raciocínio;

 

Mas Clara Raposo não acredita «que o mundo vá ser exactamente assim. No momento actual, que se vive, há a preocupação de ensinar as pessoas a funcionar neste novo modelo e fazer estas previsões é uma forma de lidar com o medo que sentimos da pandemia». Ainda que não duvide de que «todos precisamos de skills digitais, da inteligência artificial», alerta que «não podemos esquecer que devemos continuar a ter várias áreas conhecimento, seja história ou literatura. É de uma boa base de conhecimento, que faz falta, e nos pode ajudar a ser mais criativos. Não podemos deixar para trás outras áreas do conhecimento.» E deixa a provocação: «Onde queremos ter a nossa inteligência? Na cabeça ou no computador?»

Reconhecendo que houve uma mudança na Gestão de Pessoas, Clara Raposo defende que «é preciso fazer mais. É preciso fazer coisas diferentes com as mesmas pessoas.» E sugeriu: «Este é um óptimo momento para promover formação. Deem tempo a quem estuda.  A vida não pode ser só aprender novas competências. É preciso tempo para formar as pessoas enquanto seres humanos completos, interessantes, e não produzir “frangos de aviário”. Calma», recomendou, acrescentando que se preste mais atenção aos gostos e talentos das pessoas. «É também importante trazer alegria ao dia de trabalho e promover uma serie de actividades extra para manter o interesse. Temos de olhar para o lado B das pessoas.» É isso que tem tentado fazer no ISEG, tentando manter os seus alunos humanos, enquanto os forma em tecnologia.

 

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