Por que é que Portugal pode estar na linha da frente enquanto marca de empregador?

RE(TALK)

Paula Carneiro, directora da People Experience Unit da EDP, acredita que «Portugal pode efectivamente estar na linha da frente enquanto marca empregadora». E explicou porque na última re(talk) – iniciativa que há dois meses vem sendo promovida pela Randstad Portugal em parceria com a Human Resources, numa conversa em directo com Pedro Sousa, Sales & Operations director | Outsourcing da empresa especialista em Recursos Humanos.

 

Na última re(talk), a moderadora Ana Leonor Martins, directora de redacção da Human Resources, começou por lembrar que, o ano passado, Portugal foi considerado pelos World Travel Awards como o melhor destino turístico do mundo. Mas, e como destino para trabalhar, como será que é visto a nível internacional? E lembrou que segundo a OCDE, a qualidade do emprego é avaliada de acordo com três factores: salário, estabilidade profissional e ambiente de trabalho.

Pegando nestes três factores, Paula Carneiro começou por reconhecer que um factor pouco atractivo prende-se precisamente com o salário, uma vez que Portugal tem salários abaixo da média europeia. «A percepção de que Portugal não é muito favorável em termos de pay & benefit ainda é real», estando Portugal cerca de 19 pontos percentuais abaixo da percepção das melhores companhias do mundo. No entanto, em termos de ambiente de trabalho, e não tendo valores comparativos, diria que Portugal é um ponto bastante positivo, seja pela proximidade da cultura portuguesa, das lideranças e das organizações».

Em termos de estabilidade, sublinhou: «Somos um país relativamente estável naquilo que é a sua forma de contratar, pois não temos a instabilidade contratual de outras geografias, o problema é que não transformamos esta estabilidade numa maior meritocracia, a qual deveria ser um factor a considerar para conseguirmos atrair e reter os melhores».

Mas a responsável não deixou de sublinhar dois pontos claramente a favor do nosso País enquanto entidade empregadora. «O respeito e o reconhecimento, assim como a qualidade e o foco no cliente, dimensões que, talvez pela nossa cultura, acabam por fazer com que os nossos locais de trabalho e as nossas empresas de destaquem, sendo vistas como locais onde as pessoas se sentem respeitadas e que funcionam muito com foco no cliente. Este foco no cliente e na qualidade do serviço, acaba por se reflectir nos prémios que país tem ganho ao nível do Turismo.»

 

O tema do salário tem sido referido pelo estudo de Employer Branding da Randstad como um factor higiénico. Pedro Sousa explica o que isto significa: «O salário é de facto um factor importante, mas nós enquadramo-lo como um factor higiénico porque faz parte daquilo que é a relação laboral. Assim, o estudo destaca outros temas que as empresas devem ter em conta na sua estratégia, estando atentas à maneira como o mercado as percepciona enquanto entidade empregadora.» Concretiza: «Há um conjunto de acções que devem ser trabalhadas pelas empresas e conjugadas com a componente salarial, como o ambiente de trabalho, os desafios colocados aos profissionais e o próprio equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, todos eles elementos muito valorizados. Tudo junto acaba por aumentar aquilo que é a atractividade das empresas perante os candidatos e o mercado de trabalho.»

Mais, «a localização geográfica de Portugal é um pontos que favorecem a boa percepção do país, juntando-se a qualidade das nossas infraestruturas, o acesso ao talento e a um conjunto de competências», completa.

 

Mas se o critério localização for “removido” da equação, pela generalização do teletrabalho, Portugal fica “a ganhar ou a perder”? A directora da People Experience Unit da EDP,  acredita que «vai ser claramente atractivo poder continuar a trabalhar em Portugal, muito por culpa de um conjunto de factores que o país tem, como o clima, as praias, a natureza, e a qualidade de vida tudo mais-valias que servem de cartão de visita. Durante esta pandemia, e enquanto grupo EDP, tivemos como máximo de teletrabalho 72%, em todas as geografias, sendo que em Portugal chegámos a 79%, sendo de salientar que uma empresa como a nossa estava tecnologicamente preparada para esta situação de teletrabalho».

