Entrevista: «Não sei se sairemos melhores gestores, mas sairemos certamente gestores diferentes», afirma responsável na Continental Advanced Antenna

A Continental Advanced Antenna foi das poucas empresas do seu sector a manter as “portas abertas” durante o Estado de Emergência. Tem sido um exercício de gestão “sem rede” e se alguma certeza têm é a de que nunca como hoje o valor corporativo “Uns pelos Outros” fez tanto sentido.

 

Por Ana Leonor Martins

 

Em entrevista à Human Resources, Patrícia Oliveira, Human Relations and Communication manager da Continental Advanced Antenna, em Vila Real, explica não só como estão a gerir esta crise, assegurando os postos de trabalho dos seus mais de 560 colaboradores (é o maior empregador privado do distrito), mas também o caminho que vinham traçando na Gestão de Pessoas, nomeadamente após a integração no grupo Continental.

 

Numa primeira fase, como é que a Continental Advanced Antenna (CAA) reagiu e geriu a situação de crise criada pela pandemia COVID-19?
A CAA adoptou medidas de prevenção desde muito cedo, mesmo antes de ter sido decretado o Estado de Emergência pelo Governo. A nossa prioridade foi sempre manter a segurança dos colaboradores. Na gestão desta crise, o primeiro passo foi criar uma equipa de Contingência Interna que se dedicou à criação do plano e à sua gestão desde então. E fomos das poucas empresas no nosso sector a manter as portas abertas ao longo de todo o Estado de Emergência, mesmo que tenhamos tido redução de pessoas e actividade.

 

E que medidas em concreto adoptaram?
Posso referir algumas das mais importantes e que garantem, de uma forma directa, a segurança dos nossos colaboradores. Limitámos de imediato a entrada de visitas externas na empresa, sendo que quem entra é alvo de um controlo apertado. Promovemos o teletrabalho e as reuniões à distância. Optámos por solicitar os serviços de um enfermeiro, que está na empresa durante 40 horas por semana, de forma a dar apoio exclusivo nesta área. Oferecemos a cada colaborador uma solução desinfectante individual, para garantirem a desinfecção regular das mãos. Para além disso, a utilização de máscara passou a ser obrigatória nas instalações.

Nas áreas sociais implementámos medidas de distanciamento físico, bem como a desinfecção regular de todos os espaços comuns e espaços de trabalho. Procedemos ao controlo de temperatura na entrada das instalações e criámos uma linha interna de apoio, de forma a garantir que as nossas pessoas têm resposta às suas questões de uma forma adequada.

 

Quais têm sido as vossas prioridades na gestão desta crise, para além de garantir a segurança e saúde das vossas pessoas?
Estando conscientes da nossa dimensão e respectivo impacto na região, em paralelo estivemos também focados em assegurar a sustentabilidade económica e social da empresa. Enquanto maior empregador privado do distrito, consideramos fundamental esta preocupação, já que dela depende a manutenção dos postos de trabalho a médio prazo, e porque prezamos o bem-estar e estabilidade das famílias que fazem parte da nossa equipa.

A combinação destes vários factores sustentou a decisão de manter a laboração em turnos reduzidos, e equipas a laborar em “espelho”, evitando o total encerramento, sem comprometer postos de trabalho nem a qualidade do serviço prestado ao cliente.

 

Mantiveram em actividade só cerca de 60% dos colaboradores… Recorreram ao regime de lay-off?
Tendo em conta a grande diminuição do volume de encomendas dos clientes, também eles afectados pelo cenário de afastamento e recolhimento social, tivemos, sim, de recorrer ao lay-off simplificado. Este recurso aconteceu numa percentagem muito reduzida face a outras medidas de maior abrangência e impacto, nomeadamente o recurso ao teletrabalho nas funções em que foi possível, o gozo de férias ou a assistência à família.

 

E como conseguiram gerir essa situação juntos das pessoas?
A nossa cultura de abertura e proximidade com as nossas pessoas levou a que estas medidas tenham sido entendidas como necessárias para a manutenção da equipa a longo prazo. Cada decisão foi pensada por forma a impactar o mínimo possível o dia-a-dia dos colaboradores e, uma vez que nos focámos numa comunicação próxima e transparente, consideramos realmente que houve um grande respeito e aceitação por parte de todos.

 

Que iniciativas estão a promover, nomeadamente com as pessoas que têm em teletrabalho? Como se mantém o engagement e motivação das equipas numa situação como esta?
Actualmente, e já há alguns anos, é de conhecimento generalizado que vivemos num mundo VUCA, o que acresce desafios para a Gestão de Pessoas. Prova disso é, exactamente, o cenário actual, que nos traz uma constante imprevisibilidade sobre o dia de amanhã.

É, justamente, por esta razão que considero que a manutenção do engagement e motivação das nossas pessoas tem de assentar numa estratégia coerente, consistente e continuada, e que só é possível manter esta motivação e envolvimento, em cenário de teletrabalho, lay-off e redução de trabalho, porque já existia uma genuína preocupação com as pessoas em toda a estratégia de gestão da organização.

