Presidente da República critica “recuo na intervenção política das mulheres” e diferenças salariais

O Presidente da República considerou que se vive «um compasso de espera ou um recuo na intervenção política das mulheres», o que lamentou, assinalando a diminuição do número de eleitas nas eleições autárquicas de 26 de Setembro.

Marcelo Rebelo de Sousa, que falava na estreia do programa “Mulheres de coragem”, em Belém, criticou também as diferenças salariais entre géneros, declarando: «Tem sido uma luta nos salários. As mulheres recebem menos do que os homens em média, em quase todas as profissões. Isto não faz sentido e fará cada vez menos sentido».

Perante Carmen Garcia, enfermeira de Évora, a primeira mulher a participar neste programa, o chefe de Estado deixou a seguinte observação sobre esta profissão: «As enfermeiras têm de ter várias vidas ao mesmo tempo, em muitos casos, para poderem ter o rendimento mínimo – não no sentido de salário mínimo, mas de poderem ter realmente aquilo que em princípio deveriam ter na sua actividade profissional».

O programa “Mulheres de coragem”, lançado pelo Presidente da República, juntará ao longo das próximas semanas personalidades femininas de várias áreas, idades e origens à conversa com estudantes do ensino secundário, no antigo picadeiro real, depois adaptado a Museu dos Coches, junto ao Palácio de Belém, em Lisboa.

Marcelo Rebelo de Sousa reiterou que é «desde sempre defensor de quotas» de género e justificou assim a escolha do nome deste programa: «É preciso ter coragem para se ser mulher em Portugal? Resposta: sim, é preciso ser-se de coragem, ter-se coragem para se ser mulher neste mundo. É preciso, todos os dias se nota isso. Os homens têm de fazer um esforço para chegar a um objectivo, as mulheres têm de fazer um esforço muito maior, mas muito, muito maior».

O chefe de Estado disse que a ideia desta iniciativa foi de Djaimilia Pereira de Almeida, escritora, consultora da sua Casa Civil, para quem pediu palmas.

No seu primeiro mandato como Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa lançou programas com escritores, cientistas, jornalistas, desportistas e artistas à conversa com alunos de escolas de todo o país, encontros que foram interrompidos devido à pandemia COVID-19.

«Recomeçamos hoje a vida normal. Depois dos confinamentos, depois das restrições, depois de termos fechado estas actividades há um ano e meio», afirmou o chefe de Estado.

Na assistência estavam alunos de escolas secundárias do Barreiro, de Peniche, de Almada e do Instituto para o Ensino e Formação, a quem o Presidente da República falou sobre a situação «muito pior» das mulheres em Portugal no seu tempo de estudante.

«As raparigas não podiam ir sozinhas, não iam sozinhas a sítios públicos como cafés, bares, restaurantes, tinham de ir com colegas homens. À noite eram muito raras aquelas que saíam, tinham de ir com pessoas de família, mais velhas. Mesmo indo em grupo com amigas, isso era raríssimo, mesmo em Lisboa», relatou.

Em seguida, Marcelo Rebelo de Sousa congratulou-se com os progressos no número de mulheres a frequentar os vários graus de ensino, mas acrescentou que «não é assim nas chefias da Administração Pública – é melhor, mas não é assim», e que também «não é assim na política».

«Diminuiu o número de presidentes de câmara nesta eleição – diminuiu. Mas depois o mais grave é que isto aconteceu também, por exemplo, nas eleições alemãs. Não aumentou o número de mulheres que se esperava», assinalou.

Segundo o Presidente da República, «portanto, há aqui um compasso de espera ou um recuo na intervenção política das mulheres, nas lideranças políticas, nas lideranças sindicais, nas lideranças patronais».

O chefe de Estado referiu que «hoje por acaso há uma secretária-geral da CGTP», Isabel Camarinha, «mas é a excepção, nas patronais não há lideranças de mulheres, em muitas empresas não há».

Depois de Carmen Garcia, enfermeira de Évora com um blogue sobre maternidade e cronista do Público, vão participar no programa “Mulheres de coragem” Helena Reys Santos, militar da Marinha com o posto de capitão-tenente, de Lisboa, e Rute Neves, a primeira mulher a assumir um cargo de comando nos Bombeiros Voluntários de Santo Tirso, no distrito do Porto.

A cantora Selma Uamusse, nascida em Maputo, a encenadora e atriz Zia Soares, que nasceu no Bié, em Angola, a escritora brasileira Tatiana Salem Levy, nascida em Lisboa, a cineasta Cláudia Varejão, natural do Porto, com documentários premiados, a fadista e letrista Aldina Duarte, de Lisboa, e a ilustradora e designer gráfica Yara Kono, que veio há 20 anos de São Paulo, completam a lista de participantes.

Ler Mais