À procura do tesouro escondido: como identificar um grande líder?
Sabe identificar os traços que realmente indicam uma grande liderança?
Até as organizações com um longo historial de apoio a talentos excepcionais podem começar a questionar a sua capacidade de identificar da forma mais correcta os possíveis líderes. Porquê? Porque o mundo empresarial de rápida mudança expôs as imperfeições dos modelos que existem para avaliar o potencial. O desempenho tido no passado e as capacidades actuais não oferecem qualquer garantia de que um indivíduo terá sucesso num cargo profissional totalmente diferente e em ambientes de mudanças muito rápidas.
Agora, contudo, um novo modelo de potencial, englobando os quatro traços pessoais que prevêem uma grande liderança, está a dar a certeza, o rigor e a disciplina que as empresas precisam para descobrirem a verdadeira promessa dos recursos humanos e geri-la de forma a obter uma vantagem competitiva. Os erros espectaculares em relação ao potencial são lendários: um professor de Munique previu em 1895 que Albert Einstein «nunca iria a lado nenhum».
O editor de um jornal do Kansas despediu o jovem cartoonista Walt Disney porque este tinha «falta de imaginação». Quando Indira Gandhi se tornou primeira-ministra da Índia pela primeira vez, um rival político descreveu-a como nada mais do que uma “gungi gudiya” – uma boneca muda. É um fenómeno conhecido no mundo dos negócios. Há seis anos, por exemplo, uma grande empresa quis despediruma executiva média que acreditavam ter pouco futuro no negócio. Mas uma avaliação ao talento determinou que possuía mais potencial do que qualquer outro executivo do seu nível, como aconteceu numa avaliação subsequente três anos mais tarde.
Actualmente é CEO da empresa. Muitas vezes, claro, os erros acontecem ao contrário – um CEO novo, considerado salvador da empresa por parte da administração, acaba por serevelar um fracasso; um executivo jovem com muito potencial vai ao fundo na sua primeira missão a sério; um executivo médio promissor salta para o grupo de executivos seniores e dura menos de um ano. De facto, nos últimos anos, vimos clientes, muitos dos quais com um longo historial de desenvolvimento de talento excepcional, a começar a questionar a sua capacidade de identificar correctamente potenciais líderes, principalmente ao nível dos vice-presidentes seniores e no grupo dos executivos de topo. E continuamos a ver muitos exemplos de executivos cujo potencial não está a ser totalmente aproveitado nos seus cargos actuais.
Por que razão é que o potencial falha?
A maioria dos modelos e das organizações falha porque confundem o talento com o desempenho de um indivíduo ou com as suas capacidades actuais. A trajectória profissional de um executivo – a forma que ganha ao longo de uma carreira – consiste em três elementos: desempenho passado, capacidades actuais e potencial para o futuro. Estes três elementos são importantes numa avaliação abrangente de um executivo, mas devem manter-se separados. O potencial não se limita apenas àquilo que os indivíduos fizeram ou à sua predisposição actual para uma promoção. Envolve capacidade e rapidez: o ponto ou a rapidez com que conseguem desenvolver competências para executivos seniores coestende-se aos papéis de liderança que são maiores em tamanho e complexidade.O potencial que não pode ser avaliado com precisão não pode ser gerido, fazendo com que a organização enfrente problemas de desempenho recorrentes e aparentemente inexplicáveis por parte de alguns indivíduos, a saída de talentos pouco reconhecidos e o enfraquecimento progressivo da capacidade da empresa para competir com sucesso.
O custo em termos humanos também é alto – as experiências mostram que uma percentagem assustadoramente alta de executivos descarrila em certas alturas das suas carreiras, muitas vezes sem necessidade.
Um futuro menos clemente
Os custos, económicos e humanos, serão ainda mais altos, à medida que o desempenho do passado e predisposição actual se tornam cada vez menos previsíveis do desempenho futuro de indivíduos e empresas. Os mercados, os ambientes competitivos e os modelos de negócio estão a mudar em ciclos cada vez mais curtos. Por exemplo, os mercados emergentes, muitos dos quais são pouco compreendidos pela maioria das empresas, têm um papel mais importante do que nunca nos planos de crescimento empresarial.
