António Pinto, Happiness Camp: «A felicidade no trabalho não é um destino, mas sim uma viagem, e o papel das empresas é fundamental»

Por ocasião do Happiness Camp, a maior conferência de felicidade empresarial da Europa, que decorre amanhã no Porto, conversámos com António Pinto, Co-Founder & CEO Happiness Camp, sobre felicidade, como se contrói, quais os seus impactos na vida profissional e como podem as organizações contribuir para o seu desenvolvimento.  

Por Tânia Reis

 

Convicto de que as empresas estão cada vez mais atentas ao tema, para António Pinto, a felicidade é lucrativa para qualquer organização, já que tem impacto directo nos colaboradores – saúde, motivação, resiliência, espírito colaborativo, fidelização, inovação -; indirecto a nível externo – atracção de talento, reputação; e consequentemente na própria produtividade e sustentabilidade da organização.

 

Que importância assume, actualmente, a felicidade nas organizações?

A importância da felicidade nas organizações sofreu uma mudança significativa ao longo dos anos, sendo actualmente considerada um imperativo estratégico. É importante salientar que as empresas estão cada vez mais a reconhecer que a felicidade no local de trabalho vai além de simples regalias como comida grátis ou ténis de mesa. Há um entendimento crescente de que a verdadeira felicidade dos funcionários decorre de factores muito mais profundos e significativos.

Esta constatação conduziu ao que se pode designar como uma “recessão de regalias”, onde as empresas se afastam dos benefícios puramente superficiais e, em vez disso, investem em iniciativas que contribuem verdadeiramente para o sentimento de realização e satisfação profissional dos trabalhadores. Isto pode ser qualquer coisa, de oportunidades de crescimento pessoal e profissional a uma maior flexibilidade e equilíbrio entre a vida profissional e pessoal, ou à criação de uma cultura empresarial mais inclusiva e solidária.

Por exemplo, a Siemens Portugal, conhecida pelo seu enfoque no bem-estar dos colaboradores, foi além das regalias normais e implementou medidas para incentivar a aprendizagem contínua e o desenvolvimento da carreira, o que pode ser essencial para a satisfação no trabalho e, consequentemente, para a felicidade.

Estes exemplos sublinham que a felicidade é mais do que apenas prazer — tem a ver com o facto de os colaboradores sentirem um sentido de objectivo, realização e apoio no seu trabalho. Trata-se de criar um ambiente onde possam prosperar tanto pessoal como profissionalmente.

Além disso, a felicidade desempenha um papel fundamental no reforço da percepção da marca de uma empresa e em tempos de mudança organizacional. Os colaboradores felizes são frequentemente mais resilientes e adaptáveis, e apoiam as transformações necessárias. Também influencia o ecossistema empresarial mais alargado, melhorando as relações com os stakeholders e demonstrando um compromisso com valores centrados no ser humano, o que pode ser particularmente apelativo para consumidores e investidores socialmente conscientes.

Em suma, a felicidade nas organizações é multifacetada e tem uma importância alargada para além dos benefícios internos imediatos. É um elemento crítico com impacto na resiliência, nas relações com os stakeholders e na responsabilidade social, reforçando o seu papel como um pilar fundamental nas empresas modernas.

 

Considera que as empresas estão sensíveis ao tema e que faz parte das suas agendas?

Sem dúvida, acredito que as empresas estão cada vez mais abertas à ideia da felicidade no local de trabalho e a incluem nas suas agendas corporativas. Esta tendência é evidente não só globalmente, mas também no mercado português.

Por exemplo, a Vodafone Portugal tem dado passos notáveis nesta direcção. Desenvolveu várias iniciativas para promover um equilíbrio mais saudável entre a vida profissional e pessoal, como horários de trabalho flexíveis e a possibilidade de trabalhar remotamente. Também disponibiliza um programa de bem-estar que inclui instalações de fitness e avaliações médicas, entre outros benefícios (Expresso, 2022).

