Novo regime do teletrabalho: empregador tem que pagar despesas adicionais do trabalhador. Mas a lei tem aplicação prática?

No dia 6 de Dezembro de 2021, foi publicada a Lei 83/2021, que veio modificar o regime de teletrabalho, e que, nos termos do seu artigo 6.º, as novas regras entram em vigor no primeiro dia do mês seguinte à publicação, ou seja, entraram em vigor no dia 1 de Janeiro de 2022. À data da publicação desta lei, as dúvidas eram muitas e, actualmente, a maioria delas mantêm-se.

Por Telmo Guerreiro Semião, sócio fundador, e Catarina Enes de Oliveira, advogada associada, da CRS Advogados

 

De acordo com a nova legislação, que alterou o Código do Trabalho, “o empregador é responsável pela disponibilização ao trabalhador dos equipamentos e sistemas necessários à realização do trabalho e à interacção trabalhador-empregador” – nos termos do n.º 1, do art. 168.º. Apesar de considerarmos que a redacção legislativa não é a mais feliz, esta obrigação não suscita grandes dúvidas práticas, tendo em conta esta nova realidade laboral que vivemos e os novos deveres especiais para o empregador e para o trabalhador.

As dúvidas começam a surgir quando a lei prevê que “são integralmente compensadas pelo empregador todas as despesas adicionais que, comprovadamente, o trabalhador suporte (…) incluindo os acréscimos de custos de energia e da rede instalada no local de trabalho em condições de velocidade compatível com as necessidades de comunicação de serviço, assim como os custos de manutenção dos mesmos equipamentos e sistemas.” Ora, o legislador não cuidou de explicar a forma de aplicação da mesma.

É certo que a forma de cálculo está indicada no n.º 3 do art. 168.º do Código do Trabalho: “Consideram-se despesas adicionais as correspondentes à aquisição de bens e/ou serviços de que o trabalhador não dispunha antes da celebração do acordo” de teletrabalho, “assim como as determinadas por comparação com as despesas homólogas do trabalhador no mesmo mês do último ano anterior à aplicação desse acordo” – mas tal formulação parece-nos insuficiente e de muito difícil aplicação prática.

Não há dúvida de que fazem parte da previsão desta norma “os acréscimos de custos de energia e da rede instalada no local de trabalho em condições de velocidade compatível com as necessidades de comunicação de serviço, assim como os custos de manutenção dos mesmos equipamentos e sistemas”, mas como apurá-los na prática?

A questão “quantitativa” é difícil de aferir e a lei não esclarece. Vejamos na prática: Todo e qualquer acréscimo de custos de energia e/ou rede instalada? Sem limite? Sem variáveis? Bastando simplesmente verificar-se um acréscimo comparativamente com o período homólogo do mesmo mês do último ano anterior à aplicação desse acordo? Que elementos devem os trabalhadores apresentar para provar o custo que alegam? Estes “parâmetros” são manifestamente insuficientes para apurar um valor real que corresponda, sequer de forma aproximada, ao valor que poderá ser o custo acrescido por conta do teletrabalho.

E a questão “qualitativa” também deixa muitas reservas: E se dois elementos de um casal estão em teletrabalho? Que entidade empregadora é responsável pelo pagamento? Como se procede a essa divisão? Mais, como podem as entidades empregadoras fiscalizar se o pagamento foi efectuado pela outra e quais os valores?

Já quanto ao enquadramento fiscal, a lei resolveu a dúvida: estas despesas pagas pela entidade empregadora ao trabalhador são consideradas, para efeitos fiscais, custos para as empresas e não constituem rendimento do trabalhador.

Deixamos a advertência de que é necessária uma urgente e imprescindível intervenção legislativa que regulamente esta lei, concluindo que também é necessária a procura de soluções práticas para a aplicação da mesma.

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