Nesta fase em particular, a gestão da comunicação tem assumido um papel de relevo. Procuramos, mais do que nunca, que a mensagem chegue a todos os colegas de forma cuidada, rigorosa e transparente, e reforçámos a frequência de comunicação.

 

Mas sendo que o teletrabalho não deveria ser prática regular no vosso dia-a-dia, tiveram de adaptar as formas de comunicar…
Sim… Antecipando que o teletrabalho poderia trazer algum desconforto e, até, insegurança, dada a repentina privação da rotina habitual de trabalho, para este grupo de colegas tivemos uma especial atenção na promoção de canais de comunicação digitais que aproximassem e facilitassem a interacção entre as equipas e os seus líderes, fomentando o sentimento de pertença.

Já no que diz respeito aos colaboradores da produção, que não têm acesso à maior parte das ferramentas digitais, a CAA apostou recentemente na utilização de uma aplicação de envio de sms, especialmente para dar resposta às necessidades inerentes a esta pandemia.

A título de exemplo, e apesar de ter sido um projecto calendarizado apenas para o 2.º semestre de 2020, decidimos antecipá-lo, e lançámos a nossa televisão corporativa. Este é um dos meios de comunicação interna por excelência, pelo dinamismo que aporta à organização.

 

E que outras iniciativas promoveram?
Paralelamente ao desenvolvimento de ferramentas de comunicação inovadoras, procuramos promover o desenvolvimento e crescimento pessoal dos colaboradores, através da divulgação de conteúdos comportamentais em diferentes formatos, como acções de formação, webinares, masterclasses, reuniões temáticas, assessments, etc. Neste âmbito, posso partilhar que, em finais de Março, lançámos a primeira masterclasse online – “Mindset positivo em tempos incertos” –, cuja adesão superou largamente as nossas expectativas.

Como sabemos que em cada situação negativa devemos sempre retirar algo de positivo, lançámos também uma newsletter semanal – “Virar a Página” –, foca- da apenas em boas notícias ou boas práticas nacionais ou internacionais que esta pandemia trouxe. Incluímos ainda sugestões e actividades que todos nós podemos fazer a partir de casa.

A comemoração de dias temáticos sempre fez parte da nossa estratégia de  promoção de engagement nos colaboradores, por isso, pela altura da Páscoa, oferecemos a cada colaborador um miminho com uma mensagem de agradecimento e motivação. Foi um pequeno gesto, mas com muito significado, que foi recebido com muito carinho por todos os colegas.

Neste momento, encontramo-nos a preparar uma surpresa para reconhecermos e agradecermos aos colaboradores que permaneceram na linha da frente ao longo deste processo desde o primeiro momento, mas não posso dizer mais caso contrário iria estragar a surpresa.

 

O que diria que tem sido mais difícil gerir nesta crise?
A imprevisibilidade e a incerteza, aliada ao impacto global que esta pandemia tem tido. Nenhum de nós, enquanto gestores de Pessoas, estudou ou foi preparado para um contexto adverso como o que estamos todos a viver. Fazer uma gestão onde as pessoas estão com uma carga emocional tremenda e ter de, muitas vezes, tomar decisões mais racionais, tendo por base o incerto e o imprevisível, é um exercício diário desafiante, ainda para mais quando procuramos, durante todo este processo, passar uma mensagem de esperança e motivação.

Este é um exercício de gestão “sem rede” e por isso um desafio enorme que não
podemos, de todo, menosprezar. Não sei se sairemos melhores gestores, mas sai- remos certamente gestores diferentes!

Torna-se assim mandatória a vivência dos nossos valores corporativos, particularmente do nosso valor “Uns pelos Outros”, que nunca fez tanto sentido como nos dias de hoje. Não só dentro da companhia, como na sociedade global em que vivemos. Através dele, podemos espelhar a união, o trabalho em equipa, a cooperação e respeito pelo bem comum.

 

Antes de esta situação surgir, quais eram as vossas prioridades em termos de Gestão de Pessoas?
Temos duas grandes áreas em termos de Gestão de Pessoas: a primeira incide sobre a gestão laboral e administrativa, e visa o maior respeito pelo cumprimento de prazos de pagamentos de salários e outro tipo de bonificações, bem como o atendimento e esclarecimento dos colaboradores em matérias administrativas e legais, assegurando sempre o seu conforto e confiança para com a organização; a segunda área é a de desenvolvimento de relações humanas, sejam individuais sejam intra e inter-equipas.

Desafios como a globalização, a digitalização, a constante gestão num mundo VUCA, as relações intra-geracionais e evolução tecnológica, entre outros, têm tornado os cidadãos cada vez mais exigentes no que respeita às suas escolhas pessoais e profissionais, enfatizando a necessidade do desenvolvimento de recursos humanos na Continental. Na CAA, o desenvolvimento de pessoas acontece ao longo de um processo que visa a manutenção e desenvolvimento de uma cultura organizacional forte, totalmente alinhada com os valores corporativos.

