COVID-19. Como ficam os prazos e deligências processuais?

A COVID-19 veio confrontar o nosso país com a necessidade de tomar um conjunto de medidas que, por um lado, protegesse a saúde pública e, por outro, assegurasse o funcionamento mínimo das infraestruturas fundamentais de um Estado de Direito, como é o caso dos Tribunais.

 

Assim, tendo por base a Lei nº 1-A/2020, de 19 de Março, a Antas da Cunha ECIJA preparou um guia que pretende dar resposta às questões mais pertinentes, no que concerne aos prazos e diligências de natureza processual e/ou procedimental.

 

1. Sobre o que dispõe a Lei nº 1-A/2020, de 19 de Março?
A Lei nº 1-A/2020, de 19 de Março, vem, entre outros, dispor sobre os prazos e diligências processuais /procedimentais cujo termo ou realização se verifiquem durante o período determinado pela autoridade nacional de saúde pública para aplicação de medidas excepcionais de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da COVID-19, procedendo, ainda, à efectiva suspensão de acções e procedimentos especiais de despejo.

 

2. Qual o seu prazo de vigência?
Nos termos do seu artigo 10.º, a Lei nº 1-A/2020, de 19 de Março, vigora desde o dia 12 de Março até data a definir por decreto-lei, no qual se declara o termo do período determinado pela autoridade nacional de saúde pública para aplicação de medidas excepcionais de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da COVID-19.

 

3. No que diz respeito aos processos judiciais, qual o efeito imediato da aplicação da Lei nº 3 1-A/2020, de 19 de Março?

O artigo 7.º, nº 1, do identificado ato legislativo, dispõe que, durante o período determinado pela autoridade nacional de saúde pública para aplicação de medidas excepcionais de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da COVID-19, o regime de férias judiciais é aplicável aos actos processuais e procedimentais «que devam ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos, que corram termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional, Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de
execução fiscal.» Significa isto que todos os prazos para a prática de actos processuais ou procedimentais em processos não urgentes, encontram-se, a partir do dia 12 de Março, suspensos.

 

Exemplo
O Réu, citado para contestar uma acção declarativa por cumprimento defeituoso de contrato, dispõe de 30 dias para o efeito. Com a suspensão do processo, o que sucede é que o prazo é interrompido, no dia 12 de Março de 2020, recomeçando a contar a partir do exacto ponto em que ficou, findo o período determinado pela autoridade nacional de saúde pública para aplicação de medidas excepcionais de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da doença COVID-19.

 

4. E quanto aos processos urgentes, a suspensão é aplicável?
Sim. O artigo 7.º, n.º 5 da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, dispõe que «nos processos urgentes os prazos suspendem-se», salvo nas circunstâncias em que:

– Seja tecnicamente viável a prática de quaisquer actos processuais e procedimentais através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente por teleconferência ou videochamada;

– Estejam em causa actos e diligências urgentes em processos que versem sobre direitos fundamentais, nomeadamente diligências processuais relativas a menores em risco ou a processos tutelares educativos de natureza urgente, diligências e julgamentos de arguidos presos, desde que a sua realização não implique a presença de um número de pessoas superior ao previsto pelas recomendações das autoridades de saúde e de acordo com as orientações fixadas pelos conselhos superiores competentes.

 

5. Foram adiadas as audiências de julgamento ou outras diligências presenciais cuja marcação coincidia com o período de excepção?

Sim. A Lei determina que apenas nos processos urgentes que versem sobre direitos fundamentais, possam ocorrer audiências ou diligências presenciais. Assim, encontram-se adiadas todas as audiências prévias, audiências de julgamento, tentativas de conciliação, inspecções judiciais, inspecções ao local, actos periciais, entregas de bens no contexto de processos executivos e qualquer outro ato que implique a presença física dos seus intervenientes.

Exemplo
O autor que, estando envolvido numa acção para constituição de servidão de passagem, tendo marcada, para os próximos dias, uma inspecção judicial ao local, terá, certamente, a diligência cancelada.

 

6. A Lei n.º 1-A/2020 prevê a suspensão de prazos nos procedimentos administrativos e/ou tributários?
A este respeito, o artigo 7.º, nº 6 dispõe que ocorre igualmente a suspensão de prazos e adiamento de diligências nos procedimentos sancionatórios, contraordenacionais e disciplinares que corram termos em “serviços da administração directa, indirecta, regional e autárquica e demais entidades administrativas, designadamente entidades administrativas independentes, incluindo o Banco de Portugal e a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários.” Encontram-se, ainda, suspensos os prazos concernentes a procedimentos que corram termos em cartórios notariais ou conservatórias, como é o caso do registo predial, civil ou comercial.

