Carlos Rodrigues, Numeric Consulting Group: «Um dos factores para a retenção de talento é pagar melhores salários»

Com o prazo de entrega do IRS 2022 a decorrer fomos perceber a importância da profissão de contabilista. Para tal conversamos com Carlos Rodrigues, Partner e Co-Fundador da Numeric Consulting Group, que nos explicou a evolução da profissão e quais os desafios que enfrentam para o futuro. 

Por Sandra M. Pinto

 

A Numeric Consulting Group foi criada em 2010 por Carlos Rodrigues e pelo Sérgio Ramos, que, pela sua experiência na área, sentiram que «era o momento de estar à frente de um projecto consistente, constituído por uma equipa de consultores multidisciplinares e competentes. Algo que tínhamos em mente então, e que vemos aplicado na prática actualmente». No final de 2021, juntaram-se dois partners, o Gonçalo Peres e o Ricardo Miguel, na sequência da integração da estrutura da Acountia Marquês de Pombal. No total, toda a equipa da Numeric Consulting Group é constituída por 57 profissionais e tem escritórios em Lisboa, Cascais, Caldas da Rainha, São Paulo e Rio de Janeiro.

 

De que forma analisa a evolução da vossa actividade de lá até ao momento?

Nós assumimos uma visão bastante progressista sobre a contabilidade. Não por acaso, adoptámos e continuaremos a adoptar métodos que visam uma atividade mais desmaterializada. Sentimos há bastante tempo que a crescente relevância do software tecnológico é aspecto fundamental na evolução da profissão. Como consequência, a digitalização processual é um dos novos paradigmas do sector, que implica uma reorganização interna, mas também junto dos clientes, desde logo, com o upload de documentos digitais.

Posso dar-lhe um exemplo, se anteriormente os técnicos recebiam o papel e organizavam-no por fornecedor e data, com todo o consumo temporal inerente a esta tarefa, não parcas vezes monótona, a digitalização mudou por completo todo o processo. O qual tornou-se mais leve e, por consequência, mais facilitado, poupando tempo e recursos internos.

 

Na sua opinião há hoje um maior reconhecimento da importância dos contabilistas?

Aos contabilistas é devido reconhecimento pelo seu trabalho junto das organizações. Infelizmente, nem sempre se verifica. Num mundo ideal, consideramos que os contabilistas devem ser parceiros ao nível do aconselhamento financeiro, numa perspectiva que ultrapassa a estrita fiscalidade. Mas também podem e devem ser consultados no sentido de apresentar soluções sobre as melhores alternativas nos negócios e nas actividades, para além de assegurar o cabal cumprimento das obrigações fiscais.

Sou um optimista por natureza. Como tal, quero acreditar que o papel do contabilista na sociedade e junto de parceiros económicos e sociais ganhará crescente preponderância.

 

Actualmente quais são as motivações para se ser contabilista em Portugal?

Importa reforçar que o trabalho de um contabilista não se cinge àquela visão pouco idílica, rodeado de folhas de excel e legislação de suporte. Claro que a vocação é sempre um aspecto relevante a considerar, bem como conhecimentos financeiros consolidados, capacidade de raciocínio analítico e matemático. E a vontade de apoiar estrategicamente as empresas, no sentido de implementar as melhores soluções, é um desafio para qualquer profissional.

Um aspecto que gostamos sempre de partilhar, em especial junto dos mais jovens: saber que no final de um dia de trabalho foi possível contribuir para a resolução de conflitos fiscais, para o aconselhamento de estruturas empresariais ou para que os contribuintes individuais ou coletivos tenham resolvido os seus anseios e dúvidas, este é um sentimento muito gratificante e que nos cabe veicular.

 

De que forma se desenvolve hoje a profissão? Há um maior envolvimento/aconselhamento junto dos clientes?

Sentimos que ainda existe uma forma enviesada de olhar para os contabilistas. Para muitos, estes têm uma função meramente fiscal, ao invés de uma envolvente muito mais alargada. Ora, sem descurar esse perspectiva prática da profissão, os contabilistas deveriam também ser parceiros da administração, que planeia os negócios e as actividades, para além de medir os resultados das decisões, por aplicação de princípios, normas e técnicas.

