Entrevista. «A pandemia veio reforçar a atractividade de Portugal enquanto destino para trabalhar»
Em cinco anos, a multinacional francesa Webhelp passou de uma equipa de 30 para 2000 pessoas em Portugal. O ano de 2020 foi o melhor em termos de taxa de sucesso de recrutamento e preparam-se para recrutar mais 500 profissionais. Carlos Moreira, CEO da empresa em Portugal, não tem dúvidas de que Portugal está no mapa internacional do nearshoring de operações multilingues e que a pandemia veio reforçar a atractividade do nosso país enquanto destino para trabalhar.
Por Ana Leonor Martins
A Webhelp é uma multinacional francesa que presta serviços de Customer Experience / Business Process Outsourcing (BPO) nas áreas de serviço a cliente, suporte técnico, back office, vendas, serviços digitais e de pagamento, entre outras. Operam a uma escala global em 49 países «para algumas das maiores multinacionais e marcas líderes nos seus mercados», afirma o CEO da empresa em Portugal, Carlos Moreira. «Neste momento somos líderes europeus no nosso sector e temos como ambição alcançar uma posição de liderança a nível global.» O responsável partilha o percurso que a Webhelp tem feito no nosso país para ajudar a concretizar este objectivo.
Estão em Portugal desde 2015. Sendo uma multinacional francesa, o que motivou esta aposta no nosso país e justifica o investimento de mais de oito milhões de euros que já foi feito desde então?
A Webhelp analisa de forma contínua as potencialidades de diversos países para possíveis aberturas de escritórios. Em 2015, alguns dos clientes da empresa mostraram interesse em ter o outsourcing dos seus contact centers em países nearshore, dentro do mercado europeu, e Lisboa rapidamente se posicionou na linha da frente como localização para essas operações. Por esta altura, Portugal – e nomeadamente Lisboa – já eram referências neste tipo de actividades e a decisão de investimento foi natural.
O crescimento deste tipo de actividades tem sido exponencial em Portugal e o nosso investimento acompanha esse potencial.
Que mercado encontraram e que evolução registou nestes cinco anos?
Quando a Webhelp chegou ao mercado português, o mesmo já tinha diversos players internacionais que fizeram um trabalho bastante importante de colocar Portugal no mapa internacional do nearshoring de operações multilingues. Não tivemos de fazer um trabalho de venda do País como a localização ideal para este tipo de operações, ele já era reconhecido como tal.
Por outro lado, já apresentava uma maturidade bastante interessante do ponto de vista de recrutamento de perfis multilingues, com uma boa rede de recrutamento instalada. A evolução que se registou nos últimos cinco anos é que houve um crescimento significativo com o recrutamento de milhares de pessoas para trabalhar em empresas como a nossa.
Em termos de localizações, em 2015 só se pensava em Lisboa e agora temos outros polos de desenvolvimento importantes como o Porto e Braga. É este o trabalho que temos de continuar a fazer nos próximos anos, o de desenvolver outras regiões do país para este tipo de negócio.
A WebHelp tem estado a crescer, quer em termos de negócio, quer de equipa…
A Webhelp, desde a sua implementação em Portugal, tem crescido a um ritmo rápido e sustentado, iniciando com pouco mais de 30 pessoas e um pequeno escritório em Lisboa e sendo hoje uma empresa com cerca de 2000 colaboradores e 3 escritórios no território nacional. Termos crescido em cinco anos para duas mil pessoas é de facto notável.
Em termos de volume de negócios, em 2019 facturámos cerca de 40 milhões de euros e 2020 foi um ano de grande crescimento. A nível mundial, a empresa cresceu de forma bastante acelerada, tendo hoje mais de 65.000 colaboradores e um volume de negócios anual superior a mil e quinhentos milhões de euros.
Anunciaram a abertura de mais dois escritórios em Portugal, em Lisboa e Braga, o que se vai traduzir na criação de 500 postos de trabalho. Que perfis procuram?
Procuramos todo o tipo de perfis, desde assistentes de Apoio ao Cliente, a supervisores, gestores operacionais e analistas de Segurança até gestores de Projecto. Sempre num perfil que seja multilingue, uma vez que praticamente a totalidade das nossas operações são em língua estrangeira.
Sendo que ainda estamos em pandemia, como estão a recrutar?
Para nós o choque não foi grande dado que uma boa parte do nosso recrutamento já era feito num formato 100% digital, em que nos apoiamos em ferramentas como o Skype e Teams para podermos proceder às entrevistas. E todos os nossos testes de língua e skills acontecem online.
