Igualdade remuneratória ainda é uma miragem (longínqua). Conheça os números da disparidade

Os dados do Instituto Europeu para a Igualdade de Género (EIGE), mostram que a União Europeia (UE) está a, pelo menos, 60 anos de alcançar a paridade entre homens e mulheres. Portugal tem, pelo menos a nível jurídico e corporativo, dado passos claros na tentativa de reduzir, com vista a eliminar, no médio prazo, o gap salarial existente entre géneros. Mas vejamos como é que esta pandemia afectou o grande objetivo de obter a igualdade salarial.

 

Por Ana Amado, director, Retirement-Non Actuarial da Willis Towers Watson

 

O índice de igualdade de género da União Europeia é de 67,9% versus 61,3% para Portugal (6,6 pontos abaixo da média da UE, mas em clara recuperação face a 2010). Adicionalmente, os actuais números da disparidade salarial entre homens e mulheres (dados do último trimestre de 2020)  são de 20% a nível mundial 14,1% na Europa

Porém, para efeitos desta análise, teremos que ir um pouco mais além, e não podemos deixar de observar a taxa de emprego das mulheres, de 66,6%,versus a dos homens que se situa em 78,3%, sendo estes valores ainda mais díspares ao nível do trabalho temporário, 31,3% em comparação com 8,7% dos homens[1]..

Com o efeito da pandemia é de esperar uma degradação destes números, uma vez que, as mulheres trabalham, maioritariamente, no sector dos serviços, que foi das áreas económicas mais afectadas, e têm mais comummente contratos informais ou temporários.

Olhando para o impacto da pandemia sob esta perspectiva, também não podemos excluir a distribuição desigual das responsabilidades domésticas e a prestação de cuidados não remunerados em casa, pois, em média, as mulheres despendem 62 horas por semana a tomar conta de crianças (em comparação com 36 horas para os homens) e 23 horas por semana em tarefas domésticas (em comparação com 15 horas para os homens), de acordo com o relatório anual de igualdade de género (2021) da Comissão Europeia.

Os dados do inquérito da Eurofound mostram ainda que a COVID-19 teve um impacto mais significativo nas mulheres com filhos pequenos: quase um terço (29%) das mulheres com filhos pequenos considerou difícil concentrar-se no trabalho, em comparação com 16% dos homens.

O teletrabalho, períodos de encerramento dos estabelecimentos de ensino e quarentenas profiláticas conduziram ao aumento do volume do trabalho das mulheres, devido ao seu papel enquanto cuidadoras familiares e responsáveis pelas tarefas domésticas. Tais responsabilidades dificultam a conciliação com a vida profissional.

Regressando ao ponto inicial deste texto, como e em quanto tempo podemos alcançar a paridade de género… o mais recente relatório anual do Fórum Económico Mundial estima que a igualdade entre os géneros só seja atingida daqui a 135 anos, ou seja, mais 35 anos do que no relatório do ano passado, apesar da Europa Ocidental ter sido a região com melhor desempenho e Portugal tenha subido 13 posições no ranking da igualdade entre homens e mulheres, ocupando agora o 22.º lugar (35º lugar na classificação anterior).

Como sociedade e como responsáveis de RH de empresas corporativas, podemos dar o nosso contributo com  análises e estudos que identifiquem os gaps salariais, de forma a criar planos de ação com o objetivo de os reduzir, tendo sempre por base o princípio “salário igual para trabalho igual ou de igual valor”. Mas para além destes estudos, é importante criar e executar, políticas de inclusão e diversidade que visem promover o desenvolvimento sustentável, de forma abrangente e não só do ponto de vista de igualdade remuneratória, , incluindo a atracção, selecção, retenção e promoção do talento, tendo por base o desenvolvimento da carreira de todos os colaboradores sem qualquer tipo de enviesamento.

Da nossa experiência, considerando os vários estudos que temos conduzido, podemos também concluir que:

– é usual as empresas sentirem que não têm problemas de diferenças salariais até ao momento em que os resultados dos estudos identificam onde se encontram esses gaps;

– as empresas que já deram início a estes estudos têm mais tempo para reduzir eventuais gaps e estão mais preparadas para uma eventual inspecção das autoridades;

– mesmo que não exista gap, há uma tendência clara de que as mulheres têm funções de nível inferior;

– existem sectores emergentes, como a área tecnológica, cuja a representação de mulheres é mais baixa.

No entanto, e apesar de existir ainda um longo caminho a percorrer, verificam-se algumas alterações fundamentais a nível das organizações, com a presença de mulheres em cargos de direcção e executivos  a aumentar;, com implementação de politicas e práticas mais transparentes e objetivas, com uma maior consciencialização do caminho que temos que trilhar.

 

Frases chave

– Na UE as mulheres ganham menos 14,1%, em média, do que os homens

– Na UE, apenas 66,6% das mulheres têm emprego em comparação com 78,3% dos homens.

– Em média, as mulheres despendem de 62 horas por semana a tomar conta de crianças (em comparação com 36 horas para os homens) e 23 horas por semana em tarefas domésticas (em comparação com 15 horas para os homens).

– O Fórum Económico Mundial estima que a igualdade entre os géneros só seja atingida daqui a 135 anos;

– Como sociedade e como responsáveis de RH de empresas corporativas, podemos contribuir com a análise e estudos que identifiquem os gaps salariais, de forma a criar planos de ação com o objetivo de os reduzir.

 

 

[1] Últimos dados do Eurostat

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