Consulting House: Chegou a hora de transformar os objectivos

À medida que as empresas se preparam para os próximos ciclos de avaliação de desempenho, surge uma questão fundamental: os objectivos definidos reflectem realmente o propósito da empresa?

 

Por: Nicole Eifler, co-founder, partner & COO da Consulting House.

 

Quantas vezes os objectivos anuais se transformaram em folhas esquecidas numa gaveta? E se, em vez disso, se tornassem faróis que guiam o crescimento? Imagine o impacto, se cada objectivo fosse uma faísca para criatividade, motivação e engagement.

Saber o que é esperado de si no trabalho é um elemento fundamental para o bem-estar dos colaboradores, e sem um destino claro a perseguir, os colaboradores podem sentir-se perdidos. No entanto, apenas cerca de 50% dos colaboradores dizem saber o que é esperado deles no trabalho.

Quando a definição de objectivos é encarada pelos managers como uma formalidade administrativa, não passa de uma obrigação para cumprir com os sistemas de avaliação de desempenho. No entanto, a definição de objectivos pode – e deve – ser muito mais do que isso. Quando definidos com qualidade, os objectivos tornam-se um poderoso motor de crescimento, tanto para a organização como para os colaboradores.

 

O perigo dos objectivos sem propósito 
No meu trabalho, independentemente do sector, do país ou do nível hierárquico dos managers, encontro a confirmação do estudo citado acima: os colaboradores frequentemente não sabem como o seu trabalho contribui para o propósito maior da empresa. Sentem que têm um conjunto de tarefas para cumprir, mas não compreendem como estas são úteis para a organização.

Por exemplo, uma equipa financeira que produz relatórios de desempenho uma vez questionou-se sobre a relevância desta tarefa e a sua manager comentou: «É impossível conectar esta tarefa aos objectivos estratégicos da empresa!» No entanto, quando explorámos para que serviam os relatórios, ficou claro que são a base para as decisões do CFO. Assim, ao invés de apenas produzir os relatórios, a equipa poderia ter como objectivo garantir a entrega de análises críticas e recomendações financeiras proactivas, permitindo ao CFO tomar decisões mais atempadamente. Objectivos conectados à visão da empresa não só aumentam a motivação, como também tornam cada colaborador um agente estratégico do crescimento organizacional.

 

Matar a criatividade das soluções
Um dos erros mais comuns na definição de objectivos é confundi-los com tarefas. Um manager da área de cibersegurança, por exemplo, pode estabelecer como objectivo “criar relatórios mensais sobre security breaches”. Embora essa seja uma tarefa essencial, não impulsiona a criatividade do colaborador. Em vez disso, um objectivo mais útil para criar maior engagement poderia ser: “Reduzir os security breaches em X%, promovendo a consciencialização e responsabilização nas unidades de negócio”. Desta forma, o colaborador ganha autonomia e espaço para explorar soluções e podem-lhe surgir, além dos relatórios mensais, ideias inovadoras tais como formações regulares ou iniciativas criativas como um teatro dos colaboradores do departamento para a empresa “Os Caçadores de Phishing”. Dar liberdade ao colaborador para encontrar o seu próprio caminho para chegar ao objectivo, não só melhora o desempenho, mas também aumenta o envolvimento e a motivação.

Um erro semelhante, mas com uma vertente diferente, é definir objectivos que são uma simples extensão da descrição de funções. Por exemplo, um colaborador da equipa de facilities recebe o objectivo de “manter as salas de reuniões limpas e equipadas com águas”. Mas será que este é realmente um objectivo? Na realidade, trata-se de uma expectativa operacional, algo inerente ao cargo e não um marco de crescimento.

Uma objecção com que lido habitualmente neste ponto é: «E se a pessoa não faz o mínimo? Preciso de estabelecer isto como objectivo!» A resposta a esta questão é simples: cumprir as responsabilidades básicas do cargo é uma expectativa inerente à função. Se o desempenho não atender às expectativas, o caminho adequado é o feedback contínuo e não a formulação de objectivos que apenas reforcem o desempenho esperado.

Um objectivo verdadeiro deve impulsionar o colaborador para além da sua zona de conforto. No caso das facilities, um objectivo eficaz neste sentido poderia ser: “Identificar e implementar três soluções criativas para tornar as salas de reuniões mais interactivas, especialmente para reuniões híbridas, contribuindo para a inovação das equipas de produto – medido pelo feedback das mesmas”. Aqui, o colaborador é desafiado a pensar fora da caixa, a desenvolver-se ao encontrar as soluções e a contribuir para o sucesso da empresa.