Entretanto, os ambientes competitivos actuais exigem que os executivos compreendam uma vasta gama de novas disciplinas, incluindo sustentabilidade, digital, redes sociais, “big data” e diversidade global. Em relação aos modelos de negócio, o editor sénior da revista Fortune, Geoff Colvin, escreve: «O vosso modelo de negócio já não funciona. Essa afirmação franca não está muito longe da verdade. Mesmo que o modelo tenha funcionado durante décadas, mesmo que funcione bem agora, o mais provável é que em breve deixe de funcionar.» Neste futuro que se aproxima rapidamente, as empresas terão de depender mais do que nunca do potencial certo. Precisarão de líderes que conseguem preencher cargos imprevistos, adaptar-se a novas estruturas organizacionais e trabalhar em ambientes de mudanças bruscas. E precisarão desses líderes mais do que nunca. Como Gary Hamel, que foi classificado pelo Wall Street Journal como um dos teóricos empresariais mais influentes do mundo, afirmou à McKinsey & Company numa entrevista: «Creio que o dilema é que por muito que as empresas se tenham tornado complexas, por muito rápido que o ambiente mude, simplesmente não existem líderes extraordinários suficientes.»
Para se construírem organizações mais adaptáveis, revela, temos de «distribuir o trabalho da liderança de uma forma mais vasta» dentro da organização. Aumentar o círculo da liderança dessa forma exigirá que as empresas identifiquem possíveis líderes antecipadamente, que os desenvolvam mais depressa e que lhes dêem poder antes – ou arriscam-se a uma incapacidade fatal de se adaptarem aos problemas empresariais que o futuro lhes reservará com uma regularidade cada vez maior.
Uma nova noção de potencial
Para desenvolver um modelo de potencial válido, distinto e prático, uma equipa da Egon Zehnder analisou a nossa enorme experiência em avaliação de gestores – incluindo mais de 500 feitas a CEO de todo o mundo. Também analisou as trajectórias profissionais de mais de mil executivos seniores e de 2500 executivos não-seniores avaliados pela empresa, e validou o modelo com CEO, membros de administrações de grandes empresa e peritos académicos.
A estrutura criada consiste em quatro traços, que, quando adequadamente avaliados, prevêem o desenvolvimento da capacidade executiva e a rapidez desse desenvolvimento:
Curiosidade: Os indivíduos muito curiosos procuram de forma pró-activa novas experiências, ideias e conhecimentos. Pedem opiniões e estão abertos à aprendizagem e à mudança. Não é meramente curiosidade inútil: recebem energia ao refrescarem-se constantemente ao nível intelectual, das experiências e pessoal;
Discernimento: As pessoas que demonstram um grande discernimento conseguem reunir e compreender uma vasta gama de informações, transformar ideias passadas (incluindo as suas) e definir novas direcções.
Alternam sem esforço entre o nível conceptual e a análise inteligente a dados granulares. Isso significa que têm mais probabilidade de descobrir novas ideias e de as aplicar de forma altamente produtiva;
Envolvimento: Os indivíduos que têm uma boa classificação no envolvimento sabem como se relacionar a nível emocional e lógico com os outros. Conseguem comunicar uma visão persuasiva e ajudar os outros a sentirem-se mais ligados à sua organização e ao seu líder. Procuram auto-consciência, demonstram empatia e conseguem inspirar compromisso;
Determinação: Este traço envolve uma combinação de atributos: a coragem e a disponibilidade de correr riscos inteligentes, a persistência perante adversidades e a capacidade de recuperar de imprevistos ou adversidades.
