Dos salários às competências, passando pelo emprego e educação. Conheça os números do Estado da Nação

Já são conhecidas as principais conclusões do relatório da Fundação José Neves sobre “O Estado da Nação: Educação, Emprego e Competências em Portugal”. O relatório foca-se no impacto positivo da educação no emprego e nos salários após a pandemia COVID-19 e destaca o importante contributo do Ensino Profissional para a transição digital.

Aborda ainda o impacto da digitalização e da Inteligência Artificial na composição do trabalho, equacionando o aparecimento de um novo mercado de trabalho português.

O relatório “Estado da Nação: Educação, Emprego e Competências em Portugal” é o documento anual da Fundação José Neves com o objectivo de promover a discussão pública das debilidades e oportunidades da educação e do sistema de desenvolvimento de competências, de forma a permitir aos portugueses e aos agentes da educação, nomeadamente o Governo e as instituições de ensino, tomarem decisões com base em factos.

Algumas das principais conclusões da edição de 2024:

Trabalhadores com o Ensino Superior beneficiam de vantagem salarial significativa relativamente aos trabalhadores com o Secundário
Os trabalhadores mais qualificados são os que beneficiam de maiores retornos salariais. O ganho adicional de ter o Ensino Superior face ao Ensino Secundário foi, para a população entre os 18 e os 64 anos, de 49% em 2023. Não obstante, este valor tem vindo a cair na última década, sendo que em 2011 era de 71%.

No caso da população mais jovem, entre os 25 e os 34 anos, a vantagem salarial do Ensino Superior face ao Ensino Secundário foi de 34% em 2023.

Face aos anos anteriores, verifica-se uma recuperação da vantagem salarial do Ensino Superior, depois do decréscimo verificado de 2021 para 2022, de 37% para 27%.

 

A vulnerabilidade à Inteligência Artificial (IA) enquanto substituto ou complemento do trabalho
O impacto da IA no mercado de trabalho é complexo, multifacetado e implica novos desafios, mas também oportunidades. A exposição à IA remete para a probabilidade das actividades que os trabalhadores realiza poderem ser substituídas (vulnerabilidade elevada) ou complementadas pela IA (vulnerabilidade baixa).

Em Portugal, as mulheres e os trabalhadores com níveis de educação mais elevado são os grupos em que a IA poderá ter um impacto maior. Em ambos os casos, a percentagem de trabalhadores que apresentam uma exposição elevada à IA e cujas tarefas podem ser substituídas pela IA é superior.

No caso das mulheres, 15,1% estão em profissões de vulnerabilidade elevada e 5,9% em profissões com vulnerabilidade baixa. Para os homens, estes valores são de 9,4% e de 6,5%, respectivamente. Em termos etários, o grupo com maior vulnerabilidade elevada está na faixa dos 25 aos 34 anos, onde a onde a percentagem de trabalhadores nessa categoria é de 14,7%.

A análise da vulnerabilidade por nível de remuneração mostra que são os trabalhadores com salários acima dos dois mil euros quem poderá estar mais vulnerável aos desafios trazidas pela IA. Neste grupo, 24,3% têm exposição elevada à IA, e a sua utilização pode aumentar significativamente a sua produtividade (vulnerabilidade baixa), mas 26,3% estão em profissões de vulnerabilidade elevada, em que poderão ver as suas tarefas substituídas pela IA.

Uma análise sectorial demonstra que são os trabalhadores no sector das Actividades financeiras e de seguros, das Actividades de informação e de comunicação e das Actividades de consultoria, científicas, técnicas e similares que apresentam maior vulnerabilidade.

Já no sector da Educação, a IA apresenta-se com o índice de complementaridade mais elevado, com 25,7% do emprego na categoria de “Vulnerabilidade baixa”.

51% dos dirigentes e gestores pertencem ao grupo de elevada exposição e complementaridade à IA (vulnerabilidade baixa), com as ferramentas da IA a potenciarem o seu desempenho profissional. No mesmo sentido, estão os profissionais das actividades intelectuais e científicas, onde 29% pertencem ao grupo mais exposto à IA, mas também mais complementar. Porém, neste último grupo profissional, 30% estão em profissões de elevada vulnerabilidade, em que poderão ver as suas tarefas substituídas pela IA.

No sentido inverso, os trabalhadores dos grupos profissionais “Pessoal administrativo” (36%) e “Técnicos e profissões de nível intermédio” (30%) são aqueles para quem a IA potencialmente tornará o seu emprego mais vulnerável, mais passível de ser substituído.

 

As empresas com maior digitalização têm mais produtividade e pagam melhores salários
Em 2023, a maioria das empresas apresentava um nível baixo ou médio de digitalização, sendo que é no sector das actividades de informação e de comunicação (58,5%) que se regista uma maior percentagem de empresas com nível elevado de digitalização, seguido do sector da energia e gestão de resíduos (58%).

A digitalização das empresas deu um salto considerável nos últimos anos, sobretudo entre 2019 e 2020, em que a percentagem de empresas com nível baixo caiu 11%, com os níveis médio e elevado a aumentarem 7% e 4%, respectivamente. No final de 2023, 39% de empresas tinham nível baixo, 34% nível médio e 27% nível elevado.

