Inês Veloso, Randstad: «Comunicar é também ouvir quem trabalha na organização e saber o que os move»
A Randstad acredita que hoje, mais do que nunca, as pessoas estão no centro da equação e o employer branding deve reflectir sobretudo a identidade da empresa e o seu propósito. Só assim vai conseguir captar e reter o melhor talento, aquele que tem orgulho em ser Randstad.
O novo coronavírus paralisou uma parte significativa da economia global e do mercado laboral, tendo gerado fortes impactos, não só nos negócios como na própria forma de trabalhar.
Nos negócios porque, se antes, num mercado praticamente de pleno emprego, o desafio era encontrar talento, a pandemia, numa primeira fase, veio paralisar as contratações e os planos estratégicos de crescimento. Isso mesmo faz notar Inês Veloso, directora de Marketing e Comunicações da Randstad Portugal, acrescentando que, ao mesmo tempo, «do lado dos candidatos, vivíamos momentos de profunda confiança do mercado, que se reflectia na descida do critério da estabilidade como driver de decisão de emprego, e em Portugal a vontade de mudar era mesmo maior do que a média europeia».
Mas, com a pandemia, as intenções de mudança de emprego também foram adiadas, sendo que, depois do primeiro lockdown, o mercado foi-se reajustando lentamente, revelando assimetrias na retoma de oportunidades ligadas ao plano de desconfinamento. «Do lado do talento, e apesar do desemprego ter aumentado, o clima de incerteza, o medo de ir trabalhar e até as ajudas do Estado limitaram a aceitação de ofertas», constata a responsável, acrescentando que os candidatos que estão a trabalhar também se mostram menos permeáveis à mudança, sendo fundamental o acompanhamento de carreira e até a apresentação de novos benefícios que possam ajudar à vontade de mudança.
Já em relação à forma de trabalhar, a COVID-19 veio “apenas” acelerar uma transformação que já estava em curso na Randstad, onde já existiam diversas soluções tecnológicas implementadas para o processo de recrutamento e seleção, que estavam em fase de introdução e que, em 2020, passaram da excepção à regra, como a entrevista em modelo remoto, com garantia de protecção de dados e focado na experiência de clientes e candidatos ou mesmo a solução de gestão de horários, o YouPlan, com acesso mobile para o colaborador e total independência para o cliente fazer o seu planeamento. «Tínhamos também um benefício que nos permitia marcar um dia por semana de trabalho remoto e que, mais uma vez, deixou de ser a excepção para ser a regra», conta Inês Veloso.
Esta mudança foi acompanhada com mais acções de comunicação e de proximidade, tendo-se desenvolvido novos canais para que «o engagement não fosse prejudicado, mas sim beneficiado, especialmente num contexto de incerteza como o que vivemos».
Os desafios que se colocaram à organização e a necessidade de resposta à incerteza, potenciam relações de confiança, mesmo quando não se sabe as respostas. Para Inês Veloso, este é o maior desafio: «comunicar e estar próximo, não sabendo mais do que o colaborador, mas criando esse momento de comunicação». Para isso se reforçou o #EstamosAqui, «mais juntos do que nunca» e «a proximidade e a necessidade de encontrar novos canais para essa mesma proximidade e relação.»
Tendo sempre em conta que o Employer Branding é uma estratégia de médio e longo prazo, a Randstad manteve e reforçou muitos dos planos que tinha em curso, sendo que «a pandemia foi, e é, na verdade, um “acid test” à nossa proposta de valor, seja para os nossos colaboradores, seja mesmo para os nossos candidatos», reconhece a directora de Comunicação.
Dispersão não significa fim da proximidade
A estratégia de atracção de talento da Randstad passa pela comunicação continuada, através dos seus canais externos, com conteúdos específicos e diferenciadores para os candidatos, seja através da newsletter com estudos e artigos opinião ou do podcast #EverydayHero, onde são desenvolvidos temas relacionados com o emprego e as competências, com a presença de convidados especialistas. Inovam ainda nos canais de candidatura e no modelo de comunicação, com áudios partilhados por consultores, em que explicam as vagas e a proposta de valor da oferta.