Os indivíduos profundamente determinados também continuam à procura de provas em contrário e mudam de direcção se for necessário. Os traços prevêem que tipo de comportamento os indivíduos demonstrarão no futuro – ou seja, as competências que as pessoas manifestarão em cargos, organizações e culturas em particular. O grau em que cada um possui esses traços também prevê a magnitude das competências que irá desenvolver. Claro que uma pessoa pode ter os traços e ainda não ter demonstrado as competências. Mas ter os traços cria uma forte probabilidade de demonstrar as competências nos níveis mais altos de liderança. Descobrimos que, destes quatro traços, a curiosidade é o maior diferenciador de potencial. Aquele estudante alemão que não iria ser nada na vida deveu o seu sucesso à curiosidade. O grau de curiosidade determina a velocidade com que um indivíduo irá exibir o comportamento associado aos outros três traços e prevê a variação no desempenho profissional que daí resultará.
A curiosidade é também o traço que tem mais probabilidades de ser ignorado ou subvalorizado na maioria dos modelos de potencial, o que pode indicar a razão por que tantos modelos são incapazes de prever o potencial acertadamente. À medida que as mudanças imprevistas e profundas no ambiente de negócios atiram cada vez mais os líderes para cargos com curvas de aprendizagem muito íngremes, a subvalorização da curiosidade terá consequências progressivamente mais graves. Outros investigadores, como Patrick Mussel, chegaram a conclusões semelhantes. No artigo “Introduzir a curiosidade como forma de prever o desempenho profissional”, escreve no The Journal of Organizational Behavior: «A curiosidade é uma variável importante para a previsão e explicação do comportamento profissional. Além disso, tendo em conta as mudanças no mundo do trabalho, a importância da mesma deve aumentar, e não diminuir, o que tem implicações importantes para as teorias organizacionais e para os objectivos aplicados, como a selecção de pessoal.»
Pôr o potencial a trabalhar
Com uma definição clara e distinta de potencial, um modelo com um poder de previsão real e um método provado para avaliar os seus elementos, as empresas podem ganhar novo rigor e disciplina numa vasta gama de actividades importantes para a gestão de talento:
– Avaliar objectivamente o potencial.
Ao avaliarem o potencial em termos de traços – na verdade, como a pessoa se comporta naturalmente – as organizações podem ultrapassar os seuspreconceitos inconscientes que impedem quase todos de interpretarem com precisão o comportamento, carácter e motivos das pessoas diferentes de si;
– Compreender antecipadamente o poder dos colaboradores.
Aproveitar o seu potencial logo de início permite às empresas desenvolvê-lo totalmente. Adicionalmente, apesar de alguns traços poderem ser desenvolvidos ou aperfeiçoados, é preciso tempo, esforço e um plano personalizado para subir na cadeia, mesmo que pouco, por isso quanto mais cedo for feita a avaliação, melhor. As primeiras análises ao potencial são possíveis porque os traços mais profundos são visíveis mesmo na juventude. Em 1922, Yuzo Sakakibara, proprietário de uma loja de reparações automóveis de Tóquio, aceitou um aprendiz de 15 anos que se havia inspirado no seu amor pelos automóveis para obter o emprego. Sakakibara viu que o rapaz era trabalhador e tinha uma capacidade extraordinária de absorver e aplicar rapidamente conhecimentos técnicos, embora possuísse educação apenas ao nível do ensino básico. Por isso Sakakibara colocou-o sob a sua protecção e apoiou o seu talento. Esse rapaz era Soichiro Honda, que mais tarde criou a empresa global com o seu nome;
– Reduzir o risco organizacional na sucessão, nas promoções e nas contratações.
Ao assegurarem que o potencial é uma parte integral da avaliação de talento em toda a organização – em contratações externas, em promoções internas, no planeamento da sucessão a todos os níveis – as empresas podem evitar erros que podem resultar em tudo, de inconsistências no desempenho ao desmoronar total. Quanto mais alto o cargo, maior o risco para a organização – a começar no CEO. Nos EUA e no Reino Unido, cerca de 70% dos CEO recém-empossados chegaram a esse cargo pela primeira vez. Tendo em conta o que está em jogo na escolha do CEO, as administrações precisam de uma forma fiável de prever o sucesso futuro num cargo onde um possível sucesso não tem experiência anterior;
– Criar carreiras profissionais apropriadas.
