Slow work, férias e Analytics

Por Isabel Moço, coordenadora e professora da Universidade Europeia

 

Nas últimas semanas, típico da silly season – que já foi, mais do que é, ou desejamos boas férias, ou perguntamos se as férias foram boas. Mas antes de deixar os votos aos que “vão”, nos últimos tempos ouve-se frequentemente qualquer coisa do género: “mas se for preciso, vou estar em Slow Work”, e essa é uma diferença a assinalar. Parece-me um excesso de utilização da expressão, para além, claro está, do excesso em si mesmo.

Há mais de uma década que Carl Honoré, no seu livro “In Praise of Slow” registou que esta tendência está a crescer e as pessoas estão a desacelerar. Nas palavras do próprio autor “Slower is better: better work, better productivity, better exercise, better sex, better food” e na perspetiva da gestão de pessoas (entre outras), parece uma boa composição. Ao que defende o autor, e embora as empresas continuem a procurar o “Citius, Altius, Fortius” (mas como sabemos este é o lema dos Jogos Olímpicos), parece uma regularidade que as pessoas se sentem agastadas e começaram a dar mais importância a outros aspetos da vida, que não só, ou primordialmente, o trabalho. Neste desafio ao culto da velocidade, e numa fase em que empresas adotam medidas de conciliação entre trabalho e família, em que se discutem os formatos de flexibilidade, por exemplo aplicados ao tempo e espaço de prestação de trabalho, parece que, paulatinamente, se vão acomodando ritmos de trabalho distintos – o que também tem uma relação com as gerações. Longe vão os anos 90 do século passado em que a avaliação do desempenho (também) considerava o tempo que a pessoa estava no trabalho.

Bem, mas se é assim, e tomando em conta as “perversidades” da tecnologia que nos liga a todos e em qualquer tempo, porque vão as pessoas de férias e ficam em “Slow work”? – embora, e refere-se de novo, seja uma apropriação abusiva do conceito. Uma resposta será porque o trabalho não faz férias, as empresas e os negócios têm de continuar e fenómenos pessoais/profissionais como o compromisso, o envolvimento, as responsabilidades, entre outros, imprimem ritmos e necessidades a que há que dar resposta. Se pessoas e empresas, entenda-se gestão, acomodarem bem esta forma de estar, não há questão, a não ser que a necessidade de monitorizar os riscos se impõe. Mas e quando não é vontade das pessoas? Quando é uma exigência do próprio trabalho, ou porque não há backup, ou porque as lideranças o requerem, ou porque… Nesse caso, o direito a desligar deveria impor-se e o gestor de pessoas ser o guardião deste direito fundamental. Deverá, desde logo, perceber se existe a possibilidade de as pessoas manifestarem essa vontade de ir realmente de férias e descansar – de desligar. Existem os mecanismos certos para as pessoas o expressarem e assegurarem se for essa a sua vontade? – naturalmente a cultura tem aqui um papel importantíssimo, mas também aí o gestor de pessoas deverá saber aturar.

Qual a relação de toda esta reflexão com o Analytics aplicado à Gestão de Pessoas? Vivemos numa fase em que parece existir uma certa “ansiedade analítica” e até se entende certo, na defesa de Deming que já nos alertava que não é possível gerir o que não pode ser medido. Mas ele também escreveu que o que não se mede não se pode melhorar, e aqui está a questão – Mede-se o volume, a frequência, os riscos, os impactos na qualidade do trabalho e das relações, … do “slow work” durante as férias dos trabalhadores? E na marca de empregador? Estou a ver que um grupo de amigos que se junte para um sunset na praia, entenda menos bem porque é que o empregador de um deles “requer” a sua resposta naquela hora e o afasta do convívio. Sugestão: estendam o analytics a estes domínios menos atendidos. Ah, e uma nota final: trabalhar nas férias não é Slow Work.

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