Teletrabalho: a energia que se dilui na produtividade

«Desencante-se quem pensa que o home office só traz vantagens. Não podemos negar que é prático, mas num momento de lucidez, e à medida que o tempo vai passando, torna-se evidente que contraria a natureza social do indivíduo. Se por um lado nos tornamos mais funcionais, por outro há toda uma energia que se perde pelo caminho.»

Por Carolina Xavier e Sousa, Head of Marketing & Communication da iad Portugal

 

É certo que o teletrabalho já existia, mas a pandemia veio provar a empresas e colaboradores que o mundo continua a girar e que os resultados continuam a aparecer, mesmo que os diferentes elementos da organização não partilhem o mesmo espaço físico. É certo também que o trabalho remoto veio relembrar o tempo e o dinheiro despendido em deslocações, tantas vezes desnecessárias. E o ambiente agradece.

Se no início da pandemia muitos se queixavam de trabalhar em casa com alguma dificuldade de adaptação à nova realidade, o regresso à presença diária no escritório nem sempre é bem visto pelos colaboradores, que se habituaram às comodidades do teletrabalho e a uma maior facilidade em conciliar a vida pessoal e profissional. Em casa (sem crianças por perto, diga-se!) conseguimos momentos de maior concentração, com menos solicitações de colegas e interrupções imprevistas. Não esquecer também que há mais rotinas e tentações que se entrelaçam com o tempo de trabalho.

Contudo, se, por um lado, nos tornamos mais funcionais, por outro, há toda uma energia que se perde pelo caminho. Os momentos de descontração e de convívio entre colegas, a ideia que surge na pausa do café, o desabafo de alguém que nos faz relativizar um dia menos bom, as gargalhadas, as confidências… Pode o teletrabalho até fomentar a produtividade, se as pessoas forem sérias e disciplinadas, mas, muitas vezes, a motivação esfuma-se. Como seres sociais que somos, e ainda que há quem se dê bem sozinho, o sentimento de pertença a uma equipa, a uma organização, faz toda a diferença. Aquele sentimento de “todos remarmos para o mesmo lado”, de cada um fazer parte de um todo, de brindar às vitórias e de partilhar as derrotas.

Se houver quem não seja particularmente feliz a executar as suas funções, muitas vezes é a componente social que nos fideliza ao grupo. E isso vai-se esvaindo com o distanciamento, apesar da ilusão de um contacto permanente que, tantas vezes, não nos deixa respirar entre reuniões à distância. Mas importa relembrar que diante de um computador, dos cinco sentidos apenas recorremos a dois: a visão e a audição. Mas faltam os outros três: o tato, o olfato e o paladar, que, quando partilhados, tornam tudo tão mais intenso e completo.

Desencante-se quem pensa que o home office só traz vantagens. Não podemos negar que é prático, mas num momento de lucidez, e à medida que o tempo vai passando, torna-se evidente que contraria a natureza social do indivíduo.

O teletrabalho veio para ficar e é uma opção perfeitamente viável em muitos casos. Conformem-se as administrações mais conservadoras. Mas acredito que no meio está a virtude. Um modelo híbrido pode fundir o melhor dos dois mundos para empresas e colaboradores, reconhecendo as mais-valias do teletrabalho na gestão do nosso dia-a-dia, sem deixar pelo caminho os momentos de convívio, a energia que une as equipas e agrega as pessoas. A energia que nos emociona, que nos arrepia, que nos faz rir e chorar. A energia que nos move. E essa não há teletrabalho que pague.

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