João Remondes: «A pandemia veio acelerar o processo de transformação na cultura organizacional e fazer evoluir os modelos de trabalho»

Gestora, por exemplo, dos centros comerciais Alegro, a Ceetrus Portugal continua a sua aposta no crescimento de negócio, estando em curso processos de integração de colaboradores para reforçar algumas áreas de negócio, para acelerar a transformação que já estava em curso, antes da pademia. Em entrevista exclusiva à Human Resources, João Remondes, líder de Transformação e Impacto Positivo da empresa, revela como reagiram e geriram a situação de crise, com foco no futuro.

Por Sandra M. Pinto

 

A Ceetrus Portugal engloba a gestão das galerias Comerciais Auchan (Alverca, Canidelo, Cascais, Famalicão, Maia, Santo Tirso e Sintra); os centros comerciais Alegro (Alfragide, Castelo Branco, Montijo, Setúbal e Sintra) e o Sintra Retail Park.

O período de mudança que a sociedade vive, coincidiu com o período em que a gestora de centros comerciais está a redesenhar a sua estratégia futura. «Todos os colaboradores são parte activa nesta mudança e na construção desta estratégia, não só pelo processo de transformação cultural como pelo facto de que cada um de nós será responsável pela construção e acção deste futuro, que já é o presente», afirma João Remondes.

Essa visão de transformação que está a ser construída, permitiu não só manter todos os postos de trabalho, como inclusive iniciar alguns processos de recrutamento para potenciar novas áreas de negócio.

 

De que forma a pandemia afectou a cultura organizacional da Ceetrus?

Para a Ceetrus Portugal, são as pessoas que ditam a evolução das empresas em verdadeiros projectos de co-construção, com e para todos. A transformação na cultura da empresa, assente nas pessoas, no seu envolvimento em projectos colaborativos, na flexibilidade e digitalização, já estava em curso antes da pandemia.

O cenário de pandemia e do confinamento consequente, veio acelerar o processo de transformação na cultura organizacional e motivar que a Ceetrus Portugal fizesse evoluir os seus modelos de trabalho. Registou-se uma forte flexibilização dos processos, assegurando que 100% da equipa ficasse em teletrabalho durante o período de Estado de Emergência, sendo que a grande maioria ainda se mantém neste regime. As próprias ferramentas de trabalho evoluíram, com todos os membros da equipa a terem obviamente o seu portátil e smartphone com caraterísticas e plafond adequado a este novo modo de trabalhar.

Foi essencial promover um upgrade neste campo, assegurando uma maior capacidade técnica e tecnológica disponível a toda a equipa, independentemente da sua função, para que o trabalho remoto acontecesse sem inquietações desnecessárias. Neste âmbito, o apoio permanente de uma equipa de IT [Tecnologias de Informação] a nível internacional e local, com uma capacidade de reacção imediata permitiu a agilidade necessária para fazermos esta transição, sem adicionar um nível de ansiedade a esta mudança.

Algumas das ferramentas com que já trabalhávamos intensificaram-se e hoje já não nos imaginamos sem elas, como o Microsoft Teams para reuniões e facilitação de trabalho de equipa, algo que sabemos ser altamente valorizado pela equipa actualmente. Aumenta a eficácia dos processos e a gestão do tempo, minimizando a quantidade de deslocações necessárias, tendo, assim, um impacto positivo no meio ambiente.

A sustentabilidade, que já estava no topo da pirâmide de prioridades na Ceetrus Portugal, passa a estar presente mais que nunca na mente da comunidade interna, que avalia cada uma das suas rotinas de trabalho à luz do impacto que têm para o meio ambiente. Este é um dado extremamente relevante, pois a pandemia veio acelerar também esta preocupação colectiva sobre o respeito ambiental.

Uma vertente que se tornou ainda mais visível na Ceetrus foi o processo de co-construção, com o envolvimento de diferentes equipas na própria estratégia empresarial. Com a pandemia, o teletrabalho e o redefinir de prioridades face ao contexto desafiante, promovemos metodologias que potenciaram ainda mais a colaboração, com as pessoas a serem chamadas a intervir cada vez mais na estratégia, com um forte sentido de transparência e feedback colaborativo. Isto numa fase em que a sociedade se transforma e as empresas têm de responder na mesma medida. Aproximámos as equipas, criámos grupos de trabalho e fizemos evoluir o sentido de comunidade interna para uma Ceetrus mais forte e resiliente, a partir do seu interior.