Claro que os nossos recrutadores tiveram de se adaptar a esta forma de recrutar, nos perfis ou localizações onde no passado não era feito 100% online, melhorando a sua capacidade de captação de bons perfis à distância. Naturalmente que isto permitiu desenvolver as capacidades da nossa equipa e não sofremos qualquer tipo de impacto em termos de recrutamento. O ano de 2020 foi o nosso melhor em termos de taxa de sucesso de recrutamento.
E onde estão a recrutar? Em Portugal? Ou a proveniência dos profissionais é indiferente?
Durante o período de maior confinamento recrutámos apenas em Portugal, devido a todas as limitações de viagens que impactavam os candidatos. A partir de Agosto voltámos a contratar internacionalmente, mas tendo presente as maiores regras de segurança de forma a termos o bem-estar dos nossos colaboradores como prioridade, quer os que já se encontram connosco, como os que agora se juntam a nós.
Acha que a pandemia veio reforçar ou fragilizar a atractividade de Portugal enquanto destino para trabalhar?
Não temos dúvidas de que veio reforçar. Portugal tem uma das melhores infraestruturas ao nível de telecomunicações, o que nos permite a quase todos trabalhar a partir de casa com uma boa qualidade de rede. Este ponto é essencial para a nossa actividade, dado que estamos em contacto permanente com clientes e a comunicação tem de fluir com qualidade.
Esse não é o caso de muitos países que não fizeram o investimento que nós fizemos e que agora estamos a ver o retorno. A pandemia trouxe disrupção em alguns países e Portugal foi beneficiado com volumes de trabalho adicionais porque conseguia garantir qualidade de comunicação, recrutamento e segurança.
No futuro, as grandes empresas vão ter mais cuidado na decisão sobre onde colocar as suas operações, procurando um nível de risco mais baixo na sua estratégia de localização. Portugal terá imensas oportunidades nesta nova realidade pós-pandemia.
Afirmou que Portugal é dos melhores destinos a nível mundial para instalar hubs multilíngues. Porquê?
Consideramos que, em Portugal, existem as bases ideais para se instalarem hubs multilingue devido a vários factores, mas principalmente porque encontramos no nosso país uma diversidade de pessoas bilingues e multilingues de nível fluente ou nativo, algo essencial para este tipo de actividade.
Quando não conseguimos contratar o perfil desejado localmente, temos a facilidade de ser um país extremamente atractivo para pessoas de outras nacionalidades. Ou seja, a base de tudo, que são as pessoas, está garantida. Se juntarmos a isso uma infraestrutura tecnológica e de telecomunicações de classe mundial, cada vez melhores instalações e condições de trabalho para os nossos colaboradores e a flexibilidade das leis de trabalho portuguesas, temos os ingredientes necessários para o sucesso e para sermos competitivos em relação a outras localizações onde se podem instalar centros multilingues.
No entanto temos de ser realistas, dado que a concorrência é feroz. Apenas dando o nosso melhor e criando a escala e competência necessárias, nos permitirá no futuro continuarmos a fazer crescer este tipo de actividade em Portugal, que é essencial em termos de criação de postos de trabalho.
Empregam actualmente já mais de 2000 colaboradores em Portugal, de 53 nacionalidades diferentes, falando-se 12 línguas. Quais os desafios na gestão de uma equipa tão diversificada, culturalmente?
O grande desafio aqui é conseguirmos que esta diversidade não se perca e que as diferentes culturas se mantenham activas e trabalhem juntas, mas também criar um sentimento de comunidade Webhelpiana entre todos os colaboradores, para que os mesmos vivam os valores e pilares da nossa empresa.
De resto, temos de ser compreensivos e flexíveis em relação a alguns hábitos culturais próprios de cada nacionalidade, mas garantindo as bases de respeito e equidade que temos de ter com todos os colaboradores.
A diversidade – e a inclusão – manifesta-se noutros âmbitos também? Quais?
Tentamos sempre ter em atenção as diferenças culturais através de acções e eventos inclusivos e que mostrem a diversidade existente na nossa empresa. Para além disso, somos extremamente activos ao nível da Responsabilidade Social, com acções ao longo do ano com impacto directo nas comunidades –acções com associações como a Adolescer e a Cerci Braga ou a Casa das Cores e, este ano, a Associação Sol. E com previsão de aumentarmos as nossas actividades com ONGs [Organizações Não Governamentais] de Lisboa/Oeiras e Braga em 2021, através do apoio da Think Human Foundation.
Assegurar uma equipa diversa e inclusiva é uma “preocupação”/ prioridade para vocês? Porquê?
