A inteligência instintiva e a sua exploração
O domínio da inteligência instintiva é vital para a gestão de diversos recursos próprios, incluindo a gestão de emoções e de relações com outras pessoas. Nesta perspectiva, é também de grande utilidade para quem lidera pessoas.
Carlos Carreira, (ccarreira@exodusconsultores.com), gestor de empresas, coacher, formador, investigador e autor do livro “Para Lá dos Teus Limites”
Embora nem sempre tenhamos consciência disso, os instintos são responsáveis por várias competências básicas do funcionamento do ser humano, nomeadamente as competências de “ler o ar”, de “ler os outros”, de “prever o futuro” e de “preparar respostas”, físicas e mentais, aos vários desafios que percepcionamos, nos surgem e vamos experimentando.
Muitas destas competências, tendemos a designá-las genericamente por intuição, mas são muito mais do que isso, são respostas precisas e inteligentes a problemas de evolução e de sobrevivência específicos.
Por exemplo, em contacto com outros seres humanos, os nossos instintos ajudam-nos a responder, quase instantaneamente, a questões como:
– tem intenções amigáveis? É empático? Pode ameaçar-me?
– que interesses tem na relação comigo? É confiável? Posso contar com ele?
– tem comportamentos próximos dos meus ou diferentes?
– tende a ser dominador, neutro ou submisso?
– é saudável ou doente? Corro riscos de contágio de doenças?
– poder ser um bom parceiro sexual?
Por esta razão, os nossos rostos são excelentes telas de comunicação, que lemos com grande mestria, em termos instintivos. Neles lemos as personalidades dos outros e expressamos a nossa, assim como as respectivas emoções e intenções.
Nas emoções instintivas mais básicas, podemos identificar o medo e a “necessidade de afirmação pessoal”, que facilmente induzem a “activação de resposta para situações de pico”, muitas vezes designada negativamente por “ansiedade”.
Trata-se de duas emoções instintivas de grande força e potencial positivo, para a obtenção de resultados excepcionais. Desde que as saibamos gerir de forma adequada, naturalmente.
A natureza de força, de determinação e de imposição dos instintos, até contra a “vontade própria”, é a sua principal característica. Estão sempre “activos”, mais ou menos, consoante o seu grau de satisfação. Não exigem qualquer esforço de motivação ou de mobilização, apenas situações e oportunidades que favoreçam a sua manifestação.
Os instintos são comportamentos geneticamente programados, dirigidos para determinados objectivos, como sejam os da uma mera vivência bem sucedida (são exemplo os associados a uma alimentação saudável), de afirmação (por esta razão o ser humano tem instintos de competição muito fortes), de reprodução e de sobrevivência.
Os instintos resultam de interpretações inteligentes de vivências de milhões de anos, que só muito por acaso seriam exactamente iguais às que vivemos hoje, daí algumas visíveis descoordenações – como o caso da selecção de comida saudável -, mas no geral são claramente uma mais valia e constituem um potencial de exploração notável.
Os instintos intervêm em várias outras competências mais comuns, como a atenção, a vontade própria, a aprendizagem, a memória e até a própria inteligência, que são determinantes nas capacidades de adaptação ao meio, de afirmação e de sobrevivência.
Por exemplo, os instintos intervêm na memorização por repetição e pelo extraordinário, entre outras. O que se repete, e constitui assim padrões instintivos de referência, estimula o desenvolvimento de capacidades de resposta. Estas poderão ser de natureza muscular, neuronal ou genético, com passagem de informação aos descendentes.
A inteligência instintiva pressupõe a consciência e o conhecimento dos principais instintos humanos, das suas manifestações e da lógica do seu funcionamento, bem como o domínio de práticas que permitam a sua gestão e a obtenção dos resultados pretendidos.
Dois exemplos operacionais, simples, são a criação de ambientes de:
– competição, fazendo apelo aos instintos de afirmação pessoal – poderá ser em relação a si próprio e/ou relativamente a outros;
-reconhecimento social, fazendo apelo aos instintos de integração social.
Claro que, dada a força destes instintos, podem facilmente surgir conflitos, pelo que importa clarificar e fiscalizar de forma adequada a aplicação das regras. Convém ter em mente que a lógica da selecção natural está sempre subjacente à actuação dos instintos.
O domínio da inteligência instintiva é assim vital para a gestão de diversos recursos próprios, incluindo a gestão de emoções e de relações com outras pessoas. Nesta perspectiva, é também de grande utilidade para quem lidera pessoas, presta serviços, trabalha em equipa e desenvolve actividades de natureza comercial.
Fique-se, contudo, com a noção de que se trata de um mundo tão vasto quanto próximo do essencial da natureza humana, muito longe do primarismo animal e pouco inteligente, que tradicionalmente lhe é atribuído, e que não só é passível de gestão como é recomendável, sobretudo tendo em consideração as exigências de contexto actuais.
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