 

Como foi gerido o período em que os centros comerciais tiveram que fechar?

A actividade da Ceetrus nunca ficou parada durante o período de Estado de Emergência. Mesmo os espaços comerciais que gerimos mantiveram-se em funcionamento com os lojistas considerados essenciais, como os supermercados e farmácias. Portanto, não existiu na empresa um sentimento de encerramento, mas sim de redefinição das prioridades, nomeadamente com a criação de um grupo de trabalho transversal às diversas áreas e que esteve muito focado no futuro próximo.

Trabalhámos com todos para assegurar que os projectos em pipeline continuavam em desenvolvimento e que toda a actividade de imobiliário comercial que detemos, e que é muito forte na Ceetrus, com a marca de centros comerciais Alegro, ficaria devidamente preparada para a reabertura com total segurança e confiança. Portanto, as nossas equipas encontraram um ambiente altamente colaborativo e muito assente na perspectiva de continuidade e de um futuro que nos cabe a todos transformar para melhor e em prol das novas expectativas dos nossos clientes.

Durante esta fase, fizemos questão de incentivar momentos de reunião geral com toda a equipa, ainda que em formato digital, não só para trazer alinhamento em relação a temas que a todos dizem respeito, como para continuar a aproximar o nosso lado humano, de pessoas que conviviam diariamente e que de repente deixam de o fazer da mesma forma, numa partilha mais informal e espontânea.

 

Mesmo sem a actividade ter parado, o impacto nos colaboradores terá sido significativo?

Adaptámos dos modelos de trabalho ao formato remoto. O impacto nas pessoas foi sobretudo o receio generalizado associado à pandemia e o levantar de dúvidas inerentes a uma transformação tão rápida nas metodologias e novas formas de estar, não só no que à função profissional diz respeito, mas ao equilíbrio de duas dimensões que agora passaram a conviver e cruzar-se em permanência: pessoal e profissional.

No entanto, e como já havia sido experienciado na Ceetrus um modelo de flexibilização do trabalho, embora não formalmente implementado, parte da equipa não estranhou esta transformação. Todos os colaboradores conseguiram adaptar-se com enorme rapidez e eficácia, ficarando totalmente operacionais e focados na continuidade dos projectos. Com o modelo colaborativo implementado, com as equipas ainda mais interligadas com níveis de maior proximidade, as pessoas apoiaram-se mutuamente. Mesmo os que sentiram um pouco mais de dificuldade na adaptação tiveram o apoio da estrutura e entraram mais facilmente na forma de trabalhar remotamente.

 

E como asseguraram o acompanhamento aos colaboradores?

Procurámos auscultar o sentimento das nossas equipas, o índice de satisfação e perceber os seus receios, de modo a adequar a nossa resposta interna. Um dos factores que mais tranquilizou os colaboradores foi perceber que a empresa não iria colocar ninguém em lay-off e que estava precisamente a trabalhar na sua própria transformação, seja do ponto de vista dos processos, seja em termos de negócio propriamente dito, contando com a contribuição de todos para o efeito.

Adicionalmente, optámos por criar também alguns mecanismos que promovessem, ainda mais e em toda a equipa, o sentimento de que a empresa é um porto seguro e que podem contar com ela. Foi por exemplo atribuído um seguro de saúde especial, com cobertura para quem eventualmente venha a contrair COVID-19. Trata-se de um seguro com subsídio diário por determinados dias de hospitalização causada por infecção do novo coronavírus e com uma indemnização de convalescença.

Esta preocupação com o bem-estar das equipas foi altamente valorizada por todos e representou mais um factor de coesão interna.

 

A manutenção de todos os postos de trabalho nunca esteve em causa?

Nesta fase, tivemos duas preocupações principais de forma a dar a confiança e segurança às nossas equipas: por um lado, garantir que não havia uma perda de rendimentos por parte de cada colaborador; por outro, garantir que mantínhamos todos os empregos para o futuro.

Especialmente, sabendo que, pelo contexto do País, muitos dos nossos colaboradores se rodeavam de amigos e familiares cujos rendimentos foram reduzidos, tentámos reorientar o nosso plano de negócio para garantir que somos uma empresa de “people first” e garantir o mesmo nível de rendimentos.

Para além de termos mantido todos os postos de trabalho, com a visão de transformação que estamos a construir para redesenhar o nosso desenvolvimento, iniciámos inclusive alguns processos de recrutamento para potenciar novas áreas de negócio.