Outro grande exemplo é o Banco Santander Totta. Tem sido consistentemente reconhecido como um dos Melhores Lugares para Trabalhar em Portugal, e oferece aos seus colaboradores um programa de bem-estar abrangente, que inclui aconselhamento financeiro e de saúde, bem como apoio ao equilíbrio das responsabilidades pessoais e profissionais (Observador, 2023).

No entanto, embora estes exemplos sejam encorajadores, temos de reconhecer que o caminho para a adopção plena da felicidade no local de trabalho ainda está em curso. Muitas empresas, principalmente as mais pequenas, podem estar apenas a começar este caminho.

É aí que entra o Happiness Camp. O nosso objectivo é facilitar a empresas de todas as dimensões a compreensão e a implementação de estratégias para promover a felicidade dos trabalhadores. Ao oferecermos uma plataforma onde as melhores práticas são partilhadas, ajudamos as empresas a aprender com as experiências dos outros e a adaptar essas ideias ao seu próprio contexto.

No nosso próximo evento, a nossa missão é ajudar a impulsionar este movimento de felicidade e torná-lo acessível a todos, independentemente do seu orçamento. Porque acreditamos que um local de trabalho mais feliz não é apenas uma opção — é uma necessidade para o sucesso empresarial sustentável.

 

Que competências considera fundamentais para termos/sermos colaboradores felizes?

Essa é uma óptima pergunta. Acredito que ser um colaborador feliz não é necessariamente ter um conjunto específico de competências, mas sim cultivar algumas qualidades-chave e adoptar determinadas mentalidades. Contudo, se as traduzirmos em “competências”, eis algumas que me vêm à cabeça:

Adaptabilidade: No ambiente de trabalho actual, em constante mudança, é essencial ser adaptável. Esta competência pode ajudar os colaboradores a manterem uma perspectiva positiva mesmo quando as coisas estão a mudar, contribuindo para a felicidade geral.

Comunicação: Uma boa capacidade de comunicação é crucial. Conseguir expressar claramente os nossos pensamentos, sentimentos e ideias pode contribuir significativamente para a satisfação no trabalho e minimizar o stress desnecessário.

Autocuidado: Saber gerir eficazmente a saúde física e mental é vital. Isto inclui saber quando fazer uma pausa, manter um bom equilíbrio entre a vida profissional e pessoal, e participar em actividades que reponham as energias.

Atitude positiva: O desenvolvimento de uma mentalidade positiva pode ser um factor de mudança. Isto ajuda-o a concentrar-se no que é bom, a apreciar as pequenas vitórias e a recuperar de contratempos, o que pode contribuir para ser um trabalhador mais feliz.

Aprendizagem contínua: O desejo e a capacidade de aprender e crescer continuamente podem trazer uma sensação de realização e felicidade no trabalho. Faz com que se sinta valioso e confiante nas suas capacidades.

Colaboração: Ser um jogador de equipa e saber como trabalhar eficazmente com os outros pode levar a uma maior satisfação no trabalho. Cria um sentido de comunidade, que pode ser um factor importante para a felicidade no local de trabalho.

Devemos lembrar-nos que a felicidade no trabalho não é um destino, mas uma viagem, e estas competências podem actuar como uma bússola para nos guiar ao longo do caminho. E, embora cada colaborador possa certamente trabalhar para cultivar estas competências, as empresas também desempenham um papel fundamental no apoio ao seu desenvolvimento.

As organizações podem promover ambientes propícios à aprendizagem e ao crescimento, fornecer ferramentas e recursos para o autocuidado, incentivar a comunicação aberta e promover uma cultura de colaboração. Podem também oferecer programas de formação e workshops que ajudem os trabalhadores a tornar-se mais adaptáveis e a manterem uma mentalidade positiva.

Essencialmente, as organizações podem criar uma infra-estrutura de apoio que facilite aos colaboradores o desenvolvimento e o aperfeiçoamento destas competências. Isto não só contribui para o bem-estar e a felicidade dos empregados, como também conduz a um local de trabalho mais produtivo e inovador. Trata-se verdadeiramente de um investimento mútuo com benefícios partilhados.

 

Quais os impactos de colaboradores felizes nas organizações?

