
Envolvimento no trabalho? A linha ténue entre engagement e workaholism
Por Daniela Geraldes, Professora do Mestrado em Psicologia Social e das Organizações, Ispa – Instituto Universitário.
Termos colaboradores dedicados, com paixão pelo seu trabalho e com uma incessante energia é, sem dúvida, o intento de todas as organizações. É este colaborador que procuramos em cada processo de recrutamento, que valorizamos anualmente na avaliação de desempenho e a quem, no final de cada dia de trabalho – muitas vezes, já fora de horas – agradecemos o empenho.
Mas será que sabemos quando estamos perante um colaborador engaged ou workaholic? Quão ténue é esta linha?
Tem-se percebido que é o afeto positivo (nomeadamente a diversão) que rege o limiar entre estes dois estados de grande envolvimento no trabalho. A paixão pelo trabalho tem aqui, portanto, alicerces distintos. E por isso, é fácil compreender que é assim, nos contextos atuais onde o foco no resultado/objetivo se sobrepõe a tudo o resto, que rapidamente deixamos de ter um colaborador engaged para ter um trabalhador preocupado e com dificuldade em desligar. Adicionalmente, com a generalização do trabalho remoto e a nossa constante conexão digital, tem-se compreendido que esta linha foi-se tornando ainda mais ténue. Ainda que, visto de fora, estes colaboradores dedicados nos pareçam igualmente produtivos, a verdade é que vão viver o contexto organizacional – e a sua saúde mental – de formas completamente díspares.
De facto, num mundo onde é tão difícil desconectar e onde o resultado é cada vez mais importante que o processo, o que podemos fazer nas organizações para proteger as pessoas?
A solução pode passar tão simplesmente por desnivelar a balança e potenciar o engagement, através de um dos principais recursos que uma empresa pode ter: a chefia. O seu suporte pode ser a peça chave para o afeto positivo, tão necessário nos contextos atuais. Será que não prejudicamos colaboradores dedicados e engaged, ao pedir sempre mais a quem produz copiosamente? Não estaremos, de forma inconsciente, a “prejudicar” quem tão bem trabalha? A verdadeira preocupação com a carga de trabalho e esta cultura de overwork pode ser decisiva. É aqui que o estabelecimento de limites dentro do que é a autonomia de cada função, o equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal e a harmonia entre as exigências profissionais e a recuperação atuam como práticas meritórias. Em última análise, pedir sempre mais a quem entrega, pode meramente esgotar todos os seus recursos. Como tal, investir no engagement ao invés de potenciar o workaholism deve fazer parte dos pilares estratégicos de uma organização.
Como reflexão, convido-o a um momento de autoavaliação. Será que consegue perceber, no piloto automático do dia a dia, se o seu envolvimento com o trabalho ainda tem o seu quê de diversão ou se está já formatado a cumprir a extra mile habitual? Espero que o afeto positivo ainda esteja presente e, caso contrário, que a rota possa ser recalculada – a sua e a dos que trabalham à sua volta. Afinal, somos todos frutos de um espelho organizacional.