 

Ainda mantêm os colaboradores em teletrabalho?

Não. Todas as equipas ficaram em teletrabalho, 100%, mas desde o início de Junho que está a haver um regresso gradual, especialmente das equipas de administração dos centros comerciais Alegro que gerimos. A partir de meio de Junho, começam a regressar as restantes áreas de negócio, ainda de forma gradual e com a consciência sobre a situação pessoal e individual de cada pessoa.

Ou seja, as equipas estão a regressar pontualmente ao escritório e em função de necessidades particulares da gestão de projectos. No caso dos centros comerciais Alegro, as equipas já estão a ir rotativamente e com maior frequência aos escritórios, embora ainda se esteja a perceber como o regresso integral vai acontecer, pois a situação de pandemia ainda é muito dinâmica e é necessário avaliar cuidadosamente a evolução do contexto.

 

Como está a ser preparado esse regresso?

A preparação tem sido feita em conjunto com as equipas, que têm tido a oportunidade de facultar a sua opinião sobre o tema, partilhando a forma como encaram o regresso ao escritório, principais receios e expectativas. Esta partilha de feedback está a permitir-nos desenhar um plano de acção mais adequado e que represente uma solução equilibrada para as diferentes equipas.

 

As pessoas estão receptivas ao regresso ao escritório?

Efectivamente, existem pessoas que estão muito alinhadas para manter o teletrabalho, mas também temos outras que preferem regressar ao escritório. Depende muito do contexto de vida de cada um, e estamos a procurar responder da forma o mais adequada possível a cada realidade. No entanto, é certo que todos valorizam a flexibilidade e estão altamente receptivos a um modelo híbrido que contemple o escritório, mas também o facto de se poder trabalhar em casa de forma muito mais regular.

No caso da nossa operação propriamente dita, a preparação da abertura foi vivida com bastante entusiasmo, com um misto de alguma ansiedade pelo adiamento da abertura dos centros comerciais na região de Lisboa, mas sempre com bastante energia para uma construção conjunta do nosso plano de acção.

Trabalhámos com todas as equipas do nosso portfólio de forma cruzada, sem que olhássemos exclusivamente para o perímetro geográfico, mas cruzando duas dimensões: focar em temas que são cruciais na nossa actividade de forma transversal – as novas medidas operacionais, o suporte aos nossos lojistas, a digitalização, os novos serviços, a comunicação com todos os nossos stakeholders; e localizar para adaptar a nossa actuação à comunidade envolvente de cada centro, que é tão diferente de local para local.

 

Apesar de já ter um modelo de flexibilização do trabalho em curso, a Ceetrus vai agora mudar a sua forma de trabalhar?

O tema já fazia parte da cultura organizacional da Ceetrus, embora estivesse em evolução. Não estava oficializada, mas parte da equipa já trabalhava remotamente em função de necessidades pontuais e com horários menos fixos. Hoje, este é um tópico estratégico e que vai pautar os próximos tempos a nível de gestão de processos de trabalho. Conseguimos perceber, ao escutar os colaboradores, que é um dos eixos mais valorizados, pelo que a flexibilidade vai continuar a ser uma aposta da empresa.

 

Num modelo mais flexível, com se envolve e potencia a acção dos colaboradores na estratégia da empresa?

Este período de mudança que a sociedade vive, coincidiu igualmente com um período em que a Ceetrus está a redesenhar a sua estratégia futura, para crescer dentro da AFM – Associação Familiar Mulliez, para crescer com e para os seus clientes, para transformar o seu negócio e actuar nesta transformação que o retalho e as cidades estão a vivenciar. Já estávamos a trabalhar neste sentido, e agora, claramente acelerámos.

Todos os colaboradores são parte activa nesta mudança, na construção desta estratégia, não só pelo processo de transformação cultural como pelo facto de que cada um de nós será responsável pela construção e acção deste futuro, que já é o presente.

 

Como asseguram esse envolvimento das pessoas?

O envolvimento das pessoas é fundamental para a Ceetrus Portugal e faz parte da identidade corporativa. O nosso lema é “with citizens, for citizens”, actuando com e para os cidadãos. Com esta abordagem única e inclusiva, alcançamos todos os cidadãos: “com” os nossos públicos em todos os níveis, aqueles com quem construímos no espírito colaborativo; e “para” os cidadãos que beneficiam dos nossos projectos concluídos.

