
MIT Sloan Management Review: O que os líderes não entendem sobre a motivação dos colaboradores
Há duas teorias com pressupostos muito diferentes sobre o modo como as pessoas são motivadas no trabalho, cada uma com implicações significativas para a gestão, a estrutura organizacional, a cultura e os resultados.
Por Marylène Gagné e Rebecca Hewett, MIT Sloan Management Review
Desde que os gestores começaram a gerir, têm-se questionado sobre como motivar os colaboradores a serem produtivos e a fazerem um bom trabalho – e, para a maioria, as suas respostas ainda são moldadas por pressupostos formados há muito tempo. Embora os líderes modernos compreendam que o melhor desempenho provém de colaboradores intrinsecamente motivados e altamente empenhados, muitos continuam a utilizar práticas de gestão tradicionais que partem do princípio de que as pessoas não trabalharão arduamente a menos que sejam incentivadas e monitorizadas para garantir que cumprem o que prometem. Subjacente a esta inconsistência estão duas teorias com pressupostos muito diferentes sobre o modo como os seres humanos são motivados, cada uma com implicações significativas para a gestão, a estrutura organizacional, a cultura e os resultados.
No artigo no Journal of Management Studies, comparámos a teoria da agência e a teoria da autodeterminação – ambas muito influentes na investigação, na educação empresarial e na prática. Sugerimos que a teoria da agência dominou a prática de gestão durante décadas – apesar das provas sobre as suas limitações – conduzindo a formas pouco adequadas de gerir os trabalhadores.
Duas teorias
A teoria da agência assenta no pressuposto de que os seres humanos são seres racionais e interessados em si próprios, que precisam de ser controlados e motivados por mecanismos externos, como regras, monitorização e recompensas. Um pressuposto fundamental é que os objectivos dos trabalhadores e os objectivos da organização estão em oposição – os proprietários da organização (por exemplo, os accionistas) querem pagar o mínimo necessário para o trabalho ser feito, de modo a maximizarem os ganhos de capital, enquanto os trabalhadores querem fazer o mínimo por um salário máximo. Isto significa que os trabalhadores têm de ser persuadidos a contribuir para os objectivos organizacionais por incentivos e têm de ser controlados e regulados para garantir que trabalham eficazmente.
Por que é que isto não é adequado? Monitorizar, regular e incentivar as pessoas a trabalharem mais é dispendioso e nunca é infalível. Exige uma atenção constante para colmatar os subterfúgios que os seres humanos descobrem quando a sua autonomia é limitada por sistemas de comando e controlo. É como lutar numa batalha perdida. As tentativas de monitorizar e incentivar o trabalho também podem levar a consequências negativas não intencionais, incluindo o facto de os colaboradores manipularem o sistema, ignorarem questões morais e éticas e privilegiarem os ganhos a curto prazo em detrimento da sustentabilidade a longo prazo. Nas últimas décadas, escândalos como os da Wells Fargo, da WorldCom e da GlaxoSmithKline foram associados à utilização — e ao fracasso — destes mecanismos de controlo.
A teoria da autodeterminação, por outro lado, parte do princípio de que os indivíduos são naturalmente motivados de forma intrínseca e prosperam quando as suas necessidades psicológicas básicas de autonomia, competência e relacionamento são satisfeitas. As organizações podem satisfazer estas necessidades fornecendo às pessoas uma orientação estratégica clara, feedback significativo, um sentido de ligação ao seu trabalho e aos colegas, e espaço para trabalharem da forma que lhes convém. Com estas práticas, os colaboradores podem mais facilmente interiorizar os objectivos organizacionais, levando a um alinhamento entre os seus interesses e os da organização, sem que os gestores tenham de oferecer incentivos e monitorizar as pessoas.
As pesquisas existentes apoiam a eficácia desta abordagem: os colaboradores cujas necessidades psicológicas são satisfeitas são intrinsecamente motivados, encontrando significado e prazer no seu trabalho, o que conduz não só a um melhor desempenho, mas também a um maior bem-estar. A utilização da teoria da autodeterminação para gerir os colaboradores pode promover o comportamento ético, a inovação e o compromisso a longo prazo.
É claro que não é fácil – este tipo de gestão do desempenho implica tempo e investimento e, muitas vezes, exige que se abdique de algum controlo. Significa investir nas pessoas e depois confiar nelas para que façam o trabalho. Isto nem sempre é confortável e, se não for feito correctamente, não funciona. Por exemplo, dar autonomia às pessoas não significa deixá-las fazer o que querem; elas também precisam de objectivos claros, com explicações simples sobre o que tem de ser alcançado e porquê. As políticas e os procedimentos são, por vezes, necessários – por exemplo, para cumprimento da legislação –, mas quando os colaboradores não sabem porque é que essas políticas e procedimentos existem, pode ser-lhes difícil aceitá-los e segui-los voluntariamente. Por outras palavras, a autonomia tem de ser acompanhada de alguma estrutura.