A dimensão das empresas é outro factor relevante para o índice de intensidade digital. Quanto maior a empresa, maior é o índice de digitalização. Este índice está igualmente associado a maior produtividade e a salários mais elevados. Entre os mais jovens, a intensidade digital do emprego mantém-se alta sobretudo entre os diplomados no Ensino Superior.

Ainda relacionado com a digitalização do emprego em Portugal, 11 em cada 100 trabalhadores portugueses trabalhava em casa de forma regular e com recurso a TIC no final de 2023. O teletrabalho passou a ser cada vez mais híbrido (aumentou 22% entre o 2º trimestre de 2022 e o 4º trimestre de 2023) e são sobretudo os mais jovens, em particular mestres e doutores, que mais deslocalizaram o trabalho para casa, especialmente nas áreas de Gestão (49,7%), do Ensino (61,9%) e das TIC (80,5%).

 

Em 2023 o mercado de trabalho recompôs-se e tornou-se mais qualificado devido à crescente intensidade digital das profissões
Entre 2019 e 2023, os níveis de emprego e de participação no mercado de trabalho português recuperaram a trajectória de crescimento anterior à pandemia. Em 2023 a população empregada estava nos 4,9 milhões, quando era de 4,8 milhões em 2019 e 4,6 milhões em 2020, em plena crise pandémica.

Neste período, o mercado de trabalho recompôs-se e tornou-se mais qualificado. Esta recomposição prende-se, em grande parte, com o crescimento do peso de sectores mais intensivos em conhecimento e tecnologia, com profissões qualificadas associadas à gestão e às TIC e associadas a tarefas mais administrativas, que ganharam peso no emprego nos últimos anos.

Entre 2019 e 2023, uma análise da evolução do volume total de emprego – medido pelo total de horas semanais habitualmente trabalhadas – demonstra que foi sobretudo o emprego desempenhado por trabalhadores com Ensino Superior completo que cresceu do ponto de vista relativo, 24% entre os mais jovens (18 aos 34 anos) e 16% entre os trabalhadores adultos (35 aos 69 anos).

Verifica-se ainda que as ofertas de emprego com requisitos de qualificações ao nível do mestrado assumem cada vez maior importância. Um crescimento que parece ter acelerado sobretudo a partir de 2022, já numa fase pós-pandemia (de 35,6% em Janeiro de 2022 para 38,5% em Dezembro de 2023).

 

Desemprego jovem voltou aos números pré-pandemia, em particular nos jovens com o Ensino Superior, mas segue acima do desemprego global
O ano de 2023 assistiu a uma recuperação dos níveis de desemprego jovem para valores mais próximos dos registados antes da pandemia, dando sinais de uma recuperação quase completa.

No final de 2023, a taxa de desemprego dos jovens entre os 25 e os 34 anos de idade era de cerca de 7,4%, em contraste com uma taxa de desemprego global de 6,6%.

Feitas as análises por qualificações, verifica-se que a taxa de desemprego dos diplomados do Ensino Superior foi de cerca de 5,3%, um valor bastante inferior aos 9% registado para os jovens da mesma idade sem esse nível de qualificações.

 

Cursos Técnicos Superiores Profissionais (CTeSP) têm cada vez mais inscritos e áreas ligadas à tecnologia e à digitalização são as mais procuradas
Desde o seu início, em 2014, o número de alunos inscritos em CTeSP (promovidos pelo Ensino Superior Público Politécnico) tem vindo a aumentar de forma exponencial, tendo passado de 395 em 2014/15 para 21.263 em 2022/23.

A escolha de cursos CTeSP é mais frequente entre os diplomados de cursos profissionais do Ensino Secundário. Entre os inscritos num curso CTeSP em 2021/22, cerca de 76% vinham de cursos profissionais e 22% de cursos científico-humanísticos. Os cursos ligados à tecnologia e à digitalização são os mais procurados pelos alunos dos CTeSP, sendo que em 2022/23 cerca de 33% (um em cada três) dos inscritos estavam concentrados nas cinco áreas de educação e formação disponibilizadas a nível nacional ao nível das tecnologias. Uma evidência da importância deste ensino para a transição digital do país.

Já no Ensino Secundário, um em cada três jovens inscritos frequenta um curso profissional, número que se tem mantido constante ao longo dos anos. Entre as tendências crescentes, 24% dos diplomados do Ensino Profissional no Secundário prosseguiu para o Ensino Superior em 2022. A taxa era de 15% em 2015. As duas áreas de educação e formação com mais elevada taxa de transição do Ensino Profissional para o Ensino Superior são as Ciências Informáticas (35%) e Electrónica e Automação (35%).

 

O relatório traça ainda metas para uma Sociedade do Conhecimento em 2040:
• Portugal nos 10 países da UE com mais emprego em tecnologia e conhecimento (em 2023 desceu da 16ª para a 17ª posição);
• Pelo menos 25% dos adultos devem participar em educação e formação ao longo da vida (em 2023 aumentou para os 13,4%);
• Máximo de 15% dos adultos (25 aos 64 anos) com baixa escolaridade (em 2023 desceu para os 40,6%);
• Pelo menos 60% dos jovens adultos com o ensino superior (em 2023 desceu para 40,9%);
• Pelo menos 90% dos jovens recém-formados empregados (em 2023 aumentou para os 78,8%).

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