As equipas Ceetrus, os nossos parceiros, as comunidades locais e os nossos clientes formam a sociedade em que vivemos. O envolvimento das pessoas está presente na missão da Ceetrus: “We Link People”.

 

Qual é, hoje, a vossa missão?

Na Ceetrus, queremos criar conexões/relações para construir um futuro melhor e reforçar o nosso compromisso na criação de vínculos e aumentar a interacção entre as pessoas. Assim, a nossa missão é “We Link People”. Esta missão reflecte a nossa identidade enquanto Global Urban Player na criação de espaços mais sustentáveis, inteligentes, dinâmicos e multiusos, numa estratégia de diversificação de áreas de negócio.

Esta estratégia vai muito além da simples gestão de centros comerciais, e foca a gestão das pessoas que fazem parte da nossa comunidade, e que interagem através dos espaços que gerimos. Somos potenciadores e gestores destas ligações entre todas as pessoas.

A Ceetrus tem capitalizado a sua experiência no sector imobiliário comercial para ir mais longe, desenvolvendo projectos multiusos que contribuem para o desenvolvimento sustentável de áreas urbanas e para o bem-estar dos seus habitantes. Desenvolvemos, de forma alinhada com as necessidades dos territórios, locais de vida, sustentáveis e inteligentes, “to brighten up everyday life”.

 

Lidera uma área nova, que surgiu em plena pandemia: “Transformação e Impacto Positivo”. Qual a sua filosofia e objectivos?

Esta nova função na estrutura Ceetrus Portugal surge em pleno contexto global de mudança, para dar prioridade ao impacto positivo da empresa e aos projectos por si geridos no país. Esta função vem sobretudo sublinhar o foco da Ceetrus Portugal na transformação dos seus activos, actuais e futuros, acompanhando a evolução da forma como a sociedade se está a modificar e a interagir com os espaços, sobretudo no contexto que se vive.

Os principais objectivos desta nova função passam por identificar novas oportunidades de negócio e facilitar projectos inovadores que adicionem valor aos activos geridos pela empresa, com base nas necessidades de hoje e do futuro. Parte da missão passará também pelo alinhamento de todos os nossos projectos com a estratégia de Responsabilidade Social Empresarial, aliando dois eixos: Carbono Negativo e Território Positivo, priorizando assim o impacto ambiental e económico, com foco no território de proximidade.

Pretendemos entender as ramificações das mudanças em curso a nível global e, através da análise do seu impacto, desenvolver de forma mais eficiente e sustentável a nossa visão. Este trabalho vai implicar a regeneração e a transformação dos activos, bem como dos territórios circundantes, para promover um novo mix urbano que combine economia, ecologia e comunidade e, consequentemente, gere um impacto positivo em todas as áreas envolvidas.

 

Pode dar alguns exemplos concretos?

Um exemplo táctico da criação de impacto positivo, uma vez que a estratégia de RSE da Ceetrus é muito mais abrangente, foram os donativos atribuídos recentemente às comunidades locais em projectos no combate à pandemia. Aplicámos 70 mil euros em três eixos distintos: bens alimentares de primeira necessidade; tratamento e protecção; e, por fim, conforto.

Em termos práticos, este apoio materializou-se através da disponibilização de cabazes alimentares, produtos de limpeza, gel desinfectante, máscaras, viseiras, entre outros, a diversas entidades locais como PSP, bombeiros, diversas delegações de protecção civil, canis e associações de apoio a animais abandonados, entre outros. Contribuímos ainda para a aquisição de três ventiladores para hospitais inseridos nas comunidades dos nossos activos.

Pela proximidade que temos com os territórios onde a empresa está presente, estamos em escuta permanente das necessidades das comunidades e empenhados em encontrar alternativas para que as carências sentidas nos momentos difíceis sejam minimizadas.

 

E em relação ao fomento do emprego, definiram algumas políticas e estratégias mais focadas?

Nesta fase de mudança da Ceetrus, e reorientação da nossa estratégia, este é claramente um eixo que queremos priorizar. Não podemos construir o futuro sem termos as pessoas certas, alinhadas com a nossa atitude. Queremos ser uma empresa cada vez mais ágil, na forma de transformar o nosso negócio actual, e no modo como desenvolvemos os novos negócios.

Este crescimento de negócio será acompanhado de um crescimento orgânico, e prova disto são os recentes processos de integração de colaboradores para reforçar algumas áreas de negócio e os processos de recrutamento que temos em curso, para acelerar a nossa transformação.

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