 

A falta da narrativa nos objectivos
Definir objectivos que impulsionam o crescimento da equipa continua a ser um dos maiores desafios para os líderes. Uma prática comum que observo é definir os objectivos a partir dos KPI. Estes medem o progresso, mas é a narrativa que inspira a acção e conecta o colaborador ao propósito da empresa.

Por exemplo, quando um manager define como objectivo “aumentar a fidelização dos clientes em X%” sem explicar a sua importância estratégica, perde-se uma oportunidade de criar significado para o colaborador. Um objectivo mais motivador poderia ser: “Fortalecer o vínculo com os nossos clientes através de novos produtos e transformar cada interacção numa oportunidade de criar embaixadores da marca, aumentando a taxa de fidelização em X%”.

A prática oposta – definir objectivos vagos – leva ao mesmo problema. Por exemplo, num objectivo como “melhorar o inglês”, para além de faltarem indicadores precisos e mensuráveis de sucesso, falta a narrativa, que estimula a motivação. E se disséssemos em vez disto: “Até ao final deste ano, atingir o nível B2 de inglês, permitindo a revisão de contratos, redacção de e-mails e apresentações em inglês, contribuindo para acelerar os processos de integração no âmbito da internacionalização da empresa”? Ficaria mais evidente a importância do objectivo.

Quando os colaboradores entendem o “para quê” por trás das metas, a motivação, o compromisso e o crescimento acontecem.

 

Outros desafios na definição dos objectivos 
Para além da falta de propósito, da ausência de espaço para a criatividade e da falta de uma narrativa clara, detecto outros desafios comuns que impactam a qualidade da definição de objectivos, entre eles:

Falta de co-criação;

Falta de acompanhamento no progresso ao longo do ano;

Número excessivo de objectivos;

Objectivos demasiado ambiciosos e pouco realistas;

Falta de mensurabilidade;

Falta de controlo pelo colaborador sobre o atingimento;

Vieses humanos na definição;

Influência de sistemas de recompensa;

Escala de avaliação mal compreendida.

 

Estes desafios mostram quão exigente, mas também quão importante é esta responsabilidade. Quando bem pensados, os objectivos tornam-se alavancas poderosas para o crescimento individual e colectivo, permitindo que a empresa avance de forma estratégica e sustentável.

 

Objectivos como catalizadores
Para que os objectivos sejam catalisadores, os líderes devem questionar-se:

Como é que este objectivo se conecta à visão da empresa?

De que forma impulsiona o crescimento do colaborador?

Que impacto terá nos resultados da organização?

 

Segundo a Harvard Business Review, organizações que alinham objectivos individuais à estratégia empresarial alcançam maior foco, produtividade e sucesso sustentável em longo prazo. Mais ainda, os colaboradores que conseguem conectar os seus objectivos aos da organização têm 3,5 vezes mais probabilidade de estarem comprometidos. Um estudo da Gallup confirma que uma conexão clara entre o cargo e o propósito da empresa pode levar a uma redução de turnover de 32% e a um crescimento de produtividade em 15%.

 

De matas a movimento
Definir objectivos alinhados com o propósito não deve ser um evento isolado, mas um processo. É essencial realizar pontos de check-in ao longo do ano, avaliando não só o progresso, mas também a contínua relevância do objectivo. Mais ainda, este acompanhamento permite ao colaborador clarificar e manter o foco nas prioridades – afinal, objectivos que reflectem as necessidades estratégicas da empresa devem estar no centro das suas prioridades.

Neste cenário, as avaliações anuais representam um momento-chave para reflectir e redefinir o rumo. Elas oferecem a oportunidade de questionar: estamos a definir objectivos que realmente contribuem para o propósito da empresa e impulsionam o desenvolvimento das pessoas, ou estamos apenas a cumprir um requisito do sistema de avaliação?

O verdadeiro sucesso surge quando objectivos inspiram acção, promovem o crescimento e criam um impacto significativo. Muitas vezes, o valor de um objectivo reside mais no movimento que cria do que no seu cumprimento exacto. Um objectivo que não é alcançado na sua totalidade, mas que move a pessoa na direcção certa, tem um impacto muito maior do que um objectivo atingido que não gera progresso. Chegou a hora de tornar os objectivos o coração da transformação organizacional que queremos alcançar.

 

Este Especial Propósito foi publicado na edição de Fevereiro (nº. 170) da Human Resources.

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