Sorriso, escuta e presença: ferramentas subestimadas de liderança

Por Ana Isabel Fernandes, Business Unit manager ASSA ABLOY Entrance Systems Portugal e Senior Executive leader

 

Num mundo corporativo que se move a uma velocidade vertiginosa, onde a produtividade se tornou uma espécie de religião moderna e os relatórios se impõem como prova de valor, há gestos silenciosos, quase invisíveis, que continuam a ser desconsiderados nas equações de sucesso: o sorriso, a escuta e a presença.

À primeira vista, poderão parecer detalhes banais, talvez até ingénuos, quando colocados ao lado de conceitos como performance, liderança estratégica ou transformação digital. No entanto, nas organizações que optam por colocar o ser humano no centro, e não apenas nos slogans institucionais, mas nas práticas quotidianas, são precisamente esses gestos que têm sustentado as equipas, fortalecido o compromisso emocional e revelado as lideranças mais genuínas e transformadoras.

O sorriso, quando genuíno, tem um poder subtil mas profundo: ele comunica acessibilidade, empatia e abertura emocional. É um sinal silencioso de segurança psicológica, uma mensagem não verbal que diz “estás em casa”, mesmo quando o contexto é exigente. Em momentos de tensão, em reuniões difíceis, ou simplesmente nos corredores entre tarefas, o sorriso de um líder pode funcionar como ponto de regulação emocional, desarmando resistências, reduzindo distâncias e criando condições para o diálogo autêntico.

Segundo alguns estudos, colaboradores que se sentem emocionalmente seguros apresentam níveis significativamente mais altos de criatividade, iniciativa e colaboração. E essa segurança começa no corpo, num olhar que não julga, numa expressão que acolhe, numa postura que comunica: “podes ser quem és aqui”. O sorriso, assim, deixa de ser um adereço social para se tornar uma ferramenta consciente de gestão emocional, presença e liderança.

Já a escuta, tantas vezes referida, mas tão raramente praticada com profundidade, é talvez uma das competências mais determinantes na diferenciação entre líderes funcionais e líderes memoráveis. Escutar verdadeiramente não se limita a ouvir as palavras que nos são ditas, mas envolve acolher o subtexto, ler os silêncios, captar os sinais do corpo, perceber o que está a ser contido ou disfarçado. É um exercício de presença radical, de atenção plena, de interesse genuíno pelo outro.

Na minha vivência com diversos líderes, fui percebendo que a verdadeira influência não está na eloquência do discurso, mas na capacidade de escutar com intenção e vulnerabilidade. Quando um colaborador sente que está a ser escutado, não apenas tolerado ou interrompido, algo se transforma dentro dele: sente-se visto, valorizado, incluído. E esse sentimento traduz-se em confiança, lealdade e, inevitavelmente, em resultados mais consistentes e humanos.

Mas escutar, como tudo o que é verdadeiramente valioso, exige tempo. E tempo, hoje, parece ser o recurso mais escasso nas organizações. Talvez por isso seja tão raro encontrar líderes que saibam escutar de forma plena, porque isso implica parar, pausar, respirar… e essa pausa, por si só, já é um gesto de resistência num tempo que nos exige pressa constante.

Por fim, a presença, esse superpoder silencioso que continua a ser negligenciado no universo da liderança. Estar presente não é apenas estar fisicamente num espaço; é estar inteiro, com o corpo, com a mente, com a alma. É deixar o telemóvel de lado, suspender a ansiedade do próximo compromisso e escolher estar ali, naquele momento, com aquela pessoa, com total intenção e atenção. A presença verdadeira é rara, e talvez por isso seja tão poderosa.

Num mundo repleto de estímulos, distrações e ruído, a presença tornou-se um ato quase revolucionário. É um gesto de respeito, de amor e de conexão. E as equipas sentem-no. Sabem quando alguém está ali por completo, disponível, envolvido e quando está apenas a cumprir um protocolo. Já assisti a verdadeiras transformações organizacionais acontecerem simplesmente porque um líder reaprendeu a estar presente: deixou de reagir automaticamente e passou a responder com intenção, deixou de controlar e passou a confiar, deixou de acelerar e passou a escutar.

Estamos a viver uma mudança de paradigma na liderança. Já não basta ser tecnicamente competente, ter uma visão estratégica ou dominar os indicadores de desempenho. Hoje, mais do que nunca, pede-se aos líderes que sejam íntegros, conscientes, humanos. Que saibam integrar a razão com a emoção, a produtividade com a empatia, o resultado com o cuidado.

Neste novo contexto, sorrir, escutar e estar presente não são meros complementos à liderança tradicional, são os seus novos alicerces. Não são soft skills, como tantas vezes se diz, mas power skills. E são estas competências, tão aparentemente simples, que verdadeiramente regeneram a cultura, fortalecem os vínculos e humanizam as organizações.

A boa notícia? Não exigem investimentos financeiros, tecnologias sofisticadas ou estruturas complexas. Exigem apenas intenção, consciência e compromisso. E talvez seja precisamente isso que o futuro mais nos pede enquanto líderes: menos fórmulas, mais humanidade.

Porque, num mundo cada vez mais dominado por inteligência artificial, dados e algoritmos, aquilo que continuará a distinguir os grandes líderes será sempre o que nenhuma máquina poderá replicar: a capacidade de sorrir com o coração, de escutar com a alma e de estar presente com tudo o que se é.

E talvez, no fim de tudo, seja isso e só isso, que transforma verdadeiramente as pessoas, as equipas e o mundo.

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