Pedro Brito, Nova SBE: «Não há líderes prontos: há pessoas dispostas a crescer e a servir melhor»

A propósito da segunda edição do Unplugged Leadership, que aconteceu no passado dia 22 de Maio, a Human Resources Portugal conversou em exclusivo com Pedro Brito, Associate dean e CEO da Nova SBE Executive Education, sobre o estado das lideranças em Portugal e perspectivas para o futuro.

Por Tânia Reis

 

Porquê debater e reflectir sobre liderança?

Porque a liderança é, cada vez mais, o factor determinante na capacidade de as organizações se adaptarem, inovarem e cuidarem das suas pessoas. Vivemos num contexto de grande complexidade e mudança constante, onde os modelos tradicionais de liderança já não respondem aos desafios actuais. Reflectir sobre liderança é, por isso, uma urgência — não apenas para formar melhores líderes, mas para transformar culturas organizacionais. É neste tipo de espaços, como o Unplugged Leadership, que cultivamos conversas corajosas, escutamos experiências diversas e criamos novas possibilidades para o futuro da liderança. E acreditamos que é assim que se começa a mudar o mundo — uma conversa de cada vez.

 

A escassez de talentos é transversal, como vê o tema das lideranças em Portugal? Há falta de líderes? Há uma crise de liderança?

Portugal tem excelentes líderes, mas enfrenta um desafio estrutural: nem sempre investimos de forma consistente na formação de lideranças em diferentes níveis das organizações. Mais do que uma “crise de liderança”, vivemos uma transição de paradigma. O que funcionava no passado já não serve para o presente — e muito menos para o futuro. Liderar hoje exige vulnerabilidade, visão e capacidade de mobilizar equipas em contextos cada vez mais incertos. A escassez de líderes não é tanto quantitativa, mas qualitativa: precisamos de lideranças mais conscientes, mais adaptativas e mais humanas.

 

Actualmente, quais as principais competências e características que um líder deve ter?

Capacidade de escuta activa, pensamento crítico, inteligência emocional, tomada de decisão ética e visão sistémica. Mas acima de tudo, a capacidade de aprender continuamente. A velocidade a que o mundo muda exige líderes que saibam desaprender, reaprender e evoluir com humildade e agilidade. Acresce ainda a importância da empatia e da autenticidade — competências muitas vezes subestimadas, mas hoje absolutamente centrais para mobilizar equipas. Mas, nada disto interessa se o líder não aplicar estas e outras competências a si próprio. Cuidar de si em primeiro lugar, não só para ser melhor líder, mas melhor em outras dimensões. Só o equilíbrio traz verdadeiro impacto.

 

Um líder nasce-se ou faz-se?

Faz-se, claro! É verdade que algumas pessoas têm predisposições naturais — como carisma ou capacidade de influência —, mas a liderança é, acima de tudo, uma competência que se desenvolve. Faz-se com experiência, reflexão, feedback, modelos de referência e formação contínua. Não há líderes prontos: há pessoas dispostas a crescer e a servir melhor.

 

Os jovens saem do ensino superior preparados para ser os líderes de amanhã?

Saem com uma boa base técnica, mas raramente com preparação integral para liderar. A liderança exige autoconhecimento, resiliência, capacidade de influência e visão estratégica — competências que vão muito além do currículo tradicional. É por isso que, na Nova SBE, apostamos cada vez mais em experiências transformadoras, programas de liderança, mentoring e projectos aplicados, que ajudem os jovens a começar a desenvolver a sua identidade como líderes. A nossa proximidade com as empresas é claramente um factor diferenciador porque é uma forma de acelerar o desenvolvimento destas e de outras competências-chave para o contexto profissional.

 

Que impacto está a ter (e irá ter) a inteligência artificial nos líderes e nas lideranças?

A inteligência artificial está a mudar a forma como se lidera — desde a tomada de decisão baseada em dados, até à forma como se personaliza o desenvolvimento de talento. Mas o maior impacto não será tecnológico, será humano: os líderes terão de se focar ainda mais em competências que as máquinas não têm — empatia, ética, criatividade e julgamento moral. A IA amplifica quem somos como líderes. Se usada com consciência, pode tornar a liderança mais eficaz, mais inclusiva e mais estratégica.

 

Fala-se muito na necessidade de upskilling e reskilling, isso também se aplica aos líderes? Em que áreas?

Sem dúvida. Os líderes não podem estar à margem da revolução das competências. Precisam de fazer upskilling em áreas como tecnologia, literacia de dados, sustentabilidade e diversidade. E precisam de reskilling em como liderar equipas híbridas, promover culturas de aprendizagem e tomar decisões em ambientes ambíguos. No fundo para conseguir compreender e decidir sobre problemas muito mais complexos e multidisciplinares. Liderar hoje é aprender de forma deliberada e contínua.

 

Que papel têm as lideranças na cultura das organizações?

As lideranças são o principal motor (ou bloqueio) da cultura organizacional. São os líderes que definem o tom, reforçam comportamentos, moldam prioridades e traduzem valores em acções. A cultura não é o que está escrito nos murais ou nos valores institucionais — é o que se vive no dia-a-dia. E isso depende, em grande medida, da coerência e do exemplo das lideranças. São eles que influenciam outros factores fundamentais da cultura organizacional: a comunicação, a capacitação e os processos. Estes três factores, aliados à liderança, representam aquilo a que chamo das “quatro patas da vaca sagrada da cultura”. Se uma destas patas desaparece, a vaca fica coxa. Cabe às lideranças manter as quatro patas assentes no chão para dar estabilidade e consistência à cultura organizacional.

 

E na atracção e retenção de talento?

Cada vez mais as pessoas escolhem líderes e não apenas empresas. Sobretudo em contextos de empregabilidade elevada e em funções mais seniores. Uma liderança inspiradora atrai talento; uma liderança tóxica faz com que o talento fuja. Hoje, o factor decisivo para muitos profissionais — especialmente das novas gerações — não é só o salário, mas o propósito, o clima de trabalho e o tipo de liderança que encontram. Um bom líder é, por isso, um dos maiores activos numa estratégia de employer branding.

 

Que tendências prevê para o futuro das lideranças?

Prevejo lideranças mais distribuídas, mais diversas e mais centradas no propósito. O líder do futuro será um facilitador de aprendizagem contínua, um curador de confiança e um catalisador de impacto. A tecnologia continuará a acelerar esta transição, mas será a dimensão humana que diferenciará os grandes líderes: a capacidade de combinar performance com cuidado, inovação com ética, e ambição com serviço.

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