Como as suposições sobre a motivação moldam a gestão
Considere um empresário cujo principal objectivo é aumentar a rentabilidade. Se este líder acreditar que os colaboradores só se esforçarão se beneficiarem pessoalmente e que os seus objectivos se centram no seu interesse pessoal (fazer um esforço mínimo para obter uma recompensa máxima), esse líder implementará objectivos de desempenho prescritos, monitorizará os trabalhadores para se certificar de que cumprem esses objectivos e associará a compensação ao cumprimento do objectivo. Em teoria, esta abordagem faz sentido, uma vez que as pessoas geralmente procuram objectivos claros e querem ser recompensadas de forma justa pelo seu trabalho, mas, na prática, implica que os colaboradores tenham uma relação puramente transaccional com o seu trabalho. Pesquisas mostram que objectivos precisos, avaliados e incentivados podem levar as pessoas a concentrarem-se somente no que é avaliado e recompensado, enquanto a monitorização pode colocar as pessoas sob pressão e fazê-las sentir que não são de confiança. Esta situação também pode ser prejudicial para a organização, uma vez que os trabalhadores que não se sentem confiáveis reduzem o seu esforço e acabam por se despedir.
O controlo rigoroso da gestão mediante objectivos de desempenho, monitorização e incentivos também se repercute na organização. Se o proprietário da empresa estabelece e monitoriza objectivos de desempenho rigorosos para a sua equipa de gestão, estes gestores farão o mesmo com as suas equipas, conduzindo à microgestão que todos temem. Colaboradores de todos os níveis concentram-se exclusivamente no que é necessário para atingir (e não exceder) os seus objectivos – e esquecem-se de ajudar os colegas de trabalho e de encontrar soluções inovadoras para os problemas. Isto é particularmente perigoso para as empresas que operam em ambientes cada vez mais voláteis, que exigem que sejam ágeis e proactivas: uma gestão rígida e controladora não produzirá um comportamento adaptativo e criativo por parte dos colaboradores.
Organizar o trabalho sem comando e controlo
A teoria da agência e o estilo de gestão que lhe está associado são extremamente resistentes. Principalmente em tempos de desafio ou incerteza, os líderes podem sentir-se tentados a mitigar as suas inseguranças duplicando o controlo. Mas como podem organizar o trabalho se partirem do princípio de que a teoria da autodeterminação é um modelo mais válido da motivação e do comportamento humanos?
Uma abordagem é organizar o trabalho em torno dos princípios da autogestão. As equipas autogeridas normalmente definem os seus próprios objectivos – ligados à estratégia da organização – e tomam decisões em conjunto sobre como distribuir o trabalho, as funções e os horários conforme os diferentes pontos fortes e necessidades dos indivíduos. Podem contratar novos colegas, tomar decisões sobre como gastar o seu orçamento, criar equipas multifuncionais para trabalhar em novos projectos, lidar directamente com clientes e fornecedores e coordenar-se com outras equipas.
Naturalmente, este nível de autonomia exige formação, estrutura e apoio para que não se crie o caos. Os líderes devem criar e comunicar uma visão coerente e objectivos estratégicos com os quais as equipas alinhem o seu trabalho, mas dando-lhes liberdade para experimentar e inovar. Uma orientação clara sobre quem decide o quê permite que as equipas definam objectivos e tomem decisões sem aprovações de nível superior. Significa dizer: “Precisamos de uma fotocopiadora nova? Não me perguntem a mim – comprem-na se ajudar a equipa.” Nestes ambientes, é mais provável que os colaboradores aceitem os objectivos da organização e da equipa porque participaram na sua definição. Isso também os torna menos susceptíveis de manipularem o sistema. Compreendem as implicações que as decisões que afectam uma área (por exemplo, as vendas) terão noutras áreas (por exemplo, as operações) porque têm uma visão mais ampla da organização e sentem que são responsáveis pelos objectivos colectivos.
Que incentivos são significativos numa organização orientada por princípios de autogestão? Aqui, o desempenho significa contribuir para toda a organização, e não concentrar-se em objectivos individuais específicos. Assim, as pessoas são recompensadas por todo o seu contributo – com um salário justo que reconhece o seu nível de especialização, em vez de prémios estreitamente ligados aos resultados. O seu salário é importante, mas não o têm em mente quando fazem o seu trabalho. Acha que isto é um sonho? Pense de novo. Existem organizações deste género em todo o mundo.
A empresa neerlandesa de crédito à habitação Viisi vive segundo o seu objectivo: “as pessoas em primeiro lugar, os clientes em segundo, os accionistas em terceiro”. Nesta empresa de fintech, fundada em 2010, as funções de chefe de equipa são rotativas entre os membros da equipa, e é a equipa que decide quem contratar para a equipa e quanto lhes pagar. Existem processos para orientar como as decisões são tomadas, e a remuneração é transparente para que todos saibam que as decisões são justas. Todas as pessoas são cuidadosamente integradas nesta forma de trabalhar para garantir que sabem como contribuir eficazmente e é-lhes dada autonomia para o fazerem de uma forma que lhes seja conveniente. Funciona tão bem que antigos funcionários regressaram à empresa após terem ido para outros locais ganhar novas experiências.
Leia o artigo na íntegra na edição de Março (nº. 171) da Human Resources, nas bancas.
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