Sabe em que década Portugal registou o maior crescimento de alunos no ensino superior?
Em 1950, apenas 15.780 alunos frequentavam as universidades do país, realidade que viria a ter uma transformação crescente em 1974, quando 56.910 passaram a frequentar o ensino superior. Hoje a realidade é bem diferente e os dados mais recentes (ano letivo de 2022/2023) mostram que 446.028 indivíduos estão inscritos no ensino superior, um número sete vezes superior ao registado há 50 anos.
Esta é uma das principais conclusões do quarto e último volume das séries históricas ‘O Ensino em Portugal antes e depois do 25 de Abril’ promovidas pelo EDULOG, o think tank para a Educação da Fundação Belmiro de Azevedo, que é conhecido e cujo tema foca a evolução do ensino superior neste período.
De acordo com os dados apresentados no artigo ‘O acesso ao Ensino Superior’, onde Alberto Amaral, membro do Conselho Consultivo do EDULOG, faz uma análise sobre as políticas que condicionaram o acesso às instituições e cursos superiores, verifica-se que embora o objectivo do Estado Novo fosse limitar ao mínimo a entrada de alunos nas universidades, essa realidade viria a dissipar-se quando no regime democrático se assiste a uma expansão da procura, que triplicou o número de estudantes matriculados nas universidades do país, entre 1950 e 1974, mas que ainda assim não satisfazia as novas vagas de candidatos que terminavam o ensino liceal.
Nos primeiros anos a seguir ao 25 de Abril, foi necessário encontrar novos instrumentos de condicionamento que permitissem às instituições de ensino superior aumentar a sua capacidade de acolhimento, tais como o serviço cívico, o ano propedêutico, um ano adicional (12.º) aos cursos secundários e a instituição de numerus clausus.
Com estas medidas, ”abrandou-se” a progressão dos jovens para o ensino superior nos anos lectivos de 1977/1978 e 1988/1989, em que o sistema passou de 81.955 alunos inscritos para um total de 124.362, respectivamente, registando um acréscimo de 51,7%.
Isto viria a criar um outro problema aos alunos que terminavam o ensino secundário, que para além de não terem lugar no ensino superior, não encontravam nenhuma outra alternativa, razão que levaria, mais tarde, à criação do ensino superior politécnico, no qual o financiamento com o Banco Mundial e a sua intervenção ao nível das políticas educativas foi determinante, e das universidades privadas.
Portugal registou, na década de 90, o maior crescimento de alunos no ensino superior: em 1989/1990, o número de alunos inscritos no ensino superior era de 131.014 e, em 2000/2001, esse número quase triplicou para 373.745 alunos.
Em 1990, o ensino público correspondia a 75,9% do total (60,6% ensino universitário e 15,3% ensino politécnico) comparativamente ao ensino privado que representava apenas 24,1% (19,9% ensino universitário e 4,2% ensino politécnico). Uma década depois, em 2000, o ensino público registava 68,2% (44,1% ensino universitário e 24,1% ensino politécnico), enquanto o ensino privado havia subido sete pontos percentuais para 31,8% (23,6% ensino universitário e 8,2% ensino politécnico).
Ao longo dos anos, o ensino privado tem vindo a descer, sobretudo nos últimos anos: em 2022, para um total de 433.217 alunos inscritos no ensino superior, o sector público correspondia a 81% (50,4% ensino universitário e 30,6% ensino politécnico) e o privado a apenas 19% (13% ensino universitário e 6% ensino politécnico).
Outro dado relevante em termos da evolução do ensino superior em Portugal é o aumento progressivo do número de mulheres que, a partir de 1984/1985, começa a ultrapassar no número de homens inscritos nas universidades – o quociente mulheres/homens atingiu o máximo de 1,39 em 1992/1993, descendo nos anos seguintes para se estabilizar nos últimos anos entre 1,16 e 1,18 (2022/2023).
Há na análise do autor outros dois dados importantes que devem ser tidos em conta: a evolução demográfica e a equidade no acesso. O relatório da OCDE (2022) alerta para os problemas do sistema e que são resultado da evolução demográfica negativa, em que as projecções apontam para uma redução da população jovem (entre os 20 e 29 anos), no período de 2020 a 2035, de mais de 70.000 homens e 72.000 mulheres. Sabendo que estes jovens constituem a grande maioria da procura pelo ensino superior, é de prever, no futuro, dificuldades para atrair novos alunos.
Por outro lado, a falta de equidade no acesso ao ensino superior é um problema não resolvido na maioria dos países e também em Portugal, onde o sistema de ensino superior ainda apresenta deficiências no acesso dos alunos economicamente mais carenciados.
Em 2021/2022, os dados mostram que, em média, 20,24% de todos os alunos do ensino superior eram bolseiros, havendo 17,02% do ensino universitário e 25,45% do ensino politécnico, o que permite concluir que os alunos provenientes de famílias mais desfavorecidas optam por esta via de ensino superior.
As instituições localizadas em Lisboa são as que têm menos bolseiros (p. ex. Universidade Nova de Lisboa – 8,65%, ISCTE – 8,88% e Universidade de Lisboa – 10,99%) e, ao nível dos cursos, as classes mais favorecidas optam pela Medicina ou Engenharias (Instituto Superior Técnico ou Faculdade de Engenharia do Porto) quando fazem o seu ingresso no ensino universitário, enquanto as classes menos favorecidas (mas com aptidões académias iguais) acabam por escolher cursos com trajectórias menos ambiciosas como a Enfermagem e a Educação.
Mas a análise do ensino superior só faz sentido se for feita à luz do ensino politécnico, segundo Claudia Urbano, professora na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas e autora do artigo ‘O ensino superior: das escolas técnicas ao ensino politécnico’ que integra o quarto volume das séries históricas.
Nos anos 60, a pressão da procura pelo ensino superior levou à necessidade de se criar o ensino politécnico como alternativa: os Institutos de Engenharia de Lisboa e do Porto foram os primeiros a ser convertidos (1970), seguindo-se os Institutos Comerciais (1975/76), as Escolas Normais Superiores (1978/79) e outras escolas equiparáveis ao grau de bacharel. Em 1980 constituía-se, pela primeira vez, a rede de escolas de ensino superior politécnico, integrando 27 institutos distribuídos por 15 distritos do País.
Entre 1960 e 1977, o ensino politécnico teve pouca expressão a nível nacional, registando um crescimento médio anual de 5,5%, dada a imagem pouco positiva que este subsistema apresentava na altura em termos de estatuto social.
Com a regulação do estatuto e autonomia dos estabelecimentos de ensino superior politécnico em 1990, Portugal passou a registar um aumento de mais de 150% do número de alunos inscritos em apenas 23 anos, de 1989/1990 a 2002/2003, passando de cerca de 158 mil alunos para 401 mil inscritos.
Actualmente, o país tem 61 instituições de ensino politécnico, 41 das quais são privadas, num total de 100 instituições de ensino superior. Os dados mais recentes dão nota de que as instituições de ensino politécnico oferecem cerca de 2.500 cursos, 75% dos quais no sector público, sendo que a oferta se concretiza em 30% de cursos de licenciatura, 29% de mestrado e 41% de cursos técnicos superiores profissionais.