
Executive Breakfast. IA na Gestão de Pessoas: Enfrentar os desafios e abraçar as oportunidades
A inteligência artificial (IA) não é futuro, é presente, e já está a mudar a forma como trabalhamos. Mas o seu potencial é algo que ainda não conseguimos compreender na totalidade. Sabe-se que precisamos de pessoas mais preparadas, lideranças mais capazes e gestores de pessoas mais estratégicos. No mais, é enfrentar os desafios e abraçar as oportunidades. Conheça as reflexões – e inquietações – partilhadas por 16 especialistas de diferentes sectores, em mais um Executive Breakfast promovido pela Human Resources, desta feita em parceria com a Randstad.
Por Ana Leonor Martins | Fotos Nuno Carrancho
Onde estamos e até onde podemos ir foi o mote. Mais do que perceber como a inteligência artificial (IA) está a ser usada nas empresas – e com que resultados – o objectivo deste pequeno-almoço foi perceber como esta tecnologia está a ser usada, nomeadamente no e pelo departamento de Gestão de Pessoas. Em que áreas já está ser usado – com que impacto – e em quais poderá ter maior potencial transformador, num futuro próximo? O que pode acrescentar em cada uma das fases do “ciclo de vida” de um colaborador na empresa – da atracção à retenção de talento, passando pelo desenvolvimento de carreira? Quais os principais desafios, para que riscos é preciso estar atento e que questões éticas se levantam? Como se gere a tensão entre eficiência e humanização e equilibra a crescente automatização com a necessidade de manter uma cultura organizacional humana? E como se estão a preparar as equipas de Recursos Humanos (RH), as chefias e as pessoas, no geral, para estas mudanças? Ou seja, em que ponto estão as empresas, o que se pespectiva e como se estão a preparar? E qual o papel estratégico dos RH nesta nova Era.
Estas questões serviram de ponto de partida para o Executive Breakfast que se realizou em Março passado, no Pestana Palace, em Lisboa, reunindo à mesa especialistas de vários sectores, do Turismo à Aviação, passando pela Saúde, Banca, Telecomunicações, Distribuição e Retalho. Foram eles: Ana Gama Marques, directora de Pessoas e Organização da MEO; Catarina Rocha, HR Business Partner da DECO Proteste; Cláudia Ramalho, People lead na MC | Sonae; Fernanda Gomes, manager de Gestão de Serviços e BPO SNS24 na MEO; Francisco Viana, director central de Recursos Humanos da Caixa Geral de Depósitos (CGD); Isabel Heitor, directora de Pessoas e Cultura da ANA Aeroportos; Joana Cardoso e João Palmeira, respectivamente Operational Control supervisor e director de Operações da Garland Logistics; José Luís Carvalho, director de Gestão de Pessoas da CUF; Sandra Santana, responsável pela área de Learning and Development e Talent Acquisition da Vodafone Portugal; Verónica Soares Franco, membro da Comissão Executiva do Pestana Hotel Group, com o pelouro dos Recursos Humanos; e, da Randstad Portugal: Erica Pereira, directora da área de Professional; Isabel Roseiro, directora de Marketing e Comunicação; João Oliveira, director de área digital; Pedro Empis, director da área de Operational Talent Solutions; e Pedro Mega, director da área de Enterprise.
Adopção, a velocidades diferentes, e áreas em destaque
Como ponto de partida para a reflexão, Isabel Roseiro começou por partilhar os mais recentes desenvolvimentos produzidos pela Randstad Research, que faz vários estudos nas diferentes áreas de Recursos Humanos, estando «a IA na ordem do dia». Em 2024, foi conduzido um estudo aprofundado sobre o impacto da IA no mercado de trabalho em Portugal, replicando a metodologia do World Economic Forum e estimando perdas e ganhos – em termos de projecção de emprego –, e produtividade. Este ano, o foco passou para a função de Recursos Humanos, considerada uma área de “alto risco”, não apenas pelo impacto que a IA poderá ter, mas também pelas múltiplas restrições legais, éticas e operacionais que levanta. As aplicações mais frequentes da IA na Gestão de Pessoas situam-se não só no no recrutamento, mas também na formação e gestão de carreira.
«Há muitas limitações, mas também muitas oportunidades», salientou a responsável. E, nesse sentido, mais do que um estudo, a Randstad organizou um documento de trabalho que pretende funcionar como um benchmark fiável, reunindo práticas, case studys e orientações de entidades oficiais, nacionais e europeias, não só sobre o que está a ser feito, mas sobre o que pode, e não pode, ser feito no domínio da IA aplicada à Gestão de Pessoas. Até porque «estamos a falar de multas elevadas, que podem ir até aos 35 milhões de euros ou 7% da facturação global, por isso importa estarmos bem informados e preparados», sublinhou, dando o mote para o debate entre os especialistas.
