Gerir o inesperado

É possível que nos últimos tempos tenha reparado em alguns “cisnes negros” que esvoaçam perto de si.

Este é o termo utilizado pelo filósofo Nassim Nicholas Taleb para acontecimentos relevantes inesperados, para os quais ninguém nos preparou. Em retrospectiva, torna-se óbvio porque tiveram lugar, ou pelos menos assim seria se fossem previsíveis.

Os “cisnes negros” encontram-se em expansão: o tsunami japonês, a revolta no Egipto, os problemas com a plataforma petrolífera da BP Deepwater Horizon. Cada um teve implicações económicas profundas. Talvez alguns tenham previsto os riscos, mas a maior parte das pessoas não fazia ideia do que iria acontecer.

Existirá alguma forma de desenvolver radares mais potentes, capazes de localizar os “cisnes negros”, e de nos ajudar a preparar para a sua chegada? Um grupo de 15 especialistas em gestão do conhecimento reuniram-se, num debate com vista a compreender como poderemos controlar melhor as interligações que se encontram no centro deste desafio.

Pesquisa avançada: aprender por antecipação

Aprender por antecipação em vez de aprender com base na experiência requer competências distintas naquilo a que o especialista em capital intelectual (CI) Leif Edvinsson chama «pesquisa avançada». Trata-se da capacidade de focalizar sistematicamente o futuro. É o oposto da investigação, que olha o passado para obter sentido do que já aconteceu. Existem seis práticas interligadas que contribuem para a aquisição de competências de pesquisa avançada.

1. Descubra o valor oculto do “in”

Reconhecer aquilo que é novo requer muita atenção. Trata-se de transferir o foco de atenção do que é familiar para factores e pessoas habitualmente ignoradas. Envolver o que habitualmente é deixado de fora, trazer à superfície questões nunca colocadas, desafiar pressupostos inquestionáveis, aprender a gostar do desconfortável, focalizar-se totalmente no que não é familiar. Tudo isto aumenta as nossas hipóteses de detectar os sintomas da nova onda de mudança disruptiva.

Considere-se a rever as metáforas organizacionais: elas detêm uma profunda influência subconsciente sobre nós. Estão recheadas de pressupostos sobre o que funciona ou não. Ouça cuidadosamente a forma como são utilizadas, avalie as suas limitações e adequação, considere em que medida alternativas poderiam mudar as perspectivas sobre os temas.

Deixe-se envolver em cafés de conhecimento, diálogos socráticos e utilize tecnologias em open space para captar a atenção de vários tipos de pessoas. Utilize as redes sociais para trazer diversidade aos processos de tomada de decisões, detectar necessidades não reconhecidas e responder com rapidez aos turbilhões de opiniões externas.

2. Coloque questões poderosas

A liderança deve criar um clima em que as questões difíceis e os desafios ao status quo sejam aceites como parte integrante do desenvolvimento organizacional, e não fenómenos ligados à culpa e ao medo.

A honestidade pode ser uma coisa dolorosa, mas um moderador pode gerir as regras de base das conversas e encorajar as pessoas a abandonar pressupostos obsoletos.

Edvinsson defende a utilização de «quizzics» – um diálogo em que os participantes investem um período considerável de tempo a responder a uma pergunta com outra, considerando as soluções apenas quando as questões são profundas e desafiantes. As “improvisações de liderança” estão também a tornar-se espaços legítimos de colocação das grandes questões, porque beneficiam da diversidade de perspectivas e desenvolvem a propriedade das tendências emergentes.

As rotinas institucionalizadas que originam questões críticas são importantes. Tal como o reconhecimento de que as questões poderosas podem gerar respostas fortes: uma acesa troca de impressões pode ser encarada por alguns como um ataque. Mesmo que tenhamos gerado questões catalisadoras, estas devem ser apresentadas de forma a que as pessoas as consigam absorver.

O humor é um caminho adequado para apresentar mensagens controversas de uma forma agradável. A arte e a poesia são outras formas, também, eficazes, de estimular as pessoas a pensar o impensável e apresentar visões alternativas da realidade.

Sintetizar as contribuições de muitos stakeholders de dentro e de for a da organização torna o desafio mais apetecível.

O consultor de gestão do conhecimento Dave Snowden capta micro- narrativas que se auto-rotulam: milhares de pequenas histórias que podem ser utilizadas para detectar ligações e tendências em profundidade. Isto permite clarificar subcorrentes, evitar parcialidade na interpretação e fornece provas sólidas para forjar novos raciocínios.