É para nós importante ter uma equipa diversa, uma vez que essa equipa responde também a colaboradores diversificados, por isso, temos a preocupação de termos pessoas que sejam uma referência para os mesmos e os façam “sentir em casa” quando trabalham para a Webhelp.
O mesmo se passa quando lidamos com os nossos clientes, em que ter uma grande diversidade é uma força importante.
Essa diversidade acontece de forma natural ou seguem algum tipo de métricas?
Na verdade, acaba por acontecer de forma muito natural. Não impomos a diversidade, mas tendo em conta as características das nossas equipas e do nosso negócio, é mais do que normal que as equipas sejam diversificadas e multiculturais. Aliás é um dos pontos atrativos da Webhelp para os nossos candidatos.
Qual a importância que acredita que este tema assume no negócio? Ou é “mais” uma questão de assegurar igualdade de oportunidades?
Para a Webhelp, a igualdade de oportunidades é um dado adquirido. Se formos analisar de uma forma mais abrangente, o sector de actividade de Customer Experience / BPO é um dos que mais possibilita uma maior igualdade de oportunidades.
Para nós, um bom colaborador não significa estar limitado devido ao seu nível de escolaridade, experiência profissional anterior ou outros factores. Esta é uma verdadeira escola profissional, seja para pessoas que estejam a iniciar a sua carreira ou que estejam a mudar o seu percurso profissional.
No nosso caso, temos a Webhelp University que nos permite potenciar quer o novo talento quer a reconversão profissional de pessoas de outros sectores. Com o crescimento acelerado que tivemos nos últimos anos neste sector, não existe outro ramo de actividade que tenha dado, em número absoluto, tantas oportunidades de progressão profissional a milhares de pessoas na última década.
A WebHelp foi considerada um dos melhores locais para trabalhar em Portugal no ranking Great Place To Work nos últimos dois anos. O que acredita que o justifica?
É para nós um enorme orgulho sermos há dois anos consecutivos um Great Place to Work – que esperamos poder transformar em três este ano – em Portugal. Este é um reconhecimento enorme dado pelos nossos colaboradores, que identificam a Webhelp como sendo uma empresa diferente, com um espírito forte de equipa/família e em que a preocupação com o colaborador é uma prioridade constante nas nossas acções e decisões. E isso reflete-se no dia-a-dia da empresa e da vida das nossas pessoas.
Termos sido a única empresa do nosso ramo de actividade a estar no Top 25 em Portugal nos últimos dois anos é algo de notável.
Actuando no apoio ao cliente, que desafios particulares vos veio trazer a pandemia?
Neste ponto, não podemos dizer que nos trouxe desafios ao nível do apoio ao cliente. Na forma como trabalhamos sim, uma vez que passámos de uma operação 100% no escritório, para uma operação com mais de 75% dos colaboradores em teletrabalho, que implica ajustes na forma de produzir, de formar, de gerir e de garantir a segurança da informação. Mas a verdade é que as nossas equipas de IT, operações e formação deram uma rápida resposta a todos os desafios que foram enfrentando, o que nos permitiu não ter impacto devido a pandemia.
Vão mudar o vosso modelo de trabalho de forma permanente, como consequência da aprendizagem dos últimos meses?
Claro que sim, vamos implementar em todo o Grupo Webhelp uma forma híbrida de trabalhar, em que a maioria dos colaboradores passará algum tempo em teletrabalho e outro no escritório. Isso vai permitir-nos aumentar os nossos efectivos de outra forma e responder a mais oportunidades de novos clientes que nos surjam.
Por outro lado, vamos continuar a desenvolver a formação online e de monitorização, para nos tornarmos mais eficientes nestes dois campos.
Que objectivos delinearam para 2021 e quais os principais desafios que perspectivam?
Os nossos grandes objectivos para o próximo ano são os de crescimento da actividade. Temos dois novos sites a abrir durante o ano que nos permitirão aumentar a nossa capacidade em 500 postos de trabalho no futuro imediato e muitos mais num prazo de três anos.
Para além disso, os desafios do dia-a-dia mantêm-se, tais como conseguir continuar a recrutar perfis qualificados à distância e como lidar com os receios das pessoas para sair do seu país e vir viver e trabalhar em Portugal.
No entanto, encaramos todos eles com a confiança de quem em 2020 deu provas de fazer frente a todos os desafios que nos foram colocados, num ano tão atípico, e poder apresentar óptimos resultados no final do mesmo devido ao excelente trabalho de todos os nossos Webhelpianos.