Embora em diferentes estágios de maturidade, todas à volta da mesa reconheceram o potencial transformador da inteligência artificial. Começando-se por fazer notar que a regulamentação excessiva pode funcionar como um “travão”, partilhou-se que está a ser feito um investimento avultado. «Acreditamos que é uma tecnologia que vai transformar de forma irreversível a nossa forma de trabalhar, por isso estamos a fazer um caminho sério para a adopção, mas ainda com alguns “passos cegos”.» Adquiriram licenças de Copilot para a larga maioria dos colaboradores e têm investido em programas de formação, com early users a liderar a adopção e a partilha de boas práticas. «Ainda são passos curtos, mas já sentimos o impacto», afirma-se. Nomeadamente na Gestão de Pessoas, já existe um assistente digital, «que ainda não tem informação individualizada, mas funciona para perguntas mais generalistas de políticas de RH, dando resposta automática a algumas dúvidas frequentes das pessoas».
A IA também está a ser usada no recrutamento, por exemplo para comparação e selecção de CV. Nesta área há uma expectativa enorme sobre o que a IA pode fazer, «mas a verdade é que existem muitos limites. Se estivermos a usar IA para gerar relatórios com base em dados de assessment, isso pode ser passível de multa», chamou-se a atenção.
Mas a crença é que «aqueles que forem capazes de utilizar e fazer a diferença na utilização da IA – e o objectivo é encontrá-los sobretudo dentro de casa –, vão ter mais vantagens. Alguns empregos vão desaparecer, mas estamos num processo de maximizar a eficiência, que já não é de hoje, revela-se, admitindo-se que, actualmente, estão «ávidos de resultados, mas ainda não aconteceu nada de extraordinário». Ainda assim, «ver a tecnologia a funcionar é absolutamente fantástico». Exemplifica-se: «Já tivemos um fornecedor, numa reunião, a falar em italiano, com tradução simultânea para chinês. Eliminámos a necessidade de ter um tradutor.»
Há empresas ainda a dar os primeiros passos. «Ainda não estamos a investir significativamente, porque se tem passado muito tempo a discutir o tema», admite-se. «O caminho ainda está a ser desenhado, a prioridade tem sido sensibilizar a comissão executiva para a importância e integrar o tema na estratégia global.» Corrobora-se que «há um potencial enorme na parte do recrutamento – que é uma área que ocupa muito tempo e implica muito trabalho administrativo –», estando a ser implementadas novas soluções, «ainda não completamente testadas». Também têm um chatbot para responder a questões genéricas, mas há uma terceira área de aposta, «muito relevante: tem a ver com o workforce management, com a gestão de escalas e recursos, dentro da lógica de que o trabalho se quer cada vez mais flexível e mais ágil. Permite também que as pessoas tenham maior autonomia e poder de decisões sobre a sua jornada de trabalho.»
Há empresas em que já há maiores avanços. Um dos especialistas descreve um ecossistema estruturado, com uma área dedicada à IA a trabalhar transversalmente com todas as direcções. Foram desenhados programas de aceleração de IA, tendo sido criados três grupos, consoante o tipo de pessoas: os que precisam aumentar a awareness do que é a IA, os que vão ter um papel mais activo e os que vão estar no desenvolvimento dos temas de IA.
«Já temos isso segmentado e comunicado à organização, para ajudar as pessoas a aderirem. E, na verdade, não temos muitos temas de falta de adesão», garante-se.
Os Recursos Humanos contam com um chatbot evoluído, capaz de responder a questões personalizadas, como o número de dias de férias, e com integração no portal interno. Existe também uma aplicação de apoio jurídico e laboral e canais digitais para resposta rápida a dúvidas dos colaboradores. Já no recrutamento – e não obstante serem reconhecidas as vantagens – não é uma área em que estejam a apostar, pois não é onde sentem maior necessidade, não estando a empresa a aumentar efectivos de forma significativa.
«Onde acreditamos que, a curto prazo, a IA será uma grande mais-valia é a nível do desenvolvimento de carreiras», destaca-se. «Temos um compromisso no que respeita à evolução profissional, porque as pessoas querem saber que percursos podem fazer, nomeadamente as carreiras zigue-zague.» Esta área liga-se à da formação e das competências, «ajudando a IA a identificar exactamente todas as competências que as pessoas têm, à data, e a saber quais precisam adquirir, para evoluírem. Vai ter um grande impacto na gestão das carreiras, na evolução profissional das pessoas, e na formação.» Com base no CV e no posicionamento de competências, os colaboradores podem receber recomendações de formação ajustadas ao seu perfil e às suas ambições, sendo possível desenhar planos individualizados. «Isto era impossível de fazer humanamente », destacou-se.
Leia o artigo na íntegra na edição de Abril (nº. 172) da Human Resources, nas bancas.
Caso prefira comprar online, tem disponível a versão em papel e a versão digital.