3. Torne sua base de conhecimentos redundante

A melhoria contínua é um processo muito importante mas pode, por vezes impedir-nos de divisar novas possibilidades. Chris Collison conta a história de um cirurgião cardiovascular no hospital pediátrico da Great Ormond Street, Londres, Reino Unido. A melhoria exaustiva não era suficiente para reduzir o risco de transferência dos pacientes do suporte básico de vida para os cuidados intensivos. Após um longo dia de trabalho, o cirurgião estava a ver uma prova de Fórmula 1 na televisão. E de repente, fez a ligação entre as transferências e as paragens para abastecimento eficientes que os bólides faziam. Convidou a Ferrari a partilhar o seu método, o que levou a um aumento nas taxas de sobrevivência. Por vezes, a base de conhecimentos que detemos tem limitações de raiz. Olhar para lá dos estreitos limites do conhecimento especializado que detemos pode ser uma fonte de inspiração.

As pessoas focalizam-se mais na melhoria que na inovação. O talento criativo é especialmente seleccionado e desenvolvido, as estruturas formais separam a inovação dos negócios correntes. Isto pode prejudicar a agilidade das organizações. A investigação do especialista em capital intelectual, Daan Andriessen, sublinha a medida em que as metáforas criam ligações relevantes. O Jazz é uma metáfora para a inovação: músicos experientes improvisam tocando com base no seu conhecimento para criar algo novo, em conjunto. Inovam enquanto tocam.

4. Experimente e improvise

A improvisação advém da ignorância face ao futuro, mais do que da falta de especialização. A velocidade advém de tentar diferentes alternativas. Pequenas inovações podem, com a sua descoberta, melhorar a agilidade e originar a mudança.

Promover a confiança na experimentação. Agindo, em vez de planear, influenciamos as condicionantes. As tecnologias sociais podem catalisar a improvisação. Ajudam as pessoas a encontrar soluções diferentes. A investigação mostra que estamos programados para pensar sobre o futuro – mas necessitamos de ter a oportunidade para o fazer. Não tente condicionar demasiado cedo a direcção em que segue uma conversa ou uma acção.

Quando as pessoas dispõem de tempo para improvisar e descobrir soluções por si próprias, as possibilidades são muitas.

5. Envolva-se em “centros do futuro”

«O futuro fica a 14 segundos de distância », afirma Edvinsson, mas muitas vezes as nossas empresas são dominadas por “controladores” e não por “navegadores” equipados para uma navegação ágil. Ter um espaço onde seja possível explorar o futuro pode encorajar a navegar mais e melhor.

Um “centro do futuro” reúne pessoas do interior e de fora da organização, proporcionando-lhes tempo e espaço para ter ideias. Em 1996, Edvinsson criou um primeiro centro do género, na empresa de serviços financeiros Skandia. Há mais de 30 centros em todo o Mundo, incluindo o Ericsson’s Foresight Centre, a ABN Amro’s Dialogue House e o Fuji Xerox’s Future Centre. O Mindlab na Dinamarca serve as necessidades de conhecimento dos Ministérios da Economia e Finanças, e Emprego. O LEF nos Países Baixos foi criado para enfrentar os desafios da geografia daquele país.

A maior parte dos “centros de futuro” trabalham em diferentes áreas, cada um com o seu ambiente e estímulos mentais: centros de conhecimento para acesso a informação; na área de conversação; obras de arte para estimular a reflexão; laboratório para experiências; ou espaços para apoiar a implementação de ideias.

6. Auto-organizados e “com espírito de liderança”

O professor de gestão de conhecimento Karl-Erik Sveiby considera que as sociedades sustentáveis possuem uma visão não hierarquizada da liderança. O poder advém da sabedoria e não do cargo que se ocupa. A hierarquia limita o acesso ao conhecimento actualizado e a necessidade de rapidez produz decisões baseadas num conhecimento superficial. As pessoas descomprometidas em relação aos resultados preocupam-se menos com as implicações das suas decisões.

Nas organizações sustentáveis, os líderes emergem de acordo com as necessidades da situação. A liderança partilhada pode ser mais sensível face a condições adversas mas as decisões sobre a necessidade de sustentabilidade tomam em linha de conta o cenário geral e vincam o impacto que têm na ecologia geral em que têm lugar. Sveiby diz que estas organizações são dotadas de «espírito de liderança». São raras, mas existem. Na Finext, uma consultora financeira holandesa, não existem gestores seniores. Em alternativa, a empresa possui uma liderança rotativa, em que o líder age como facilitador, tomando atenção às dinâmicas de grupo. As reuniões de partilha de conhecimento são um aspecto essencial da Finext e as decisões são tomadas com cautela a todos os níveis. O resultado é uma organização próspera há mais de uma década sem um corpo decisor central.

Desenvolver líderes suficientemente confiantes para colocar questões poderosas, capazes de explorar a pesquisa do “in” ao nível da redundância no conhecimento corrente, requer um apoio sólido à prática reflexiva. O coaching pode ajudar a desenvolver decisores que possam ancorar a inteligência colectiva, reconhecer preconceitos e pressupostos, atrever-se a dizer o indizível e articular soluções que transcendam a atenção entre os valores de longo-prazo e as pressões de curto-prazo.

A confusão que reina nas organizações potencia o risco de surgirem “cisnes negros”. O ajuste das antenas das organizações é fundamental para desenvolver a competência organizacional do discernimento

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