Proposta de valor das empresas versus necessidades dos colaboradores. Elsa Carvalho identifica quatro aspectos que não podem ser descurados na gestão para tornar os caminhos compatíveis

Elsa Carvalho, head of Business Development da WTW, marcou presença na XXV Conferência Human Resources, que se realizou ontem, dia 21 de Março, no Museu do Oriente, em Lisboa. Na sua intervenção, que teve como mote “Proposta de valor das empresas vs Necessidade dos colaboradores. Que caminhos? identificou quatro.

Por Margarida Lopes ! Fotos NC Produções

 

Elsa Carvalho começou por fazer notar que «vivemos numa época de disrupção global e que se assiste a uma tensão financeira que é evidente e bastante visível decorrente da inflação, da queda dos salários reais e da carga fiscal. Adicionalmente há tensões políticas e económicas crescentes dentro e entre os países. É esta a realidade do mundo em que vivemos actualmente. De facto este é o cenário macroeconómico que se vive.»

A head of Business Development da WTW mencionou um estudo global da empresa WTW que revela que 39% dos colaboradores a fulltime já indiciaram sinais de ansiedade e depressão no trabalho, 62% referem que já sofreram burnout no trabalho.

Por outro lado, a responsável aponta que há crises de conexão com 59% dos colaboradores a dizerem que se sentem sozinhos, 52% sentem-se desligados da equipa de trabalho quando remotos e 50% estão abertos a sair para um nova oportunidade profissional.

Elsa Carvalho referiu que a volatilidade financeira e a produtividade está na agenda das empresas, «há três vezes mais dificuldade em atracção de talento e quatro vezes mais dificuldade em fazer retenção de talento e, do lado das empresas, a complexidade da gestão aumentou significativamente, devido à emigração do talento jovem, ao desajuste entre a formação e as necessidades do mercado de trabalho, e ao fenómeno de pessoas que abandonaram o local de trabalho e que se prevê que já não regressem».

A gestora destacou ainda que «do ponto de vista de complexidade da gestão das empresas, é clara e evidente actualmente devido ao custo dos salários, da matéria-prima e da produção e a gestão global do risco, nomeadamente, os ciberataques. Levanta-se a questão de saber, por um lado, o que é que os colaboradores querem, por outro lado, a complexidade da gestão».

Portanto, a ocorrência de riscos complexos e em simultâneo acaba por ser uma realidade de muitas das empresas, e por isso Elsa Carvalho alerta que «são precisos caminhos compatíveis». E relativamente a estes, apontou quatro alterações que, mais do que tendências, são realidades actuais e que, de alguma forma, vão potenciar e definir muito aquilo que acaba por ser a gestão.

A primeira realidade actual são os desafios de atracção e da retenção. «E relativamente a estes desafios, perguntámos às pessoas quais as razões que colocam para permanecer e sair da empresa. As componentes de salário estão em primeiro lugar, em segundo lugar as componentes de saúde e, em terceiro lugar, a segurança no emprego».

Por outro lado, 55% dos gestores estão abertos a novas ofertas e sete em cada dez colaboradores reportam que não estão a fazer poupanças para a reforma e estão preocupados com esse tema.

«É claro que a preocupação com os temas da reforma atinge o seu exponencial quanto mais perto se estiver da reforma, mas é importante preparar esta fase da vida». Elsa Carvalho concluiu que «o salário adquire uma importância em cenários de inflação. A pressão para os aumentos de custo são inevitáveis». Por isso, alertou: «resta-nos negociar a proposta de valor total, tendo presente os factores críticos para as pessoas, nomeadamente os benefícios de saúde, reforma e flexibilidade.»

«Quando falamos em flexibilidade não é só flexibilidade de espaço, é também flexibilidade de tempo», defendeu. E, actualmente, há duas palavras importantes «flexibilidade e escolha, com os colaboradores a serem cada vez mais os protagonistas daquele que é o seu pacote de benefícios. Também se falou de liberdade, na medida em que esta implica responsabilidade. «Os desafios financeiros do dia-a-dia afectam as prioridades a longo prazo. Todas estas componentes nomeadamente o well being financeiro adquire uma importância crítica».

Um estudo da WTW revela que metade da totalidade dos colaboradores experimentaram choque do ponto de vista financeiro nestes últimos tempos, dois terços experimentaram ansiedade e depressão decorrente deste choque financeiro e metade dos colaboradores com uma idade inferior a 50 anos espera reformar-se antes dos 65 anos.

Neste sentido, a responsável conclui que os temas financeiros estão na agenda de todas as empresas e famílias e que a segurança financeira, benefícios ajustados à realidade actual (saúde e reforma) são críticos.

A segunda realidade é a preocupação com a saúde mental e, a este propósito, Elsa Carvalho apresentou um estudo que revela que Portugal está em primeiro lugar como o país que experimentou mais burnout.

«A saúde mental é um tema da agenda do dia, que tem de estar na agenda dos líderes e dos gestores, porque tem impacto nas empresas, na produtividade e nos resultados das empresas.» E alertou que «reconhecer os sinais de ansiedade por parte dos gestores é fundamental e encaminhar estas situações para as ajudas e os programas que as empresas oferecem é também fundamental».

Defendeu ainda que o trabalho remoto e híbrido não é um tema fechado nas empresas, mas houve uma alteração que foi muito potenciada pela pandemia, sendo esta a terceira tendência «antes da pandemia a percentagem de colaboradores que trabalhava remotamente era francamente inferior aquela que trabalha actualmente». Quando se olha para as próprias tendências, as pessoas pensam que o trabalho remoto vai diminuir, apesar de preferirem este modelo, e entre as vantagens apresentadas no trabalho remoto Elsa Carvalho destacou o impacto ambiental.

Por fim, a quarta realidade diz respeito à diversidade, equidade e inclusão, «os colaboradores que não reconhecem políticas de diversidade, equidade e inclusão nas suas empresas têm duas vezes mais probabilidade de sair da empresa. Estas políticas são uma forma de retenção de talento e de preocupação. Quando falamos destes temas falamos de direitos humanos fundamentais», destacou a responsável.

«A boa notícia é que as empresas estão preocupadas com estes temas e 84% dos empregadores considera o well being físico com uma componente da sua estratégia, 88% o well being funcional, 63% o financeiro e 69% o social», salientou.

Mas «não basta dizer que é uma preocupação, é importante fazer e, para isso, temos de caminhar para um novo modelo de organização e de relacionamento com os colaboradores, relações mais igualitárias, empresas mais humanas focadas com o impacto que criam na sociedade».

A gestora terminou com um poema de António Machado que refere que é necessário caminhar, porque só quando o fazemos olhamos para as nossas pegadas e são estas que fazem o nosso próprio caminho. Citando Álvaro de Campos, concluiu dizendo que «a verdadeira generosidade que podemos ter com o futuro é fazer tudo, aqui e agora no presente».

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