Somos todos anormais

Uma vida normal. Normal que não existe, que é na verdade anormal, sem norma. Porque o previsto e o imprevisto estão de mãos dadas na forma como percorrem o tempo, como o fazem passar rápido demais ou como nos afunda numa espera que parece indeterminável.

Por Inês Veloso, directora de Marketing e Comunicação da Randstad Portugal

 

Uma pessoa normal. Um normal que se reinventa todos os dias, um normal que é diferente do outro normal, que cria anormais. Somos todos anormais e sabemos disso.

Cada momento factualmente igual com experiências diferentes. Olhos que na mesma direcção apontam em sentidos opostos, que criam emoções e que marcam ou são simplesmente indiferentes, invisíveis.

Um mundo de paradoxos, de antagonismos, de anormais que são na verdade histórias. Um mundo de histórias. E todos somos uma história, com mais ou menos emoção, com capítulos em que a normalidade ganha contornos de ficção e nos aproxima ou afasta de quem nos lê, de quem é espetador ou de actores que de papel secundário passam a principal nas nossas vidas. Histórias que gostamos de ouvir, que espreitamos, que fechamos a página ou que nos viciamos a ler, sem querer que acabe. Histórias que são experiências, que dão emoção à razão e que criam emoções às marcas que fazem parte das nossas vidas.

Tudo é uma história. Começa quando acordamos e continua numa rotina ou em algo extraordinário que nos acontece. E as marcas são cada vez mais uma história. Organismos vivos que se comportam maioritariamente de forma coerente, mas que não param no tempo. Personagens que querem marcar as nossas histórias, que querem estar presentes não como cenário mas como parte integrante da nossa vida. Logótipos que respiram, que se transformam ou não em mascotes, que cruzam as esquinas para esbarrarem connosco e perguntar o nosso nome. Querem estar ao nosso lado quando estamos em festivais, quando casamos, quando perdemos alguém… Querem estar presentes com relevância, não sempre, mas sempre que faça verdadeiramente sentido.

Querem fazer parte das histórias mas têm de ter a sua, de a saber contar. Não ser porque todos são. Fazer o exercício do auto-conhecimento. Quem sou e o que quero ser. Qual o meu propósito, quais as minhas promessas. Não as que faço no inicio de cada ano e nem sempre cumpro, mas aquilo que me distingue e que me leva a ser parte de uma história e não apenas cenário.

E as marcas são cada vez mais imperfeitas. Imperfeitas porque se assumem. Deixaram os textos bem escritos com propósitos dúbios, saíram do armário em momentos chave e apagaram o “a” em temas de política, religião ou até futebol. Cada vez mais as marcas estão fora da normalidade, querem ser anormais, anormais junto dos seus normais. Já não falam para todos, falam cada vez mais para alguns. Assumem causas, não as de todos, mas as suas. Apoiam o movimento LGBT, são contra o governo Trump ou pedem desculpa por no passado terem sido sexistas no seu discurso. Marcas que são cada vez mais humanas mesmo quando são tecnologia, ou quando se dedicam ao B2B. Marcas que hoje são todas P2P (people to people), que querem fazer parte das histórias, integrar as experiências, ir além da simples presença do logotipo. Estão nos festivais de música onde em vez de fazerem entrevistas de emprego celebram o talento, vão correr a meia-maratona sem vender energia ou expor quadros sem ter de abrir uma conta bancária.

Marcas que são mais do que os seus produtos, que têm propósitos, que querem vender mas que acima de tudo querem ser e é no poder das histórias que se encontraram e que têm crescido. Histórias que se vão reinventando sempre com pessoas e com marcas, com marcas que são pessoas e com pessoas que marcam, o mundo do era uma vez…

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