Já internamente, a empresa especializada em Recursos Humanos tem em curso uma estratégia de employee advocacy, «dando sempre palco ao orgulho de ser Randstad e à experiência de trabalhar connosco». Inês Veloso garante que essa experiência não foi posta em causa com o teletrabalho, que não representou um obstáculo ao desenvolvimento da marca do empregador. «O employer brand é a dimensão da marca da empresa enquanto entidade empregadora e essa proximidade e relevância não existe apenas porque se trabalha no mesmo espaço físico, lado a lado. A proximidade e relação existem porque existe um propósito comum, porque os colaboradores se revêem nos valores da marca, porque a sua experiência é trabalhada desde o primeiro contacto até depois de saírem da empresa», afirma. «O employer brand não é um evento todos juntos, mas sim uma relação de confiança, e por isso é que tem de ser trabalhado a médio e longo prazo.»
Muitos líderes estarão hoje preocupados com a ligação às empresas porque as suas pessoas não estão no mesmo edifício, mas é preciso lembrar que muitas empresas já lidavam com a dispersão geográfica, como as multinacionais, por exemplo. Na visão da responsável, dispersão não significa que é impossível criar a relação, «o que exige é maior continuidade, mais canais de comunicação e diferentes estratégias para que, mesmo longe, sejamos apenas uma empresa, uma organização e uma identidade».
Foi por isso que a Randstad implementou diversas iniciativas e promoveu momentos de comunicação, como eventos de empresa mas também de equipas. A celebração dos 60 anos da organização com um brinde em directo e com um álbum fotográfico, é um dos exemplos, ou as sextas-feiras em que se ficou a conhecer o “lado B” dos colaboradores, o diário virtual para desabafos mesmo sem assinatura ou as acções de ginástica laboral.
Não obstante, Inês Veloso reconhece que, se em alguns casos o teletrabalho aumentou a proximidade nas empresas, noutros terá afastado, porque não houve uma adaptação aos novos canais e a esta nova realidade. «É importante que exista uma estratégia para esta nova forma de trabalhar e que os líderes sejam acompanhados para estar próximo das pessoas.»
Trabalhar remotamente impacta no ecossistema da gestão de pessoas, seja ao nível da comunicação, da liderança, da produtividade, da eficiência, da gestão de tempo, do engagement, da conciliação, pelo que «o teletrabalho exige que sejam revistos processos e a experiência do colaborador, que sejam analisadas estas dimensões para que sejamos todos mais felizes e para que hoje consigamos preparar o amanhã».
As pessoas no centro
Atrair, envolver, desenvolver e entregar resultados é o maior desafio das organizações, das lideranças e dos gestores de pessoas, mas não está limitado a uma área de negócio, é transversal, e tem de ser sentido, alinhado e trabalhado dessa forma.
Inês Veloso defende que a atracção de talento tem uma forte componente externa e de employee advocacy, porque os líderes e gestores de pessoas têm responsabilidade no seu acompanhamento e planeamento do seu desenvolvimento, mas ressalva que o colaborador tem de ter sensibilidade para compreender as suas próprias necessidades de desenvolvimento, sendo que o entregar resultados é o propósito de cada um, em conjunto. Os resultados são a combinação do individual no colectivo e a importância de atingir o “meu” verdadeiro potencial.»
«Mais do que nunca, as pessoas estão no centro da equação, são o elemento mais importante de decisão e que também comporta o maior risco», acredita a directora de Comunicação. «São as pessoas que trazem o melhor e o pior para as organizações, pelo que a responsabilidade na gestão de pessoas e de talento é hoje mais partilhada do que nunca, tudo para que se atinja o sucesso da organização.» Isto reforça a importância da comunicação interna, mas não pode ser colocada uma fronteira estanque com a comunicação externa, especialmente quando se trabalha a componente de employee advocacy.
Com a certeza de que «a comunicação é, hoje, ainda mais importante do que ontem, porque é na incerteza e na dificuldade que a comunicação é mais marcante e mais importante», a responsável sublinha que, «num contexto de crise, é preciso ser transparente, saber quando estar presente e falar, mas também ouvir. Por isso – continua –, a comunicação é fundamental para o employer brand, sempre foi, e mesmo quando se tentava “fechar a porta”, o employer brand estava lá, sem ser trabalhado, mas a criar percepções do que seria trabalhar naquela empresa, naquela marca.»
