Diversidade e inclusão. O ideal seria recrutar sendo cego a todas as características que não as competências. «Mas há ainda muito trabalho a fazer.» (vídeo)

Quando se conseguir garantir que são as melhores pessoas que são recrutadas para a função, independentemente de tudo o resto que não sejam as suas competências para a desempenhar, sem ter a preocupação de poder não estar a construir uma equipa diversa, será quando existirá uma verdadeira diversidade nas empresas, eliminando a necessidade de existir este “tema”. Está ainda longe de ser uma realidade, mas existem bons exemplos, como a Revolut e a Randstad.

Por Sandra M. Pinto

 

Começou sexta-feira passada a “terceira temporada” das RE(talk) da Randstad em parceria com a Human Resources, com o tema da Diversidade e Inclusão. Será de facto uma questão de Diversidade e inclusão? Ou de inclusão da diversidade?” Foi este o tema da primeira RE(talk) de 2021, que juntou Rebeca Venâncio, directora de Comunicação da Revolut em Portugal, e Helena Cardador business unit manager, staffing da Randstad Portugal, com a habitual moderação de Ana Leonor Martins, directora de Redacção da Human Resources.

Será que a diversidade e a inclusão já fazem parte da cultura das empresas ou ainda é um tema visto como uma obrigação ou algo que é falado porque é politicamente correcto? Rebeca Venâncio acredita que este é um tema cada vez mais orgânico em Portugal, «muito devido a uma questão geracional pois as empresas começam agora a rejuvenescer no sentido de ter pessoas mais novas, e esta comunicação intergeracional também facilita o diálogo, a inclusão. As novas gerações estão muito mais capacitadas para trazer estes temas para as empresas, mas é ideal que essas discussões também venham das equipas de gestão para toda a organização.»

De acordo com a responsável, as pessoas estão cada vez mais vocais em relação a esta temática, «a própria separação entre a vida profissional e a vida laboral está cada vez mais diluída, algo a que estes confinamentos que temos vindo a viver ajudam a que aconteça, pelo que estes temas acabam por ser discutidos de uma forma um pouco mais aberta e construtiva. Se não for estrutural e se não for orgânico nunca vai ser um tema estratégico para a organização». No caso da Revolut, o tema é de tal forma relevante ao ponto de estar inserido no employee handbook, uma espécie de «manual dos colaboradores, que norteia em grande medida aquilo que são os seus direitos e os deveres».

Por seu lado, Helena Cardador defende que este é um tema que ainda têm de ser melhor olhado e desenvolvido nas empresas, independentemente do seu tamanho. «A diversidade e a inclusão pode ser essencialmente uma missão da empresa e tem de começar desde o recrutamento, sendo o foco tem de estar naquilo que são as competências dos próprios candidatos e não de que país é, se é homem ou mulher…»

Na experiência da consultora «tem de haver e tem de existir uma relação de grande confiança com o cliente para que quem recruta consiga apresentar perfis que poderiam não ser os mais óbvios ou aquele que o cliente estaria à espera. Ainda não existe um mindset completamente disponível para a diversidade mas enquanto recrutadores cabe-nos a nós promover e propor essa possibilidade e essa diversidade junto dos clientes com quem trabalhamos.» Existem sectores mais fáceis de propor essa diversidade, nomeadamente no sector agrícola – exemplifica. «Pela dificuldade que existe em encontrar o talento localmente, acabamos por ter a diversidade bastante presente e felizmente acabamos por conseguir levar também esta possibilidade de complementar as necessidades do cliente com profissionais que não seriam expectáveis para a função.»

 

A escassez de talento 

A moderadora chama a atenção para outra variável – a escassez de talento, questionando se, perante a dificuldade em encontrar profissionais com as competências que procuram, é exequível (ou utópico) para as empresas adicionar a Rebeca Venâncio reconhece que quando não há quotas de inclusão é muito difícil acreditar que este tópico vai ser integrado no critério de selecção. «Uma empresa que tem uma politica de inclusão e diversidade saudável é precisamente aquele que em certa medida é “cega” para aquilo que são as diferenças, pois vai procurar a pessoa que tem as competências certas. Mas, na realidade, existem sectores em que é “preciso correr atras do prejuízo”, perante certas politicas que não levam este tema em linha de conta. Tudo isto passa por uma mudança de mentalidade transversal na sociedade e nos cidadãos», afirma a directora de Comunicação da Revolut em Portugal. «É preciso ter uma maior aceitação para aquilo que é considerado diferente e uma maior capacitação dos recrutadores em anular tudo o que serve de travão à necessária inclusão da diversidade.»

