Será Portugal um país bom para trabalhar? Estes dois especialistas não têm dúvidas (com vídeo)

Na sexta-feira passada realizou-se mais um re(talk), tendo como tema a atractividade de Portugal enquanto país para trabalhar. Luís Juncá, vice-presidente de Negócio Internacional da Inoweiser e Paulo Ayres, senior manager da Randstad Professionals, não tiveram dúvidas e elencaram vários motivos pelos quais temos razões para estar optimistas.

 

Por Sandra M. Pinto

 

Sob o título “Next Stop: Portugal”, o que se quis saber nesta re(talk), iniciativa da Randstad em parceria com a Human Resources, foi se o nosso País é, efectivamente, a próxima paragem para muitos profissionais. Será Portugal verdadeiramente atractivo para trabalhar? O que o determina, começou por questionar a moderadora Ana Leonor Martins, directora de Redacção da Human Resources.

Luís Juncá acredita que sim. «Portugal é “the next stop” na escolha dos trabalhadores estrangeiros». E enumerou vários motivos «que são preponderantes numa tomada de decisão desses trabalhadores internacionais», reconhecendo que, «como qualquer escolha, também a esta tomada de decisão de ir trabalhar para fora exige uma mudança, a qual implica, neste caso,  abdicar da vida pessoal, da família e dos amigos».

Concretizou: «Portugal apresenta um excelente balanço entre o factor humano e o factor profissional. Por outro lado, todos reconhecem que Portugal tem alguns factores que se apresentam hoje como um verdadeiro cartão-de-visita, como seja o clima, o sol, a praia e a hospitalidade, aos quais se juntam a sua qualidade de vida e a segurança, estando no top dos países mais seguros do mundo. Quem vai deixar o seu país para ir trabalhar para outro, neste caso Portugal, procura um cenário de estabilidade no que à segurança diz respeito. Também é relevante o próprio fuso horário português igual ao do Reino Unido, e a mobilidade, pois estamos muito próximos de qualquer capital europeia como fusos horários reduzidos.»

Também no contexto económico Portugal tem factores muito interessantes, «como todo o movimento de investimento de grandes multinacionais que aqui marcam presença e que por cá têm vindo a abrir escritório; a própria geografia apresenta-se igualmente como um factor a ter em conta pelos trabalhadores estrangeiros, sendo que o nosso país é hoje um verdadeira porta de acesso aos mercados europeus e também uma porta para os mercados de língua portuguesa, sendo, na minha opinião, estes dois últimos factores bastante relevantes naquilo que é o nosso contexto económico.»

Luís Juncá acrescenta ainda a realidade de Portugal ser reconhecido como um excelente potenciador das qualidades e qualificações dos seus recursos. «Hoje Portugal produz realmente talento, sendo hoje o segundo país na qualificação da área de engenharia e em IT, duas das áreas mais requisitadas no decurso deste desafio do Covid-19». A isto tudo juntam-se um conjunto de incentivos financeiros e legais, uma vez que Portugal actualmente tem um regime de tributação bastante atractivo porque as pessoas que vêm para cá morar vão ter uma taxa de tributação que em muito os vai beneficiar durante 10 anos.»

Igualmente de destacar a nossa «componente mais organizativa que atrai os profissionais estrangeiros. Portugal tem demonstrado ser um país muito capaz de organizar eventos de grande dimensão internacional, cujo maior exemplo é o WebSummit que nos tem colocado no grande palco das startups ao nível internacional, e mesmo pós-COVID fomos capazes de organizar eventos como a Final da Champions League, a Formula 1, e o Moto GP», sublinha. «Este momento e esta capacidade é muito importante pois demonstra que o país é de facto capaz de reunir e de criar valor naquilo que é o contexto internacional».