A felicidade dos colaboradores é um verdadeiro factor de mudança em qualquer organização. Como sugere uma investigação da Universidade de Warwick, os colaboradores felizes podem ser até 20% mais produtivos do que os seus homólogos infelizes (Universidade de Warwick, 2014). É como um aumento de produtividade da felicidade!

Quando os colaboradores estão felizes, tudo parece correr melhor. Uma equipa alegre significa que se faz mais, e bem. E as pessoas felizes ficam por cá mais tempo. Ninguém quer dizer adeus a um trabalho que adora, o que significa que gasta menos tempo e dinheiro a substituir pessoas. É uma situação em que todos ganham.

Agora vem a parte divertida — felicidade gera inovação. Quando as pessoas se sentem bem, é mais provável que pensem fora da caixa, apresentem ideias novas, e assumam a responsabilidade pelo que fazem. Estamos a falar de coisas muito avançadas que podem realmente ajudar a sua empresa a crescer.

E não nos esqueçamos dos clientes. Quando os colaboradores adoram o que fazem, essa energia positiva é transmitida às pessoas que servem. Resultado: clientes mais felizes e melhores negócios.

Numa equipa feliz, todos se dão bem, todos colaboram. Isso cria uma cultura dinâmica e vibrante da qual os outros querem fazer parte. É como um íman para o talento. E, claro, ter a reputação de ser um óptimo lugar para trabalhar nunca é de mais, certo?

Ah, e mais uma coisa — empregados felizes são geralmente empregados mais saudáveis. Menos stress equivale a menos dias de doença e a menos custos de saúde.

Com tudo isto em mente, o Happiness Camp deste ano está a fazer algo ainda mais especial. Estamos a criar um “Centro do Sorriso”. Trata-se de uma área fantástica com uma série de exposições que pretendem mostrar as melhores práticas para criar locais de trabalho felizes. Escolhemos cuidadosamente os expositores para mostrar o que as empresas mais felizes de Portugal estão a fazer para ganhar esse título. Será uma oportunidade fenomenal para aprender com os melhores.

 

Como podem as empresas trabalhar este tema dentro de casa?

Cultivar a felicidade corporativa é um empreendimento multifacetado que as empresas devem procurar activamente. Este percurso começa muitas vezes por fomentar uma cultura que promova a transparência, a confiança e o respeito. De facto, a EDP é um exemplo brilhante disso mesmo. A empresa criou um ambiente inovador e colaborativo onde os colaboradores se sentem ouvidos e valorizados, resultando num sentimento palpável de envolvimento e propriedade em toda a organização.

O passo seguinte é dar prioridade ao equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. A Critical Software, uma empresa de tecnologia sediada em Coimbra, é um excelente exemplo disso. A empresa tem feito progressos significativos na criação de uma cultura que respeita o tempo pessoal e desencoraja o excesso de horas extraordinárias, mostrando uma compreensão profunda do papel de uma vida pessoal equilibrada na promoção da felicidade.

Paralelamente, o desenvolvimento profissional desempenha um papel crucial. A oportunidade de aprender, crescer e progredir na carreira contribui significativamente para a satisfação no trabalho. Uma empresa que se destaca neste aspecto é a Lionesa Business Hub. A empresa oferece um programa de desenvolvimento profissional sólido, com várias iniciativas de formação interna e de orientação para o seu campus. Este foco contínuo na aprendizagem e no progresso cultiva um forte sentido de realização e satisfação entre a sua comunidade.

Por último, é fundamental não esquecer o poder do reconhecimento e da recompensa na promoção da felicidade empresarial. O Grupo Jerónimo Martins tem feito grandes progressos nesta área. Criou um sistema que celebra regularmente as conquistas dos colaboradores, assegurando que o trabalho árduo e o esforço não passam despercebidos. Este tipo de reconhecimento pode aumentar muito o moral e reforçar a sensação de ser valorizado e apreciado.

Em suma, a procura da felicidade empresarial exige uma abordagem abrangente que englobe uma cultura positiva e inclusiva, o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal, oportunidades de desenvolvimento profissional, e um reconhecimento adequado. Trata-se de criar um espaço de trabalho onde todos se sintam valorizados, apoiados e genuinamente felizes.

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