Por último, a norma prevê a suspensão dos prazos que corram a favor dos particulares, como é o caso, por exemplo, dos prazos para exercício de audição prévia ou entrega de elementos. De especificar que, no caso dos procedimentos que correm junto da Autoridade Tributária, os prazos a favor de particulares apenas se suspendem nos «actos de interposição de impugnação judicial, reclamação graciosa, recurso hierárquico, ou outros procedimentos de idêntica natureza, bem como aos prazos para a prática de actos no âmbito dos mesmos procedimentos tributários».

Exemplo 1
O arguido, num processo de contraordenação por infracções ao Código da Estrada, tem, ao abrigo da Lei nº 1-A/2020, de 19 de Março, de apresentar a sua defesa nos próximos 15 dias úteis?
Não. O prazo para apresentação de defesa, no âmbito de processos contraordenacionais, encontra-se, indefinidamente, suspenso.

Exemplo 2
O requerente de uma licença de utilização de determinado espaço para fins comerciais junto
da Autarquia local, que haja sido notificado do projecto de decisão de indeferimento, tem o prazo para exercício do direito de audição prévia, suspenso?
Sim. A Lei 1-A/2020, de 19 de Março prevê, no seu artigo 7.º, n.º 6, alínea c), a suspensão, no âmbito dos procedimentos administrativos, de todos os prazos que aproveitam aos particulares. No caso, o prazo para exercício de audição prévia pretende, claramente, favorecer o cidadão requerente que beneficia da possibilidade de evitar que uma decisão desfavorável lhe seja aplicada.

 

7. O que sucede aos prazos de prescrição/caducidade que terminam durante o período determinado pela autoridade nacional de saúde pública para aplicação de medidas excepcionais de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da COVID-19?
Todos os prazos de prescrição de dívidas ou caducidade de direitos encontram-se, igualmente, suspensos. Por exemplo, estando em causa o prazo de três anos para intentar uma acção judicial de responsabilidade civil ou o prazo de seis meses de prescrição de uma dívida de telecomunicações, a sua contabilização não é efectuada durante o período determinado pela autoridade nacional de saúde pública para aplicação de medidas excepcionais de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da COVID-19.

 

8. É possível denunciar contratos de arrendamento, realizar acções de despejo ou reaver a coisa imóvel arrendada, durante o período de vigência da Lei nº 1-A/2020, de 19 de Março?
Não. Nos termos da já identificada lei, «são suspensas as acções de despejo, os procedimentos especiais de despejo e os processos para entrega de coisa imóvel arrendada, quando o arrendatário, por força da decisão judicial final a proferir, possa ser colocado em situação de fragilidade por falta de habitação própria.»

Quanto às denúncias de contratos de arrendamento habitacional e não habitacional efectuadas pelo senhorio, as mesmas podem ser efectuadas sendo certo os seus efeitos, apenas, se produzirão posteriormente. Ou seja, o senhorio pode denunciar o contrato já, mas o arrendatário só abandonará o locado, depois de terminado período determinado pela autoridade nacional de saúde pública para aplicação de medidas excepcionais de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da doença COVID-19. (artigos 7.º, nº 10 e 8.º da Lei nº 1-A/2020, de 19 de Março).

 

Atento ao exposto na Lei nº 1-A/2020, de 19 de Março, encontram-se suspensos, sem prejuízo de uma análise
casuística, os seguintes processos judiciais:

– Acção Declarativa de responsabilidade civil;
– Acção declarativa que vise o cumprimento de contratos;
– Acção declarativa de responsabilidade contratual;
– Acção declarativa de divisão de coisa comum;
– Procedimento de Injunção;
– Execução para prestação de facto;
– Execução para pagamento de quantia certa;
– Execução para entrega de coisa certa;
– Execução de hipoteca sobre imóvel que constitua habitação própria e permanente do executado;
– Impugnação Pauliana;
– Execução Específica de contrato de promessa;
– Embargo de Obra;
– Procedimento Cautelar Especificado para Restituição Provisória da Posse; Arrolamento/arresto; Embargo de obra nova
– Procedimento Cautelar Não Especificado que não verse sobre direitos fundamentais;
– Acção de Despejo;
– Procedimento Especial de Despejo;
– Revisão de Sentença Estrangeira;
– Prestação de Contas.

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