O vice-presidente de Negócio Internacional da Inoweiser, refere ainda «alguns casos interessante de criação de empresas que estão a ter um reconhecimento internacional, os chamados unicórnios, empresas que se estão a diferenciar nos mercados onde actuam, sendo muito importante para quem toma a decisão de vir para cá trabalhar saber que existe esse factor de inovação e de captação de talento em áreas inovadoras». Perante o mercado internacional, Portugal surge como um país realmente inovador, ocupando actualmente a 12.ª posição no conjunto dos países europeus, pelo que neste balanço entre os factores humanos e o contexto económico Portugal apresenta, de facto, um equilíbrio interessante para quem vai ter de tomar uma decisão com esta responsabilidade».

 

Paulo Ayres, que nasceu no Brasil mas conhece Portugal há mais de 20 anos, começou por partilhar o que o atrai em Portugal e o que o fez querer vir trabalhar para cá. «Morei durante três anos em Espanha, altura em que vinha frequentemente a Portugal. E sempre gostei muito do país, pelo que sempre desejei vir para cá morar.» Ligado desde sempre ao recrutamento na área da tecnologia no Brasil, começou a perceber o potencial de Portugal nesta área especifica. «Um dos aspectos que devemos ter em conta quando falamos em Portugal é o turismo, sendo que o país tem um ambiente muito agradável para o turismo tendo-se tornado nos últimos num destino turístico muito forte. Quem visita o país fica encantado, seja pelas pessoas, pelas paisagens, pelo que até podem vir a primeira vez como turistas mas depois ficam com o desejo de voltar para morar. O turismo profissional foi o primeiro ponto que tornou Portugal num destino atractivo para os profissionais estrangeiros», salienta.

«Além de ser um país muito agradável, Portugal tem uma mão-de-obra muito qualificada, ainda mais em conta do que o resto da Europa, mas já muito competitivo na área de tecnologia», concorda Paulo Ayres, «São dois pontos importantes para a atractividade do país, mas as pessoas vêm porque sabem que aqui há oportunidades, pois ninguém vai para um país onde não há oportunidades de trabalho».

 

Dois contras, compensados por outros prós

Portugal tem vindo de facto a ganhar competitividade na Europa enquanto país, não só para visitar mas também para trabalhar, sendo muito procurado já por profissionais qualificados. Estaremos no bom caminho rumo ao emprego e à competitividade das nossas empresas? O que é tem sido feito para passar de um país que é de facto muito agradável para um destino efectivamente competitivo e com oportunidades de trabalho?

Na opinião de Paulo Ayres, o grande factor que impede ou pode impedir que um profissional venha trabalhar para Portugal é o custo da habitação. «Principalmente nas grandes cidades, o custo da habitação subiu muito e isso pode estar a tornar-se num impedimento para que mais profissionais estrangeiros venham trabalhar para Portugal», chama a atenção. «Com a COVID, a situação melhorou um pouco mas até ao ano passado não havia casas disponíveis para arrendar e as que havia eram muito caras. Lisboa e Porto são de facto duas cidades muito difíceis quando falamos do custo da habitação pela escassez e pelo custo.»

Concordando com o que foi afirmado pelo outro convidado, Luís Juncá é da opinião que estamos perante um conjunto de factores estruturais que vão sempre fazer a diferença relativamente à escolha de alguém para vir viver e trabalhar em Portugal. «A própria estabilidade politica e democrática é um factor a ter em conta. Vivemos hoje momentos conturbados um pouco por todo o globo e Portugal tem apresentado alguma resiliência alguma capacidade e responsabilidade politica nesse sentido.» Há de facto um aumento daquilo que é o custo de habitação, «mas existem outros factores que importam, como seja o ensino e educação pública gratuita, a própria saúde pública tem preços muito mais competitivos que também já ajudam a compensar um pouco esse sobrecusto da habitação.»

O outro handicap é na realidade o salário praticado em Portugal. «Ainda estamos muito a baixo da média internacional, mas temos assistido pelo menos a esse reconhecimento, ou seja, há claramente em algumas áreas e em alguns sectores esse reconhecimento de que os salários são baixos, mas ao mesmo tempo também temos visto esse reconhecimento do nosso handicap ser fundamental para tomar medidas para reduzir esse feito menos positivo do salário.»