Helena Cardador destaca o papel preponderante das empresas na continuidade da não existência da diversidade e reitera a importância da fase de recrutamento. «Ter diversidade de candidatos é bastante positivo porque assegura competências completamente diferentes, que podem contribuir de uma forma muito positiva para aquilo que poderá ser a diferenciação da marca no mercado e o valor acrescentado que podem trazer. » E faz notar: «A diversidade e a inclusão nunca podem vir separadas, uma vez que a inclusão tem um papel fundamental dentro da própria empresa. Acredito e defendo que, para além da diversidade de recrutamento, existe todo um papel para além disso que é o papel da inclusão social, seja ela no ou fora do posto de trabalho. Não baste ter pessoas diversas, a vários níveis, é preciso criar as condições para que se integrem.»

 

Métricas. Sim ou não?

De quem esteve a assistir em directo, surge uma pergunta para a Rebeca, com o objecticvo de perceber como é que a Revolut mede a diversidade e inclusão na empresa. A directora de Comunicação revela que não têm KPIs para as equipas de recrutadores, mas é um tema em debate na empresa. «Preocupamo-nos em garantir que mulheres e homens, qualquer pessoa independentemente da origem, tenham o mesmo tratamento, apesar de não termos métricas especificas. Olhamos para este tema como um todo, garantimos que as melhores pessoas estão a ser recrutadas para a função, independentemente de tudo o resto que não sejam as suas competências para a desempenhar».

Já na Randstad o foco é em duas áreas: «numa área interna, com as pessoas que fazem parte da organização, e depois olhamos para o tema de uma forma externa, através da contribuição do nosso trabalho enquanto recrutadores sugerindo e promovendo a diversidade sempre que possível.»

Ainda que, quando se fala em diversidade, o tema que surge mais facilmente seja o da igualdade de género, há muitas outras variáveis a considerar: como a etária, cultural, religiosa, orientação sexual, capacidade física, etc. E Helena Cardador sublinha que é preciso olhar para todas elas e não reduzir a uma questão de género. E faz ainda notar que «a pandemia veio acentuar a necessidade de se olhar para o tema. Sabe-se, por exemplo, que já foram despedidas mais mulheres do que homens. Há ainda muito trabalho a ser feito. A diversidade e a inclusão só vão deixar de ser tema quando, por exemplo, deixarmos de ter necessidade de contar quantas mulheres em lugares de topo. Se ainda tivermos que pensar nisso, é porque não existe igualdade.»

Rebeca Venâncio concorda e reitera que ainda há muito trabalho a fazer, em todas as vertentes da diversidade e inlcusão. «Vivemos uma época pouco amiga daquilo que se pretende seja a diversidade e a inclusão, mas é importante que todos pensem neste tema e que o mesmo seja trazido para o dia-a-dia. Parece-me que este é, sobretudo um tema de cidadania- E o teletrabalho obrigatório actual seria uma excelente oportunidade para as empresas olharem para a integração de pessoas, por exemplo, com deficiência física, pois «estando todos em casa estamos todos em pé de igualdade» e não existem factores tipicamente vistos como barreiras, como a mobilidade ou adequação dos espaços de trabalho».

 

É uma questão de negócio? 

Diversidade é uma questão de igualdade de oportunidades – de cidadania, como referiu Rebeca Venâncio – mas vários estudos indicam que é também uma questão de negócio, pois assegura melhores resultados. Será que este é um argumento ao qual as empresas serão mais “sensíveis”?

Helena Cardador acredita que as duas vertentes contam: «Se existir igualdade de oportunidades, as empresas vão sair sempre mais valorizadas, pois a diversidade só por si vai conseguir trazer à empresa alguma competitividade no mercado, maior inovação e maior criatividade».

«Precisamos ser coerentes para aquilo que queremos para o nosso próprio produto por isso somos diversos e inclusivos», reitera Rebeca Venâncio, aludindo à realidade da Revolut. «Não se trata de pensar em negócio, mas sim de sermos coerentes com aquilo que é a nossa proposta de valor externamente para o cliente e internamente para os colaboradores.»

Apesar de as duas empresas que representam terem este tema bastante presente, Rebeca Venâncio e Helena Cardador concordam que as estimativas que apontam que só teremos uma efectiva igualdade, nomeadamente de género, no trabalho, daqui a um século são realistas e não pessimista. Mas é «uma realidade que devemos tentar inverter».

 

(re)Veja aqui, na íntegra.

As re(talks) são uma iniciativa da Randstad em parceria com a Human Resources, promovida desde Março, e estão todas reunidas aqui.

 

 

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