Entrevista a Miguel Fontes, secretário de estado do Trabalho. «Só uma aposta contínua nos jovens assegurará a sustentabilidade no nosso país»

Miguel Fontes, secretário de estado do Trabalho, admite que Portugal tem níveis de precariedade acima do desejável e não tem dúvidas de que «só uma aposta contínua nos jovens, na sua formação, qualificação e na criação de condições que permita a sua retenção no mercado de trabalho nacional» assegurará a sustentabilidade no nosso país. É com esse desiderato que surge o “Pacto Mais e Melhores Empregos para os Jovens”.

 

Por Tânia Reis

 

Meia centena de empresas em Portugal, com facturação superior a 55 mil milhões de euros e que empregam mais de 200 mil pessoas, assinaram, em Janeiro passado, o “Pacto Mais e Melhores Empregos para os Jovens”. O principal objectivo desta iniciativa promovida pelo Governo, através da Este país tem de ser mesmo para jovens secretaria de Estado do Trabalho, e pela Fundação José Neves (FJN) é «operar uma mudança real no vulnerável mercado de trabalho dos jovens».

A Human Resources conversou com Miguel Fontes, secretário de Estado do Trabalho – que partilhou as medidas que este Pacto prevê, e que vão desde o upskilling e reskilling a incentivos salariais e fiscais, com vista à atracção e retenção do talento jovem em Portugal – e também com Carlos Oliveira, presidente executivo da FJN.

 

Considerando as políticas públicas já implementadas no âmbito da criação de emprego e as levadas a cabo pelo sector privado, porquê a criação de um pacto? Quais os objectivos pretendidos no curto prazo?
Apesar da trajectória de diminuição do desemprego jovem em Portugal, situando-se nos valores mais baixos da última década, estes continuam a ser um dos grupos mais vulneráveis do mercado de trabalho. A evolução positiva verificada ao nível das qualificações dos jovens não se fez acompanhar, ao mesmo ritmo, por uma transformação do tecido económico que permita a sua absorção, de modo a permitir que esse aumento de qualificações se tenha traduzido automaticamente num aumento da oferta de empregabilidade.

Os jovens qualificados encontram frequentemente, no mercado de trabalho, um nível salarial inadequado ao seu nível de qualificação, ao que acresce o facto de o aumento salarial para níveis mais elevados de qualificação não ter acompanhado a progressão do salário mínimo.

É fundamental continuar a trajectória que tem sido desenvolvida nos últimos anos, do aumento do salário médio dos jovens qualificados, e incentivar os ganhos salariais associados ao prosseguimento dos estudos e do nível de qualificação.

Nesse sentido, é importante actuar de forma estratégica na promoção do emprego jovem, criando condições de emprego mais atractivas, contribuindo para a sustentabilidade da segurança social e de inversão da tendência demográfica de envelhecimento populacional.

Este Pacto é um exemplo disso. É um compromisso político do Governo, das instituições públicas, mas também das empresas e da sociedade civil, porque todos estes agentes têm um papel a desempenhar para criar mais e melhores empregos para os jovens.

 

Das metas previstas no Pacto, quais destaca como mais relevantes? A seu ver, serão suficientes para resolver a situação, no longo prazo?
Como disse, este Pacto é um compromisso do Governo em continuar a reforçar as políticas activas de emprego nas suas diferentes dimensões, do apoio à criação de emprego à inserção dos jovens no mercado de trabalho e à aproximação de públicos e territórios vulneráveis ao mercado de trabalho, constituindo estas a prioridade das políticas públicas.

Por outro lado, definimos um conjunto de novas regras de regulação do mercado de trabalho com vista à promoção do trabalho digno, desde logo promovendo emprego de qualidade, reduzindo a precariedade e incentivando a negociação colectiva, através da Agenda do Trabalho Digno e de Valorização dos Jovens no Mercado de Trabalho.

Assumimos também o compromisso, com os parceiros sociais, de definir uma trajectória plurianual de actualização do salário mínimo nacional, de forma faseada, previsível e sustentada, evoluindo em cada ano em função da dinâmica do emprego e do crescimento económico, com o objectivo de atingir pelo menos 900 euros em 2026.

O conjunto destas medidas pretende valorizar os rendimentos de todos os trabalhadores, especialmente dos jovens, garantindo um aumento do salário médio e, naturalmente, valorizando as empresas portuguesas.

 

Que entidade será responsável por medir e fiscalizar a implementação dessas metas e resultados alcançados?
O Pacto prevê uma reunião semestral para monitorização, análise do trabalho realizado e partilha de boas práticas, com a presença do Governo, do senhor Presidente da República e das empresas. A primeira reunião acontecerá já em Julho. Haverá ainda relatórios anuais, nos quais serão apresentados os resultados do acordo na melhoria da empregabilidade dos jovens trabalhadores.

 

Do lado das empresas, há grandes dificuldades em atrair e contratar profissionais qualificados. A que motivos acha que tal se deve?
Temos, historicamente, um mercado de trabalho com níveis de segmentação e precariedade muito acima do que seria desejável. Enquanto sociedade, não podemos aceitar situações de precariedade eternas, sem fundamento. Um jovem com um contrato precário ou a termo recebe, em média, menos 20% do que um que tenha um contrato permanente.

Uma coisa são contratos a termo, que servem para responder a situações que a lei admite, porque são necessários, outra é o recurso constante a este tipo de vínculos ao longo da vida dos trabalhadores. E com esta realidade não podemos continuar a viver, pois a mesma não só é penalizadora para os jovens como tem custos económicos e sociais elevados para a sociedade portuguesa.

Temos feito um caminho positivo nesse sentido. A taxa de precariedade caiu seis pontos percentuais para 16% em 2022, face aos 22% de 2015. Temos menos 125 mil trabalhadores com contratos a termo certo ou incerto face a 2015, e menos 20 mil colaboradores face a 2021. Mas ainda não é suficiente.

Por isso, a Agenda do Trabalho Digno é um instrumento tão importante para garantir a capacidade de valorizar os jovens no mercado de trabalho e assegurar que a evolução que fizemos nos últimos anos na taxa de precariedade vai ainda mais longe, assumindo o compromisso de passar dos actuais 16% para 10%, em 2030. Estamos a procurar colocar no terreno medidas que tenham esta meta em consideração.

 

Por que continuam os jovens a ser dos grupos mais vulneráveis?
Se, por um lado, os jovens hoje são a geração mais qualificada de sempre, a verdade é que o mercado de trabalho tem mostrado dificuldades em acomodar em pleno esta realidade, registando valores de desemprego jovem sistematicamente superiores aos do desemprego total.

Durante 2022, o desemprego jovem registado alcançou o valor mais baixo de sempre. Eram 27 mil jovens em Julho, o que compara com 79 mil em Julho de 2012. Mesmo nos dados do inquérito ao emprego, a taxa de desemprego jovem recuperou para o nível do pré-pandemia. Portugal conseguiu descer significativamente no ranking da União Europeia da taxa desemprego jovem, passando de um terceiro lugar, no segundo trimestre em 2012, para o 13.º lugar, no segundo trimestre de 2022.

 

Leia a entrevista na íntegra, conheça as 50 empresas signatárias e o testemunho de Carlos Oliveira, presidente executivo da FJN, na edição de Fevereiro (nº. 146)  da Human Resources, nas bancas. 

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