
Missão pessoal vs. objectivos da empresa: é possível alinhar propósito individual e colectivo?
Por Ana Isabel Fernandes, Business Unit manager ASSA ABLOY Entrance Systems Portugal e Senior Executive leader
Durante muito tempo, a vida profissional e a vida pessoal foram vistas como dimensões separadas. De um lado, a carreira com os seus objectivos, metas e métricas de desempenho. Do outro, a vida pessoal, com os seus valores, sonhos e aspirações mais íntimas. Mas a verdade é que, à medida que evoluímos como
sociedade, começa a ficar claro que essa divisão já não serve.
As novas gerações já não querem apenas um salário ao fim do mês. Querem sentido. Querem contribuir com aquilo que sabem fazer de melhor para algo que consideram relevante. Querem sentir que o seu tempo e energia estão a serviço de algo maior, algo com impacto, com propósito. E isso desafia as empresas a olharem para o seu papel de forma mais profunda.
Será possível alinhar missão pessoal e objectivos da organização?
A resposta é: sim. Mas não acontece por acaso.
Esse alinhamento começa com uma pergunta essencial: “Quem sou eu e o que vim cá fazer?”, uma pergunta que não é apenas espiritual, mas profundamente estratégica. Conhecer a própria missão pessoal e aquilo que nos move de forma autêntica, é o primeiro passo para contribuir de forma mais consciente e sustentável para qualquer projecto colectivo.
Uma empresa que se preocupa apenas com resultados e ignora o sentido de pertença, realização e identidade dos seus colaboradores está, na verdade, a limitar o seu próprio potencial. Porque são as pessoas que constroem a cultura, que inovam, que lideram, que transformam. E quando essas pessoas se sentem ligadas, de verdade, à missão da organização, o impacto é incomparável.
Alinhamento não significa que todos tenham a mesma missão
Importa fazer uma distinção: alinhar missão pessoal com objectivos organizacionais não significa que todos devem querer o mesmo ou ter paixões idênticas. Significa, sim, que existe um terreno comum onde os talentos
individuais encontram espaço para florescer e contribuir para algo maior.
Uma pessoa cuja missão é “criar pontes entre diferentes culturas” pode sentir-se profundamente realizada a trabalhar numa empresa com operações globais e equipas multiculturais. Já alguém com vocação para “cuidar do bem-estar emocional dos outros” pode trazer uma enorme mais-valia para áreas de liderança de pessoas, cultura ou gestão de talento.
A chave está em escutar, conhecer e valorizar o que cada um traz como essência e criar um ambiente onde isso possa ser vivido com autenticidade.
O papel da liderança consciente
Cabe aos líderes fazer perguntas que vão além do “o que precisas para atingir a meta?”, e começar a perguntar: “Como queres crescer aqui dentro?”, “O que faz sentido para ti neste momento?”, “Como é que o teu talento pode somar à missão da empresa?”
Quando um líder reconhece e honra a missão pessoal da sua equipa, abre espaço para maior motivação, lealdade, criatividade e compromisso. Ninguém quer apenas “cumprir tarefas”. As pessoas querem pertencer. Querem contribuir com o melhor que têm. Querem sentir que são parte de uma visão com significado.
O que acontece quando o propósito não está alinhado
Claro que nem sempre esse alinhamento é possível. E quando não é, surgem sinais claros: falta de motivação, rotatividade, esgotamento emocional. São os sintomas de uma desconexão entre o que a pessoa acredita e o que vive no seu dia a dia profissional.
É por isso que o autoconhecimento deixou de ser um luxo e se tornou um imperativo. Tanto para os líderes como para os colaboradores. Conhecer a própria missão pessoal ajuda-nos a fazer escolhas mais conscientes, definir limites mais saudáveis e procurar contextos onde possamos realmente florescer.
Criar pontes: o novo papel das organizações
As empresas do futuro não serão as que apenas oferecem benefícios ou planos de carreira. Serão aquelas que souberem criar um ecossistema onde o talento, o propósito e os objetivos do negócio se encontram num ponto de convergência real.
É possível, e cada vez mais necessário, que as empresas se tornem espaços onde as pessoas podem expressar quem são, ao mesmo tempo que contribuem para resultados concretos. E quando esse espaço é criado com respeito, escuta e visão, o retorno é mútuo: colaboradores mais realizados, empresas mais humanas e sociedades mais conscientes.
Missão pessoal e missão colectiva não se excluem. Complementam-se.
Não há verdadeiro sucesso colectivo sem realização individual. E não há realização pessoal que dure, se for vivida em ambientes onde o nosso valor não é reconhecido.
O mundo corporativo tem diante de si uma oportunidade histórica: deixar de ser apenas um lugar de performance e tornar-se um espaço de propósito. Deixar de medir apenas resultados e passar a cultivar significado.
Alinhar missão pessoal e objectivos da empresa não é apenas possível. É desejável. É inteligente. E é profundamente transformador para quem lidera, para quem segue e para tudo o que se constrói em conjunto.