Médicos ucranianos não estão a conseguir exercer em Portugal. Há uma barreira que o justifica

Meia centena de médicos ucranianos, sobretudo mulheres, fugiram da guerra e procuraram refúgio em Portugal, onde esperavam poder exercer a sua profissão, mas a falta de apoios para aprender português tem impedido a sua integração no sistema de saúde.

 

«Portugal abriu os braços às médicas ucranianas refugiadas – há um médico ou outro, mas que já cá estavam antes do início da guerra – (…) mas depois não lhes deu os instrumentos adequados para poderem seguir a sua vida com maior normalidade», afirma o bastonário da Ordem dos Médicos (OM), Carlos Cortes.

Quando chegaram a Portugal em Março de 2022, a OM mostrou-se disponível para adiar a prova de comunicação em português, facilitando a sua integração no Serviço Nacional de Saúde sob o estatuto de “médico sem autonomia” e supervisionados por um tutor, mas a proposta apresentada ao Governo, ao abrigo do estatuto equivalente a refugiado que estava a ser dado aos ucranianos, não se concretizou.

A situação tem sido acompanhada por Carlos Cortes, que se reuniu com cerca de 20 desses médicos e transmitiu as suas preocupações à anterior e actual equipa do Ministério da Saúde. «A Ordem dos Médicos solicitou ao Ministério da Saúde para ajudar estas médicas e todos os médicos estrangeiros que estão a residir em Portugal e que têm estas dificuldades, nomeadamente, a dificuldade da língua», observou.

Para o bastonário, deviam ser criados programas de apoio para estes médicos aprenderem português, nomeadamente numa altura em que faltam médicos no Serviço Nacional de Saúde. «De uma assentada, o SNS podia ter mais 50 médicos, no mínimo, porque há outras nacionalidades que também estão em Portugal com esta dificuldade», defendeu.

Neurologista e médica de patologia ocupacional, Oksana Chupryna, 50 anos, escolheu Portugal para viver em Março de 2022 quando teve de deixar a cidade onde vivia na Ucrânia, ocupada pela Rússia. Desde então começou o desafio de aprender a língua portuguesa para se preparar para o exame de Português, necessário para o reconhecimento do curso de Medicina, ao que se seguirá mais tarde o exame de comunicação da OM.

Realizou o exame há cerca de um ano mas não passou, por ter «um grande nível de exigência», o mesmo acontecendo com outras médicas ucranianas, apesar de estas terem “um nível de conhecimento de língua portuguesa muito alto”, disse, acrescentando: «Apenas passaram seis ou sete».

Enquanto se prepara para repetir o exame, em Janeiro, trabalha numa loja em Portalegre, onde vive e tem recebido apoios da autarquia e do director do hospital local, que diz estar a contar com ela no hospital.

O bastonário da OM alertou para a situação em que estão muitos destes médicos, com profissões precárias e remunerações muito baixas. «Muitas delas têm filhos e a remuneração que têm acaba por ser para poder sobreviver, para poder viver, para poder comprar roupa, alimentação, etc. E o que me disseram é que não têm dinheiro para poder pagar aulas de português», contou.

Carlos Cortes salientou que a OM acolheu estes profissionais, mas não pode validar uma inscrição a médicos que «não sabem falar a língua e não compreendem um doente em Portugal».

«Mas queremos inscrever estes médicos porque as informações que temos são que a qualidade da formação médica na Ucrânia é uma boa formação. Não há nenhuma restrição nesse ponto», mas têm que saber comunicar com os seus doentes, vincou, reiterando o apelo ao Governo para dar um contributo nesta matéria.

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