Como decidir o que centralizar ou descentralizar na sua empresa?

As actuais formas digitais de trabalho exigem equipas autónomas, com poder de decisão, e descentralizadas. Isso é difícil de conciliar com funções e uma administração centralizadas.

 

Por Mark Schwartz, Enterprise Strategist da Amazon Web Services

 

A maioria das grandes organizações de Tecnologias de Informação (TI) costuma chegar a um momento em que tem de decidir o que centralizar e o que descentralizar. Algumas organizações decidem criar um grupo de serviços partilhados. Outras procuram centralizar a administração sobre a segurança e a arquitectura, ou centralizar as aquisições e a gestão financeira. Numa situação de fraca execução, as funções centralizadas podem tornar-se obstáculos comprometedores, e as interacções entre os serviços partilhados e as equipas descentralizadas arriscam-se a criar perdas administrativas. Como é que as empresas devem decidir o que centralizar, e como podem organizar melhor os serviços centralizados e as suas interacções com unidades descentralizadas para reduzir estas perdas?

Como CIO (chief Information officer) de uma das agências do Departamento de Segurança Interna (DHS) norte-americano, considerava-me uma vítima de uma centralização onerosa. Sempre que queríamos novos servidores ou mudanças no centro de dados tínhamos de pedir autorização a uma entidade contratante do DHS, que supervisionava o prestador de serviço que o geria. A nossa infra-estrutura de rede era partilhada com outras agências do DHS e gerida centralmente e, por isso, até fazer as mais pequenas alterações na rede exigia burocracia, revisões e prazos extensos. Para projectos de TI tivemos de seguir os requisitos onerosos da estrutura de supervisão MD-102 do DHS, que foi projectada para supervisionar a construção dos navios para a Guarda Costeira (a Guarda Costeira também faz parte do DHS). Esta entidade também regulou a entrega de sistemas de software e, consequentemente, orientou para grandes investimentos de capital e objectos físicos. A centralização parecia constituir um obstáculo para tudo o que queríamos realizar.

As actuais formas digitais de trabalho exigem equipas autónomas, com poder de decisão, e descentralizadas. Isso é difícil de conciliar com funções e uma administração centralizadas! Por outro lado, existem algumas funções que simplesmente não podem ser descentralizadas ou que causam ineficiências, no caso de se iniciar esse processo. Na nossa situação, a sede do DHS era responsável pela segurança de toda a estrutura, e negociar contratos de fornecedores de maneira centralizada permitiu-nos aumentar o volume de compras para obter descontos mais vantajosos.

A tensão entre centralizar e descentralizar está no centro do contexto das TI digitais dos nossos dias. É bastante comum o tema aparecer de uma forma ou de outra na maioria das conversas que tenho com líderes empresariais.

 

Acelerar as equipas e apoiar a inovação
Para que se compreenda que rumo escolher, gosto de partir do princípio de que a velocidade e a inovação são essenciais no contexto actual. Estes elementos são mais facilmente agilizados pela descentralização da autoridade, pelo trabalho em equipas multifuncionais, autónomas e com poderes. As equipas podem ficar perto do cliente, perceber facilmente as mudanças no mercado, incubar ideias com participação multifuncional e executar o trabalho sem transferências entre silos operacionais, ou seja, rapidamente. Quando uma equipa autónoma depende de uma função centralizada, esta referida função acaba por atrasar a equipa, acrescentando sobrecarga administrativa, e impõe uma burocracia que tende a limitar a inovação.

Esse é o meu ponto de partida, mas a questão exige um tratamento mais detalhado. Em que situações se devem centralizar funções? A minha resposta inicial é: apenas quando realmente acelera equipas descentralizadas e apoia a sua inovação. Se a organização centralizada fornece serviços que, de outra forma, ocupariam tempo às equipas para se disponibilizarem, fazendo-o sem sobrecarga administrativa, podemos considerar que é algo proveitoso. Tomemos como exemplo a supervisão do DHS sobre o contrato de gestão do centro de dados. Ao ter sido configurado, tornou as nossas equipas mais lentas quando elas precisavam de infra-estrutura. Se, no entanto, a equipa centralizada tivesse feito o contrato, pré-negociado, com processos rápidos para as equipas obterem a sua própria infra-estrutura quando precisassem, isso teria poupado tempo e, como tal, teria sido benéfico.

