O trabalho no pós-COVID-19 e os ‘enxames’ como nova resposta

«Quando regressarmos aos nossos postos de trabalho e tivermos a necessidade de os adequar a uma nova cultura de trabalho que, entretanto, fomos, colectivamente, ajudando a moldar, o que devemos ter conta?»

 

Por Filipe Ferreira, co-fundador e sócio da Sfori

Março de 2020 ficará na história por razões óbvias e associadas à propagação da pandemia da COVID-19. Muitos dos profissionais, essencialmente ligados aos serviços, recordar-se-ão também destes dias como uma fase onde inadvertidamente tiveram de mudar de posto de trabalho, na sua grande maioria, instalando-se em casa.

Independentemente do local seleccionado, o trabalho à distância ganhou relevância e levantou, para muitos colaboradores, desafios importantes, que numa óptica de gestão se traduziram em mudanças organizacionais desafiantes, obstáculos à produtividade, perdas de eficácia e eficiência, aumento de custos ou, em última análise até, perda de rentabilidade do negócio, fazendo perigar a sua continuidade.

Muitas são as imagens dos novos postos de trabalho partilhadas nas redes sociais, onde é visível o esforço de cada um para o tornar o mais ajustado às suas necessidades, conferindo-lhe o maior sentimento de normalidade possível. Mais do que as componentes estéticas ou ergonómicas, releva observarmos as configurações e funcionalidades que, neste contexto, todos fomos levados a escolher.

Tecnologias já maduras mas ainda pouco disseminadas impuseram-se de forma natural, combatendo em tempo record uma iliteracia tecnológica que ainda subsistia numa larga franja da população activa. A autoformação intensiva e a experiência de utilizador a que temos vindo a ser obrigados por força das circunstâncias, conduzirá a que quando regressarmos à normalidade sanitária e organizacional, tenhamos uma estrutura humana mais esclarecida, exigente e com uma capacidade ímpar de inovar as caraterísticas do seu posto de trabalho e, consequentemente, dos processos e metodologias de trabalho das suas organizações.

Estaremos conscientes e preparados para acolher essa dinâmica e mudança tecnológica?

Um estudo recente da Microsoft e da Forbes veicula que 88% dos trabalhadores que têm controlo sobre onde e como fazem o seu trabalho, se sentem altamente comprometidos e satisfeitos com o seu trabalho. Estes trabalhadores são livres para configurar um espaço adequado às necessidades das tarefas que desenvolvem, seja ele, trabalho mais individual ou colaborativo, conferindo-lhes um sentimento de autonomia, que se repercute também em ganhos de desempenho.

O posto de trabalho digital transcende o espaço. É uma experiência entregue através dispositivos conectados, aplicativos e uma quantidade impressionante de informações, expandindo os limites da geografia, tempo e inteligência humana, caracterizado também por uma forte dinâmica de co-criação e colaboração digital.

A mudança digital irá chegar a todas as partes da organização e pressupõe uma adopção abrangente de novas ferramentas e não uma solução única e limitada. O desafio será como adoptar e disponibilizar a tecnologia a todos os funcionários de maneira integrada, com segurança, compliant e intuitiva potenciando criatividade, cooperação inter-pares e desempenho.

A força de trabalho do futuro irá visualizar terabytes de informações e não gigas ou megas, aprimorar a priorização de tarefas, modelar estratégias e resultados, inovar a um ritmo nunca antes pensado, colaborando em simultâneo com colegas, especialistas externos e sistemas.

Para fomentar a inovação, colaboração e desempenho individual e organizacional, devem ser escolhidas ferramentas digitais que:

  • Trabalhem com linguagem natural e através de voz, toque e olhar;
  • Apoiem e integrem uma aprendizagem constante;
  • Possibilitem a visualização de informações de novas maneiras;
  • Permitam expressar ideias atraentes com aplicações inteligentes;
  • Funcionem de forma cumulativa, aproveitando o conhecimento e práticas de terceiros.