Os clientes muitas vezes perguntam-nos se um indivíduo tem potencial, mas raramente perguntam para que é que tem talento. Ao desenvolverem pessoas à luz dos traços que indicam sucesso em cargos de liderança, as empresas podem chegar ao seu potencial real, aproveitando totalmente os seus pontos fortes naturais e compensando efectivamente os seus pontos fracos. Também ganham uma ideia mais clara do tipo de cargos nos quais irão provavelmente prosperar, evitando as falhas entre indivíduos e cargos que resultam numa produtividade mais baixa, pouca motivação e ineficácia para o indivíduo e a organização;
– Abordar as causas dos problemas de desempenho.
Se um líder está a ter um mau desempenho numa competência exigida para um cargo – ou se o cargo muda de forma imprevisível, exigindo uma competência que falta ao líder – a organização pode encontrar a causa do problema ao relacioná-la a um traço que talvez falte ao líder. Por exemplo, uma empresa B2B cujos produtos estão em perigo de se tornarem banais decide seguir uma estratégia de margens mais altas, juntando produtos a serviços de consultoria e criando relações a longo prazo com o cliente. Mas a equipa comercial, liderada por um director comercial que há muito está no cargo, continua a vender volumes altos de produtos com margens baixas e não consegue desenvolver uma relação com os clientes. Uma análise à avaliação do potencial do director comercial revela que, entre os quatro traços da liderança, o envolvimento é o mais fraco. Como resultado, não consegue comunicar com persuasão a nova visão da empresa ao seu pessoal. Depois de descobrir a causa do problema, a empresa pode intervir – através de coaching, de um novo cargo ou de outra solução apropriada, dependendo da dimensão da lacuna;
– Aproveitar ao máximo os programas de grande potencial.
A identificação antecipada e correcta de executivos com potencial faz com que a organização invista em pessoas promissoras desde o início, acelere o seu desenvolvimento e colha os benefícios nos escalões mais altos da gestão;
– Maximizar o retorno do capital humano.
Quer as empresas estejam a ajudar as pessoas a atingir todo o seu potencial nos cargos actuais, a aproveitar os seus recursos quando surgem novos desafios ou a prepará- -las para cargos mais altos, uma boa noção de potencial pode salvar recursos mal alocados no desenvolvimento de actividades que não produzem resultados e ajuda a criar um maior retorno das actividades que o fazem;
– Personalizar a retenção.
No que toca à retenção, não existe um tamanho único. Ao desenvolverem e recompensaremas pessoas sincronizadamente com a sua capacidade de preencher cargos de liderança que são maior em tamanho e complexidade, e com a velocidade a que o fazem, as empresas aumentam a probabilidade de fazer com que as pessoas sintam que o seu trabalho vale a pena e com que permaneçam na organização. No Japão, os “sistemas de promoção com base nos anos de trabalho” estão agora a dar lugar ao desenvolvimento ligado ao potencial. Com a ideia de um trabalho para a vida a perder força, os executivos mais promissores em empresas tradicionais sentem-se menos relutantes em sair e muitas dessas empresas compreendem agora que manter as pessoas num cargo que já não lhes serve afasta as pessoas. Inversamente, ao ter em conta o potencial, as empresas podem ter a certeza de que não sobrecarregam as pessoas – dando-lhes tarefas que as fazem ir ao limite.
– O potencial não se resume à capacidade dos indivíduos, mas ao potencial das organizações.
Tal como acontece com as pessoas, as empresas possuem pontos fortes e fracos – áreas nas quais são excelentes e áreas onde são mais fracas. Ao avaliar com sucesso o potencial em toda a organização, esta pode criar estratégias de talento abrangentes para corrigir pontos fracos organizacionais, aproveitar melhor os pontos fortes, criar grupos de inovação e mudar de direcção para criar oportunidades.
Mais importante, as empresas podem ter a certeza de que têm um bom grupo de talentos com curiosidade, discernimento, envolvimento e determinação para enfrentarem o mundo comercial cada vez mais complexo que está agora a nascer, com os seus cargos e exigências imprevisíveis. O talento continuará a ser o maior diferenciador no mundo que se avizinha e as organizações que nele prosperarão fá-lo-ão porque possuem o potencial certo, neste preciso momento.