Mais: «Comunicar é a oportunidade de dizer os valores e o propósito da organização, mas é também o privilégio de ouvir os que trabalham com ela, o que os move e o que os faz felizes. Comunicar é estar ligado, mesmo que remotamente, porque só assim se criam relações, relações que têm de ser de confiança entre empresas e colaboradores.»
Por tudo isto, a Randstad não tem prevista nenhuma alteração à sua proposta de valor como consequência do contexto pós-pandêmico. Está, sim, numa fase de avaliação do que vai ser o seu modelo de trabalho no pós-pandemia, olhando para todo o ecossistema que envolve esta decisão e ouvindo os seus colaboradores. «Enquanto uma entidade viva que não se cansa de inovar e adaptar», vai continuar neste «processo de transformação fiel aos valores criados em 1960, e numa ambição a longo prazo: tocar a vida profissional de 500 milhões de pessoas em 2030, uma ambição que se liga com o propósito da empresa e que «nos move todos os dias a sermos cada vez melhores», confia Inês Veloso.
Walk the talk
A forma como as empresas reagiram à pandemia e como se adaptaram ao novo normal tem impacto directo na percepção da marca e na experiência dos colaboradores, e o Employer Branding Research da Randstad, que vai ser divulgado em Maio, vai mostrar algumas dessas alterações, revela a directora de Comunicação. «Vimos empresas com comportamentos muito diferentes: umas que, claramente, reforçaram a sua comunicação e proximidade e outras que, pelo contrário, tiveram maior dificuldade em adaptar-se e em ser relevantes.»
Sendo o employer branding a estratégia da marca e a execução da sua proposta de valor, a forma como as empresas respondem às várias dimensões da crise, seja na sua vertente social ou económica, vai ter impacto na percepção da marca e na experiência da mesma enquanto entidade empregadora. «O employer brand não é uma acção de um ano ou um “nice to have”, é estratégico e impacta na dimensão da marca enquanto marca de consumo e institucional e deve ser trabalhada em conjunto com as restantes dimensões, considerando a sua importância em todos os contextos», faz notar Inês Veloso.
«Os momentos de reforço da cultura da organização são, sem dúvida, os momentos em que mais do que dizer, temos de agir, temos de fazer o “walk the talk”, pois é na incerteza e nos ventos contra que a cultura reforça a ligação e o sentimento de pertença, criando uma nova energia para os colaboradores e um sentimento de unidade. O employer branding deve reflectir a identidade da empresa e o seu propósito, podendo ser um caminho a percorrer ou uma realidade já em execução. O fundamental é que, perante os colaboradores, essa proposta de valor seja clara.»
Hoje, e face ao contexto em que vivemos, a relação entre as empresas e os talentos «beneficia em tornar-se mais humana, mais empática e transparente porque atravessamos uma crise sanitária, uma crise em que a consequência é a morte de pessoas – e não interessa quantas, basta que seja uma para que já seja muito», afirma Inês Veloso. «A vida humana não tem preço, e por isso, o posicionamento das empresas que comprovem essa mesma valorização é, sem dúvida, um contributo para a atracção e retenção de talento, mas esse é um posicionamento que não pode ser fake, tem de ser verdadeiro, que se sente e se vive em todos os momentos.»
Em termos de tendências, a responsável perspectiva que o employer branding seja cada vez mais estratégico, «cada vez mais gerido e não esquecido. Vai ser trabalhado enquanto marca e estratégia de marca, reconhecendo a importância da percepção e da experiência do colaborador, que não termina com o fim da relação contratual. Vai também obrigar a uma maior transparência da proposta de valor e dos benefícios, criando relações mais fortes e mais equilibradas entre entidade empregadora e talento», conclui.
Este artigo faz parte do Especial “Employer Branding”, publicado na edição de Abril (n.º 124) da Human Resources, nas bancas.
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