Paula Carneiro faz ainda notar que os resultados do teletrabalho foram verdadeiramente «maravilhosos. Independentemente de todas as circunstâncias, as nossas pessoas deram de facto uma resposta muito positiva, e mesmo as chefias não sentiram que a produtividade tivesse sido afectada», garante, acreditando que «numa situação normal de teletrabalho podíamos inclusive aumentar a produtividade do país. Com esta situação extrema aprendemos a ser mais disciplinados. Portugal tem aqui uma excelente oportunidade para considerar em dinamizar e dar uma nova vida ao interior do país, onde as pessoas podem perfeitamente viver e trabalhar sem de estar nas grandes cidades.»

Já Pedro Sousa lembra que, até agora, a localização era um dos elementos que faziam diferença na retenção dos colaboradores. «Será de facto interessante perceber se vamos deixar de ter este factor a ajudar na retenção do talento mas, por outro lado, acabamos por ter acesso a uma globalização maior do talento.»

Perante a provocação se não corremos o risco de querer ter pessoas a viver mas não a trabalhar para Portugal, Paula Carneiro acha que não. «No fundo, só vem, acelerar este movimento, que é a criação de um mercado de trabalho internacional, aproximando o mercado português de outros mercados.»

O responsável Randstad também concorda que o teletrabalho pode efectivamente ajudar Portugal na guerra pelo talento. «Continuamos a ser procurados por grandes entidades, pelo que não sentimos nenhum tipo de abrandamento nestes últimos dois meses.»

 

Reflexo da pandemia

E será que a actual pandemia veio reforçar ou fragilizar a marca Portugal, enquanto empregador? A moderadora faze notar que, se por um lado, estamos com uma imagem internacional positiva na forma como estamos a responder à crise sanitária, por outro, surgem mais dúvidas quanto a resposta à crise económica. Mas Paula Carneiro não tem dúvidas: «Na gestão da pandemia, Portugal sai reforçado. No caso da crise económica, a responsável destaca que a OCDE referiu que no combate à COVID-19 foram apresentados cerca de 150 respostas inovadoras e, dessas, 19% tiveram origem em Portugal. «Isto reforça bastante a qualidade do talento dos portugueses, aquilo que é o mindset dos profissionais que trabalham em Portugal e parece-me que, independentemente dos resultados económicos, neste indicador da inovação na resposta à pandemia temos um bom resultado que é de salientar.»

Pedro Sousa concorda que houve «um reforço positivo daquilo que está a ser feito e que internacionalmente estamos a ter um excelente reconhecimento. Agora temos um grande trabalho pela frente, que é assegurar que o regresso aos locais de trabalho e aquilo que esse regresso seja feito de uma forma assertiva, com processos e protocolos bem definidos, porque a forma como vai ser feita esta gestão vai ser determinante. Aqueles que melhor se adaptarem e melhor conseguirem ter este regresso com o menor impacto possível dentro das organizações serão aqueles que vão sair mais reforçados da crise.»

O Sales & Operations director acredita que depende de cada pessoa e das organizações operacionalizar estes processos, garantindo um regresso ao trabalho em segurança. «Vejamos, por exemplo o sector do Turismo, que começa a reabrir com selo de higiene e segurança. No restante mundo do trabalho temos de optar por medidas muito semelhantes, garantindo que a segurança das pessoas deverá estar sempre em primeiro lugar para que Portugal seja também reconhecido como um referência no regresso ao trabalho.»

 

Portugal como marca empregador

Paula Carneiro confia que «estamos no bom caminho para cimentarmos a nossa posição como marca empregador. É um caminho que não está completo, pois para sermos mais atractivos teríamos que ter em atenção alguns temas como a legislação laboral e a fiscalidade, temas muito importantes para quem investe em Portugal. Mas Portugal pode efectivamente estar na linha da frente enquanto marca empregadora.»

No mesmo sentido, Paulo Sousa completa: «Portugal já tem boas praias e bom tempo há muitos anos e só passou a estar na moda no sector do Turismo há relativamente pouco tempo. E isso é o resultado de uma estratégia montada e bem definida pelo Turismo de Portugal. Relativamente ao emprego vai ter de existir algo muito semelhante, que é tornar o emprego em Portugal mais atractivo. Isso implica a criação de uma estratégia garantindo que as empresas tenham a  atractividade necessária para que Portugal seja reconhecido internacionalmente como um país sexy para trabalhar».

 

re(Veja) na íntegra:

Texto: Sandra M. Pinto

 

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