Exclusão do teletrabalho da negociação colectiva potencia vazios legais
O acolhimento do tema do teletrabalho na negociação colectiva de trabalho em Portugal é ainda muito limitado, segundo um estudo promovido pela União Geral de Trabalhadores (UGT) sobre ‘Teletrabalho e implicações para a Segurança e Saúde no Trabalho’, o que dá azo a vazios legais e a desadequações face a situações concretas.
De acordo com o estudo, «a negociação colectiva pode complementar a legislação, proporcionando disposições mais pormenorizadas e/ou adaptação do teletrabalho às necessidades de sectores específicos, bem como soluções mais equilibradas do que os acordos individuais».
O estudo indica que o acolhimento do tema do teletrabalho na negociação colectiva de trabalho em Portugal “tem expressão”, mas está «longe do significado que poderia ter, quer em quantidade (número de IRCT [Instrumentos de Regulamentação Colectiva de Trabalho] e população trabalhadora abrangida), quer em qualidade (número de temas abrangidos)».
«Isso significa uma perda de oportunidade de preencher vazios legais ou de adaptar os requisitos legais às situações concretas do teletrabalho em sectores de actividade económica, de empresa ou grupo de empresas», considera.
Concretamente, o estudo indica que poderia ser «útil incluir precisões quanto a variáveis de objecto, espaço, tempo e metodologia da avaliação de riscos», nomeadamente ao nível dos riscos psicossociais e a suas dimensões fundamentais, métodos, processos e cargas de trabalho atribuído, delimitação do concreto espaço das actividades de teletrabalho, alteração das condições de prestação do trabalho, participação dos trabalhadores e seus representantes nesse processo ou acesso de representantes de trabalhadores aos locais de teletrabalho.
Segundo nota, em países como Espanha, França e Bélgica, a integração dos comandos do Acordo-Quadro da União Europeia (UE) sobre o teletrabalho na ordem jurídica interna aconteceu através da celebração entre os parceiros sociais de acordos colectivos de trabalho intersectoriais de âmbito nacional.
Contudo, em Portugal, tal aconteceu através da introdução da sua regulamentação no Código do Trabalho (CT).
De acordo com a UGT, o facto é que a questão da Segurança e Saúde no trabalho (SST) no teletrabalho «pode ser abordada e melhorada por negociação colectiva de trabalho, desde que seja respeitado o princípio da maior favorabilidade para o trabalhador (artigo 3.º/3-K do CT)», ou seja, que relativamente à lei não seja alterada em sentido menos favorável ao trabalhador.
Ainda assim, alerta que, «havendo campo para o papel da negociação colectiva de trabalho na regulação do teletrabalho, haverá que ter em conta que essa via não é isenta de dificuldades», já que «o teletrabalho e o seu contexto actual de utilização constituem uma realidade complexa».
«Mesmo acordos colectivos extensamente elaborados podem ser insusceptíveis de abordar todas as eventualidades, cenários e realidades possíveis», admite.
Neste contexto, salienta ser «importante não só estabelecer regras e regulamentos, mas também em garantir um diálogo social contínuo e genuíno sobre esta questão», assegurando para isso que os teletrabalhadores «dispõem de mecanismos efectivos de representação na empresa e que os representantes dos trabalhadores tenham acesso aos locais de teletrabalho».
Por outro lado, o estudo adverte que há áreas de maior dificuldade de caracterização e regulação, como é o caso da protecção de dados, da vigilância digital do teletrabalho e da igualdade de oportunidades.
Sublinhado no estudo da UGT é que, «mesmo que os trabalhadores estejam a trabalhar em casa, a responsabilidade pela realização da avaliação dos riscos de qualquer local de trabalho continua a caber ao empregador».
«O Acordo-Quadro da UE sobre Teletrabalho e a legislação nacional (artigo 169.º do CT) sublinham que os teletrabalhadores beneficiam da mesma protecção concedida aos trabalhadores em geral», enfatiza.
Finalmente, a UGT manifesta «preocupação» com a situação portuguesa «ao nível do diálogo social nos locais de trabalho» : «O CT e a LPSST [Lei da Promoção da Saúde e Segurança no Trabalho] preveem o modo de eleição de representantes dos trabalhadores para a segurança e saúde nos locais de trabalho, mas a capacidade de penetração dos eleitos no tecido empresarial é reduzida, dado o baixo número de eleitos e de organizações onde se verificaram eleições», sustenta.