Trabalhar em casa: Os impactos (e oportunidades) da liderança à distância

Desde Março que o mundo assiste a mudanças radicais no contexto profissional. Mais do que a mera transferência do local de trabalho para as casas de cada um, verifica-se a necessidade de mudar a forma de liderar as equipas e gerir os relacionamentos com os clientes.

 

Por Felicidade Ferreira, Country manager de Portugal, Espanha, Cabo Verde e São Tomé da Primavera BSS

 

Haverá sempre quem olhe para os aspectos negativos trazidos por esta nova realidade imposta – que em muitos casos obriga ao trabalho à distância –, e aqueles que se focam naquilo que de melhor cada circunstância pode trazer. Apesar de este período estar cravejado de fatalidades, depende de cada um encontrar as oportunidades. E elas existem:

 

 

1. Proximidade              
É verdade que as equipas estão fisicamente distantes, mas isso não significa que estejam menos próximas. Esta forma de trabalhar em casa permite comunicar com as equipas e com os clientes com maior regularidade. Estamos à distância de um clique e as agendas são mais simples de gerir, torna-se mais fácil encaixar mais uma conversa com colegas e clientes e, assim, encontrar espaço para ir mais além nas relações profissionais e operacionais.

Hoje, inevitavelmente, as conversas começam pelo interesse genuíno de saber como os colegas estão em termos pessoais, os clientes, as famílias, como estão a gerir pessoalmente esta fase. Esta necessidade de partilhar sentimentos, receios e ansiedades, em tempo de incerteza, aproxima colaboradores, equipas e líderes.

Também é tempo de estar mais perto dos clientes e de mostrar proximidade e capacidade de ajudar a ultrapassar este momento. A organização tem de estar virada para fora e hoje pode fazê-lo de forma mais célere e multidisciplinar. É possível ter uma atenção redobrada e mais assertiva. Neste aspecto, as lideranças tiveram de se reinventar para garantir que, apesar da distância, as equipas estão envolvidas com a organização, têm um propósito e fazem parte de um grupo com uma missão bem definida.

É fundamental que a cultura organizacional não se perca, que as equipas estejam mais próximas, que exista cumplicidade, que as equipas se lembrem da necessidade de separar as horas de trabalho das horas de lazer.

Trabalhar em casa não significa trabalhar sem horários e sem tempo de qualidade para a vida pessoal de cada um. Trabalhar remotamente pode significar aumentar a qualidade de vida e aumentar simultaneamente a produtividade.

 

2. Maior produtividade
Hoje, todos conseguimos estar a horas nas reuniões e de forma natural. É algo que acontece sem esforço por parte das equipas. É um aspecto extremamente positivo que leva a acreditar que é possível conseguir manter estes hábitos no futuro, mesmo em reuniões presenciais. Esta prática de cumprimento de horários, tanto no início como no fim da reunião, a que passámos a assistir, contribui para o aumento da produtividade.

Ainda relacionado com o formato de reuniões que exige trabalhar em casa, é o facto de existir uma coerência de comunicação (fundamental neste formato de reunião, para que seja possível entender cada membro da equipa correctamente), o que obriga, inconscientemente, a estarmos mais atentos ao interlocutor. Aumenta a atenção e o foco, porque praticamos muito mais a escuta activa.

Outro aspecto com influência na nossa produtividade é o foco colocado no trabalho. Ao trabalhar em casa existem menos interrupções e distracções que são comuns no trabalho, num ambiente rodeado de pessoas.

 

3. Maior autonomia e responsabilidade
A base da uma boa liderança está assente na confiança e na responsabilização. Apesar de muitos líderes perseguirem este desígnio, a verdade é que, por variados motivos, muitas vezes são cometidas falhas que obrigam a controlar e retirar autonomia às equipas. Num regime de teletrabalho, para que tudo funcione, a confiança é fundamental. As equipas não estão permanentemente debaixo da visão do líder, e não é possível estar em vigilância contínua.

A gestão da equipa tem de passar pela definição dos objectivos e deixar que cada pessoa se organize e desenvolva a sua função, tome decisões e apresente resultados. Passamos a avaliar os colaboradores pelas tarefas realizadas, em vez de pelas horas dispensadas em cada tarefa.

A função do líder é estabelecer guidelines, orientar, motivar e retirar possíveis obstáculos que possam ser impeditivos de a equipa atingir os resultados.

 

4. Benefício ambiental e financeiro
Vários estudos já demonstraram que o nosso planeta agradece a diminuição significativa das deslocações casa/trabalho, que têm um impacto negativo no ambiente e na qualidade de vida, pelas horas perdidas no trânsito. Já para não falar do custo financeiro dessas deslocações, quer para as organizações quer para os colaboradores que percorrem longas distâncias casa/trabalho/casa.

Outra prática que se tornou obrigatória no trabalho remoto é a digitalização a 100%. Estando em casa, cada um, obrigatoriamente, partilha os documentos por via digital. Deixaram de ser impressos documentos para deixar na secretária dos colegas. Menos papel, menos impacto ambiental.

 

5. Mais tempo para pensar
No dia-a-dia, no escritório, são inúmeras as solicitações para participar e colaborar em tarefas não programadas. Com inúmeras distrações e interrupções, torna-se muito difícil encontrar tempo para pensar e reflectir nas melhores práticas para atingir melhores resultados. Trabalhar remotamente veio trazer esta possibilidade de dedicar tempo à concentração.

Quando hoje se fala nas competências fundamentais que os colaboradores do futuro têm de desenvolver, passam muito pela capacidade de pensar e ser criativo. A criatividade e a concentração precisam de tempo de qualidade.

Apesar dos vários pontos positivos no trabalho remoto, penso que o futuro irá passar por um modelo híbrido que alie o trabalho no escritório e o trabalho a partir de casa. Simultaneamente, as novas gerações também vão privilegiar as empresas que permitam aos colaboradores fazer a gestão do seu tempo.

As lideranças, neste novo modelo, terão de valorizar ainda mais as soft skills dos candidatos, tais como ser:

Confiável;
Responsável;
Colaborativo;
Organizado;
Criativo;
Ético.

Estas soft skills serão fundamentais para o líder trabalhar com a equipa em trabalho remoto, sem qualquer constrangimento, nem insegurança.

Agora que percebemos que a tecnologia nos permite trabalhar em casa com qualidade, vamos ter de encontrar o melhor dos dois mundos.

 

Este artigo foi publicado na edição de Janeiro (nº. 121) da Human Resources, nas bancas.

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