É certo que não precisamos mais de nos preocupar com centro de dados porque temos a cloud. Imaginemos, agora, uma equipa dedicada à plataforma centralizada em cloud que fornece às equipas de entrega de software uma infra-estrutura preparada na qual podem trabalhar. As equipas podem disponibilizar qualquer infra-estrutura de que necessitem, sem esperar que a equipa da plataforma o faça. Em vez disso, a equipa da plataforma configurou-a de modo que, quando as equipas disponibilizaram a sua infra-estrutura, usam automaticamente os recursos de cloud que a equipa de segurança verificou e configurou e que a equipa de finanças aprovou quanto ao custo- -benefício. Agora, a organização da plataforma central está, de facto, a tornar as coisas mais rápidas para as equipas de entrega. Uma vez que não precisam de avaliar a segurança desses recursos, não necessitam de fazer nenhuma engenharia de segurança suplementar e não precisam de justificar o custo-eficácia dos recursos que usam. E não há sobrecarga administrativa adicional porque ainda podem fornecer a sua própria infra-estrutura.

Nesse caso, a função centralizada realmente acelerou as equipas descentralizadas – uma grande vitória! Temos de ter em consideração o contraste com os exemplos anteriormente referidos sobre o DHS, em que as funções centralizadas causaram atrasos e insatisfações, porque envolviam o gatekeeping e uma transferência real para outra equipa.

Nesse âmbito, é claro que se devem centralizar as funções quando isso aumenta a velocidade. Mas é importante ter todos os aspectos em consideração. Outra razão pela qual as organizações se centralizam é a de fornecer administração e supervisão para toda a empresa. No DHS, a sede precisava de supervisionar a segurança e os gastos e, por isso, tinha organizações centralizadas para cuidar desses assuntos. Como é que essas necessidades podem ser atendidas sem atrasar os processos?

 

Supervisão através de administração
Em primeiro lugar, devemos questionar se essa administração central é realmente necessária. Nos livros que escrevei, aconselhei as pessoas a terem cuidado sobre o impulso instintivo da padronização nas TI. Muitas vezes, assumimos que os padrões são necessários, mas uma análise cuidada demonstra que o valor comercial dessa padronização pode não justificar o custo adicional ou a lentidão dos mecanismos de administração para garantir que os padrões são seguidos.

Para além disso, também quero destacar o equilíbrio entre supervisão através de administração e supervisão através da gestão. A administração cria regras e introduz mecanismos de fiscalização, com consequentes custos. Mas, frequentemente, as empresas podem alcançar os mesmos resultados, ou melhores, com uma boa e simples administração. A administração, por exemplo, pode forçar as equipas a utilizar a plataforma padronizada de entrega de software. Por outro lado, pode questionar uma equipa que não usava uma plataforma padrão por que razão não o fez. Estariam realmente a pensar nos melhores interesses da empresa quando decidiram não o fazer? As empresas não precisam necessariamente de regras e da sua aplicação para conseguir uma boa conduta. Frequentemente, uma administração competente resolve o problema.

Mas digamos que determinada empresa precisa de uma administração centralizada. A boa notícia é que hoje, muitas vezes, isso pode ser conseguido com automação, através de “linhas condutoras” que não desaceleram as equipas descentralizadas ou as sobrecarregam. Às vezes, falo sobre “automatizar a burocracia”. Hoje podemos fazer “compliance como código”, “política como código” ou “auditoria como código”. A burocracia não interfere na velocidade e na criatividade, apenas alinha estes elementos entre as referidas “linhas condutoras”.

Já dei um exemplo de burocracia automatizada: a equipa de plataforma que apenas fornece recursos controlados para as equipas usarem no seu aprovisionamento. A administração da equipa de segurança já está incorporada na selecção de componentes que estão disponíveis. Desta forma, não precisam de interferir mais no processo.

Outro exemplo: fizemos com que a equipa de segurança criasse testes automatizados que verificavam a conformidade com as suas políticas para todas as outras equipas de TI utilizarem. Certificando- se que o seu código passou nos testes de segurança, as equipas de entrega podiam movimentar-se a alta velocidade de forma independente – mas, com os testes, a equipa de segurança fornecia o controlo. Da mesma forma, uma empresa pode automatizar os controlos financeiros, acabando com recursos que não estão a ser usados, ou talvez impedindo as equipas de utilizar recursos que não são económicos, ou até notificar o departamento financeiro se uma equipa planear fazer algo potencialmente caro.

Todos esses mecanismos automatizados impõem controlos de administração determinados de forma centralizada, mas não desaceleram as equipas, não interferem na sua criatividade, ou não as sobrecarregam administrativamente.

Assim sendo, destaco algumas das regras básicas para gerir o equilíbrio entre centralização e descentralização:

  • Optar por descentralizar, de uma forma geral;
  • Centralizar quando for para acelerar as unidades descentralizadas;
  • Centralizar assim que a administração for necessária;
  • Mas fazê-lo de uma forma automatizada e que não crie dependências.

 

Este artigo foi publicado na edição de Janeiro (nº. 133) da Human Resources, nas bancas. Caso prefira comprar online, tem disponível a versão em papel e a versão digital.

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