O que deve mudar na Lei laboral em 2025 (DCM | Littler): «Não se criam postos de trabalho por lei»

David Carvalho Martins, fundador e Managing partner da DCM | Littler, faz uma antevisão das grandes prioridades da legislação laboral para o próximo ano. 

 

A alteração à legislação do trabalho, introduzida pela Lei n.º 13/2023, no âmbito da denominada “Agenda do Trabalho Digno”, foi longe de mais em algumas matérias e, por isso, importa reponderar a proporcionalidade das soluções introduzidas (nomeadamente nas vertentes da necessidade, da adequação e da proibição do excesso). Vejamos três exemplos paradigmáticos.

 

Em primeiro lugar, desvirtuou por completo a finalidade do período experimental, nomeadamente, no caso de trabalhador à procura de primeiro emprego e de desempregado de longa duração, na medida em que um contrato de trabalho a termo anterior com um empregador diferente pode, no limite, excluir o período experimental perante o novo empregador. Aparentemente, essa possibilidade ocorre mesmo que a experiência profissional anterior seja numa profissão ou sector de actividade totalmente diferentes.

De igual modo, o período experimental pode ser, no limite, excluído no caso de estágio profissional com avaliação positiva, neste caso para a mesma actividade, mas para empregador diferente.

Por conseguinte, o período experimental deixou de corresponder ao tempo inicial de execução do contrato de trabalho, durante o qual as partes apreciam o interesse na sua manutenção para ser uma “geringonça normativa” que visa dificultar o acesso ao mercado de trabalho deste grupo de pessoas, provavelmente na expectativa que o pleno emprego produza um milagre.

 

Em segundo lugar, tendo conhecimento do processo legislativo europeu para a aprovação de uma directiva relativa à melhoria das condições de trabalho em plataformas digitais, o legislador não quis esperar para conhecer o respectivo texto final e estabeleceu uma solução que, na prática, pode levar – está a levar – à deterioração dos serviços e das condições de trabalho. Não se criam postos de trabalho por lei. O legislador pode criar regras de conduta, mas não pode evitar que os destinatários legitimamente se adaptem. A não ser que o legislador queira proibir todo e qualquer trabalho humano não subordinado com o recurso a uma “app” com algoritmos para fazer o encontro entre a oferta e a procura, a vida não vai melhorar para ninguém com um serviço com (i) total ausência de controlo sobre a actividade dos trabalhadores de plataformas (por exemplo, quem são, onde andam, quais são os percursos que devem seguir), (ii) total liberdade de fixação de valores para os serviços (os prestadores do serviço são “convidados” pelo legislador a definirem os preços mais baixos possíveis para ganhar as corridas), (iii) total liberdade para aceitarem e recusarem o serviço, a todo o tempo, sem consequências ou necessidade de justificar ou informar o motivo ao destinatário e (iv) que ignore ou penalize que pretende assumir o risco da actividade em troca de melhores condições de vida.

 

Em terceiro lugar, criou uma proibição do recurso à terceirização de serviços, segundo a qual não é permitido recorrer à aquisição de serviços externos a entidade terceira para satisfação de necessidades que foram asseguradas por trabalhador cujo contrato tenha cessado nos 12 meses anteriores por despedimento colectivo ou despedimento por extinção de posto de trabalho, sob pena de a prática de uma contraordenação muito grave imputável ao beneficiário da aquisição de serviços. O carácter simultaneamente proclamatório e esfíngico desta solução levanta, por exemplo, as seguintes questões: (i) o prazo de 12 (doze) meses começa a correr na data da cessação do contrato ou no momento da comunicação da intenção de proceder ao despedimento colectivo ou despedimento por extinção de posto de trabalho? (ii) O que ocorre se a aquisição de serviços externos ocorrer antes do despedimento ou no dia anterior à comunicação da intenção de proceder ao despedimento colectivo ou despedimento por extinção de posto de trabalho? (iii) E se a aquisição de serviços externos tiver ocorrido há mais de três meses? e (iv) Será de admitir um procedimento de despedimento colectivo ou de extinção de posto de trabalho fundado na racionalidade económica da externalização dos serviços a uma empresa especializada, quando essa externalização está proibida? Podíamos continuar…

 

Por outro lado, embora não esteja relacionado com a Reforma Laboral de 2023, há duas questões que deviam ser ponderadas a propósito da greve:

(i) como podemos assegurar uma maior transparência e divulgação dos avisos prévios de greve?

(ii) como podemos garantir uma maior uniformização dos serviços mínimos, designadamente no caso de greves com impacto no sector público e no sector privado ou que incluam trabalhadores abrangidos pelo Código do Trabalho e outros pela Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas no âmbito do mesmo empregador?

 

Salvo melhor opinião, os avisos prévios deviam ser enviados, por escrito, aos empregadores (públicos e privados), sem prejuízo da divulgação cumulativa – não alternativa – através de meios de comunicação social, bem como a um “balcão único” que recebesse e divulgasse na sua página de Internet esses avisos e assegurasse a mediação e conciliação com vista à obtenção de um acordo entre as partes e, na ausência deste, encaminhasse directamente para um tribunal arbitral constituído no âmbito do Conselho Económico e Social. Devemos ter presente que os serviços mínimos devem ser fixados no caso de actividades que visam a satisfação de necessidades sociais impreteríveis, ou seja, têm impacto claro na vida em Sociedade. Com a actual confluência de diferentes vínculos no mesmo empregador e com a profusão de greves transversais, a transparência e a harmonização de soluções exigem soluções coordenadas, céleres e centralizadas.

Será que o ano de 2025 trará boas notícias?

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