 

Quais têm sido os principais desafios?
Este é um projecto que me tem acompanhado ao longo de toda a minha carreira, e que reflecte o meu modelo de Gestão de Pessoas, mas pelo qual tenho um especial carinho nesta fase. A verdade é que quando agarrei este projecto, ainda na Kathrein Automotive, tive em mãos o enorme desafio de construir um departamento orientado pela gestão estratégica de Recursos Humanos que, até à data, não existia, privilegiando apenas a área administrativa, embora de forma igualmente responsável e respeitando sempre os direitos dos trabalhadores. Assegurada essa componente, o meu objectivo foi tornar-nos um empregador mais competitivo no mercado futurista, na perspectiva de desenvolvimento pessoal e profissional.

Este tem sido um projecto de sucesso, do qual me orgulho bastante, e que se reflecte no bem-estar dos colaboradores. Com a chegada do grupo Continental, esta abordagem ganhou ainda mais importância e ferramentas, sobretudo por se tratar de um grupo que valoriza bastante a diversidade, a criatividade e o
desenvolvimento de competências humanas como factor diferenciador e de vantagem competitiva.

 

A CAA resultou da aquisição da Kathrein Automotive. Sendo um processo recente, calculo que ainda estivessem em fase de integração. Como estava/está a ser geri-do esse processo?
O processo de integração tem sido feito de uma forma “smooth”. Existiram departamentos que, pela sua natureza, tiveram prioridade no processo de integração, nomeadamente a Direcção Financeira e a Direcção de Relações Humanas, mas é um processo que ainda continua e que irá continuar por mais algum tempo, sobretudo se incluirmos no processo de integração a “aculturação” de todos os colaboradores.

 

O facto de estarem integrados no grupo Continental ajuda-vos, por exemplo, em termos de employer branding? Como estão a trabalhar esta área?
O facto de estarmos integrados no grupo Continental é, sem dúvida, uma vantagem em termos de employer branding, uma vez que o grupo tem uma estratégia definida a nível global. O maior desafio que temos nesta área talvez seja a percepção acerca da marca. A indústria automóvel está a passar por uma enorme transformação e as competências necessárias para competir estão a mudar. A Continental é muito conhecida como fabricante de pneus, mas o negócio do grupo não se esgota nesta área, e a CAA é um exemplo disso mesmo.

A Continental tem apostado numa forte presença digital, nomeadamente com diferentes canais nas redes sociais como o Facebook, o Instagram, o LinkedIn, conseguindo assim, aproximar a marca a potenciais candidatos.

Como estratégia de captação de potenciais candidatos, ao longo do último ano, temos marcado presença nas feiras de emprego e temos apostado na realização de workshops temáticos nas nossas instalações, onde convidamos diferentes escolas, instituições e universidades.

No nosso plano de comunicação anual temos previstas várias acções de employer branding, com destaque para o programa de “Embaixadores Internos”, lançado no ano passado e que faz dos colaboradores os principais embaixadores da marca. Este grupo tem sido fulcral na aculturação da organização.

 

Diria que a vossa área de actuação é atractiva para trabalhar? O que torna a CCA, em particular, atractiva para trabalhar?
A nossa área de negócio – a conectividade – é uma tendência na indústria automóvel, situação que por si só nos torna uma empresa atractiva para trabalhar. Além disso, temos uma grande preocupação com as nossas pessoas, sendo elas o centro da nossa actuação. Procuramos dar a quem trabalha connosco muito mais do que uma simples experiência profissional. Preocupamo-nos para que exista um equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. Nesse sentido, promovemos muitas vezes a participação da família dos nossos colaboradores nos eventos e iniciativas da empresa. Oferecemos vouchers de educação aos filhos dos colaboradores, presenteamos os colaboradores que são pais, através de um kit de nascimento, onde constam vários produtos essenciais para o bebé. Todos os colaboradores da CAA têm direito a um seguro de saúde, temos disponíveis vários protocolos com diferentes entidades, entre outros benefícios. A nossa preocupação é sempre o bem-estar das nossas pessoas, e é nesse sentido que vamos continuar a trabalhar.

 

Qual o vosso principal desafio agora?
Pensando numa época pós COVID-19, o principal desafio é retomar a nossa actividade ou até podermos crescer, eventualmente apostando em novos produtos que sejam âncoras e estratégicos para o nosso negócio. Claro que tendo sempre a consciência de que continuaremos no processo de integração na nova cultura organizacional e dando a conhecer ao mercado nacional o propósito da Continental Advanced Antenna enquanto empresa inserida no grupo Continental em Portugal.

 

Este artigo foi publicado na edição de Maio da Human Resources, nas bancas.

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