 

Num contexto digital, colaboração significa conectar as pessoas onde e quando eles necessitem, removendo barreiras físicas e tecnológicas. De certa forma é o oposto de burocracia e pode ajudar a combater os silos (“quintas”) organizacionais.

Como qualquer mudança, também esta alteração da cultura do trabalho a que estamos a assistir será um processo imprevisível. Assim, quanto mais contexto e informação pudermos fornecer aos colaboradores, mais estes estarão aptos para tomar as decisões certas quando confrontados com essas mudanças e habilitar as organizações com ferramentas colaborativas, pode ser determinante nesse contexto.

O ritmo da mudança e da inovação nem sempre se coadunam com a construção das equipas de forma mais tradicional. O contexto que ora vivemos acentuou ainda mais este facto e obrigou à formação de grupos informais e informais, task forces e think tanks, que de forma rápida e competente pudessem apoiar a reação das organizações às adversidades. Veja-se, a título ilustrativo, uma estimativa do MIT que aponta para que no futuro exista uma redução de 85% no tempo despendido pelos colaboradores de organizações que venham a abraçar processos de automação e inteligência artificial.

 

Swarming

O swarming (enxame) – termo avançado pela Gartner – define um novo estilo de trabalho caracterizado como uma agitação e actividade colectiva, desenvolvida por todos aqueles que sejam considerados disponíveis e capazes de adicionar valor à tarefa a desenvolver. O swarming é uma resposta ágil a um aumento ad hoc das necessidades de acção, ou seja, como um verdadeiro enxame, o grupo de resposta forma-se rapidamente, atacando o problema ou oportunidade e depois dissipa-se rapidamente.

O trabalho, que costumava acontecer num movimento linear, com a passagem dos processos de um departamento para outro, faz-se agora, mais do que nunca, através de uma “colaboração radical”, com equipas a sobreporem-se, elementos em multi-teaming e um esforço colectivo altamente colaborativo, tentando que existam tantas interacções quanto possível, num determinado período, tendo em vista responder ao problema ou desafio (veja-se a procura da vacina ou a simples investigação em torno da COVI-19).

No entanto, este modelo, que já começa a dar frutos, só funciona se estivermos todos dentro “da mesma colmeia” e é aí que a tecnologia desempenha um papel fundamental.

Assim, e para concluir, quando regressarmos aos nossos postos de trabalho e tivermos a necessidade de os adequar a uma nova cultura de trabalho que, entretanto, fomos, colectivamente, ajudando a moldar, o que devemos ter conta? Como podemos apoiar o ‘enxame’ e desbloquear todo o seu potencial? Que directrizes devemos observar na adoção de tecnologia?

  • Fornecer espaços físicos e digitais para que as equipas e pessoas se reúnam e co-criem;
  • Fomentar a criação de comunidades por toda a empresa e a sua conexão;
  • Proporcionar às pessoas flexibilidade e empoderá-las para definirem a forma como trabalham juntas;
  • Acolher e dar resposta às necessidades de cada grupo, nos diferentes projectos e de acordo com os diversos estilos de trabalho;
  • Abrir canais de comunicação em toda a organização, da linha de frente, ao CEO
  • Adoptar ferramentas de colaboração eficazes, ou seja, intuitivas, interoperáveis, seguras e facilmente ajustáveis a diferentes ambientes e preferências individuais.

 

Uma coisa podemos tomar como certa, a realidade do posto de trabalho nunca mais será a mesma. Muito menos a cultura do trabalho vigente permanecerá idêntica.

Seja do ponto de vista tecnológico, processual ou humano, os tempos que vivemos introduzirão mudanças nas nossas organizações. que poderão ser destrutivas ou bastante positivas, dependendo do grau de consciência que os gestores tiverem sobre elas e da sua capacidade de mobilizarem as suas pessoas, num caminho que se quererá renovado, mais humanista e simultaneamente, tecnologicamente renovado.

 

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