 

A democratização do remoto. É positiva para Portugal?

O trabalho remoto está hoje muito mais democratizado devido à pandemia, pelo que já todos percebemos que muitas coisas podem ser feitas à distância. Assim, o facto de Portugal ser considerado um país interessante para viver, não significa que as pessoas tenham de trabalhar cá, uma vez que podem estar a viver cá e a trabalhar para empresas estrangeiras.

Luís Juncá faz notar que esse pode ser um movimento para os dois lados. «Pode haver quem escolha viver e trabalhar lá fora, ou viver lá fora e trabalhar cá.  Mas parece-me que ainda é muito cedo para fazer este balanço apesar de haver um indicador muito relevante que é o faco de cada vez mais termos pessoas a escolher numa fase inicial da sua vida pessoal Portugal como um destino para o estudo académico.»

Destaca: Cerca de 14,1 % das pessoas que estudam no ensino universitário são pessoas oriundas do estrangeiro. «Isto significa que a possibilidade de nós conseguirmos já atrair essas pessoas numa fase em que ainda não entraram no mercado de trabalho pode também ajudar a convence-las a continuar cá em Portugal. E isso é mesmo muito relevante.» A retenção destas pessoas vai depender da forma como as próprias empresas portuguesas se posicionam internacionalmente. «No nosso caso, mesmo num período pós-Covid, conseguimos conquistar novos clientes internacionais e novas geografias, sendo que temos hoje colaboradores a trabalhar em serviços especializados de tecnologia e de engenharia para países como os EUA, o México ou o Porto Rico, e muitos destes clientes foram conquistados na fase do Covid», revela. Para o vice-presidente de Negócio Internacional da Inoweiser, há um papel importante a desempenhar pelas empresas portuguesas, «que devem claramente apostar numa internacionalização».

Seja como for, só o facto de os profissionais estrangeiros estarem a viver em Portugal já é muito positivo, nem que seja apenas pelo lado do consumo. «Se uma empresa procura alguém que já está em Portugal, talvez aceite o trabalho de um forma mais fácil do que se estivesse noutro país»,  O facto de haver mão de obra qualificada a viver em Portugal, ainda que não esteja a trabalhar para uma empresa portuguesa, é benéfico, pois é mais fácil de a aliciar para um novo projecto», acredita Paulo Ayres.

«Temos vindo a assistir a um investimento estrangeiro cá em Portugal, obviamente que esse factor foi decidido pelo objectivo de eles puderem usar talento português e terem pessoas estrangeiras a trabalhar para essas empresas», partilha Luís Juncá. «Ofacto de essas pessoas residirem cá estão mais próximas do nosso mercado o que permite uma capacidade de captação muito mais facilitada».

 

Os centros de competências e a escassez de talento

Paulo Ayres confirma que «há uma carência de talento de primeira linha. Isso não melhorou com a COVID, sendo que o mercado português, até ao ano passado, tinha mais oportunidades do que pessoas a procurá-lo. E a dificuldade em contratar pessoas era transversal.»  Daí ser cada vez mais importante incrementar a atratividade de Portugal, assinala.

Luís Juncá encara a nova realidade enquanto uma realidade transitória. «No pós-COVID claramente vai continuar a existir essa procura e esse investimento por parte das empresas estrangeiras, bem como a sua presença física no nosso país. Primeiro porque já existem incentivos que beneficiam muitas destas empresas, depois porque há todo um custo de mudança,  e depois há muitas áreas de inovação cientifica que dificilmente vamos deixar de ter não só o investimento como a presença física, porque é impossível numa área de investigação levar a sua área de trabalho para casa das pessoas».

Luís Juncá conclui chamando a atenção para o facto de sermos um país com um população envelhecida, «pelo que claramente Portugal tem de continuar apostar em atrair profissionais estrangeiros».

(re)Veja aqui, na íntegra.

As re(talks) são uma iniciativa da Randstad em parceria com a Human Resources, promovida desde Março. Recorde aqui.

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