O desafio das redes sociais no recrutamento

As redes sociais representam um desafio para a proteção de dados pessoais, principalmente quando está em causa o mundo laboral, com as inerentes fragilidades do trabalhador (ou potencial trabalhador) e o fácil acesso do empregador.

 

Por Mariana Marques Leitão, advogada na BAS – Sociedade de Advogados

 

Esta vulnerabilidade é sentida, em particular, no momento do recrutamento, que representa uma fase de especial fragilidade para o candidato, dado que os responsáveis pelo recrutamento têm a possibilidade de analisar os perfis pessoais e profissionais dos candidatos e assim ter acesso a aspectos da sua vida privada e intima, o que, por sua vez, irá gerar problemas do ponto de vista da protecção de dados, nomeadamente no que concerne às regras do Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD).

Em termos gerais, ao abrigo do artigo 17.º do Código do Trabalho, o empregador “não pode exigir a candidato a emprego ou a trabalhador que preste informações relativas: a) à sua vida privada (…)”. Este direito à privacidade decorre igualmente do artigo 26.º da Lei Fundamental. Por vida privada entende-se toda a questão relacionada “com a vida familiar, afectiva e sexual, com o estado de saúde e com as convicções políticas e religiosas” (Diogo Vaz Marecos, Código Do Trabalho Anotado, Coimbra Editora, 2010).

Está, assim, vedado à partida ao empregador, o acesso ao conteúdo das redes sociais privadas do candidato, bem como toda a solicitação a terceiros para aceder a tal informação. O empregador só pode proceder ao tratamento de dados pessoais do candidato decorrentes das redes sociais do mesmo, na medida em que estejam cumpridos os requisitos quanto à licitude do tratamento, previstos no artigo 6.º do RGPD, sendo que, se com base na informação recolhida numa rede social aberta, o candidato for excluído devido a motivos políticos, à sua religião, orientação sexual ou qualquer outro factor discriminatório é aplicável o regime geral da proibição da discriminação.

Ponto assente é que estes dados pessoais, eventualmente recolhidos durante um processo de recrutamento, deverão ser apagados assim que fique definido que não irá ser feita nenhuma proposta ao candidato ou quando a mesma não for aceite (mas esta regra sofre alterações quando estão em causa candidaturas espontâneas).

O desafio das redes sociais, para além de constituir uma assinalada fragilidade para o candidato, também representa uma forma de este, através de plataformas tais como o LinkedIn, exagerar alguns aspectos, de forma a encontrar o emprego pretendido.

A informação que se apresenta nas redes sociais do candidato poderá ser descontextualizada, falsa ou até colocada por terceiros, sem consentimento, sendo que tal poderá desfavorecer ou pelo contrário favorece-lo no processo.

Caso se venha a provar que o candidato, através das suas redes sociais, teve intenção de enganar/ prejudicar o empregador, pode o contrato de trabalho celebrado, no limite, ser anulável, com base no artigo 254.º do Código Civil.

O artigo 88.º do RGPD indica que “Os Estados-Membros podem estabelecer, no seu ordenamento jurídico (…), normas mais específicas para garantir a defesa dos direitos e liberdades no que respeita ao tratamento de dados pessoais dos trabalhadores no contexto laboral, nomeadamente para efeitos de recrutamento (…)”, pelo que a aguardada nova legislação nacional poderá trazer novidades quanto a este tema.

 

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