Mas há uma crescente percepção quanto ao contabilista como alguém capaz de controlar as actividades e aconselhar quanto ao futuro, enquanto suporte no cumprimento de deveres fiscais das entidades com quem colabora. Mas igualmente como auxiliar com vista à necessária competitividade e continuidade das empresas. Estas funções são relevantes e, em tempo de crise, vitais para a tomada de decisões económicas e financeiras fundamentadas.

Como tal, estou ciente que chegará o tempo em que todos perceberão a transversalidade das nossas funções.

 

De que forma é abordada a captação e retenção de talento na profissão?

No caso da Numeric Consulting Group, assumimos uma posição proativa junto da academia. Trazermos para o seio da nossa organização jovens com grande potencial e vê-los crescer é algo que nos deixa por demais gratificados e orgulhosos. Este é um dos factores que nos faz querer continuar na profissão, a somar ao desejo de manter uma trajectória evolutiva, a encontrar soluções e alternativas aos problemas e desafios com que nos deparamos tantas vezes.

Depois da captação de talento, entramos naquilo que refere como retenção. Nesse sentido, os projectos que procuramos implementar, a capacidade de entusiasmar as nossas equipas, motivá-las para dar aquele esforço extra que tantas vezes faz a diferença, mas também o sabermos recompensar esse trabalho, e que não se faz apenas por palavras mais simpáticas, são métodos evidentes. Também a formação contínua, a criação de um espírito de equipa, o ser exigente sem com isso criar um ambiente tenso, são outros modelos de trabalho que em momento algum descuramos.

Não inventámos nenhuma fórmula mágica, simplesmente adaptámos às nossas circunstâncias o conhecimento profundo que temos da profissão.

 

A tendência de uma subida de preços nas avenças tem alguma consequência a esse nível?

O aumento da qualidade do serviço, mas também da qualidade organizativa, resulta numa inevitável repercussão nos valores das avenças. É uma regra do mercado e a contabilidade não foge à regra. Posso referir que a avença média tem vindo a subir, não só na Numeric Consulting Group, como no sector em geral. Desde logo, porque as empresas de contabilidade viram os seus gastos aumentar, através das rendas e dos recursos humanos.

No caso das rendas, assistiu-se a um crescimento de forma acentuada há cerca de 2/3 anos, por via da acentuada valorização que se verificou no imobiliário. Quanto aos profissionais que constituem as estruturas, estes exigem maiores salários à partida, em larga media justificado por se verificar uma maior oferta de emprego que procura. E, claro, um dos factores para a retenção de talento é pagar melhores salários, com inevitáveis impactos orçamentais na vertente de recursos. Por fim, também a concentração empresarial no sector implica a criação de empresas com estruturas mais modernas e exigentes. Este é outro factor que leva a maiores custos organizacionais, o que resulta num aumento dos valores apresentados aos clientes.

 

Olhando para o futuro, quais os maiores desafios que se colocam à profissão?

Desde logo, vejo com esperança a implementação de um conceito que é muito caro à Numeric Consulting Group, a Contabilidade 4.0. É a oportunidade de utilizar a automatização em favor do trabalho de consultoria.
Ou seja, o grande desafio para a profissão passa pela adaptar-se aos modelos tecnológicos e a esta nova forma de trabalho, onde o documento físico será um factor secundário e não essencial. Claro que não será fácil para todos os profissionais, principalmente os de idade mais avançada, com métodos de trabalho já enraizados. Algo que exigirá, de todos, um esforço conjunto, que não deixe ninguém para trás.
Com isso, pretende-se atingir uma maior rapidez e flexibilidade no dia a dia laboral, sem esquecer os impactos ambientais que traz a redução do desperdício de papel, com ganhos reputacionais para a profissão, por via de uma pegada ecológica mais sustentável.

 

Há com a entrada da digitação, uma elevação na consideração da profissão? De futuro quais serão as novas funções dos contabilistas?

Para começar, esqueçam as pilhas de armários, papéis amarrotados e pastas físicas. Com isso, os profissionais vão, inevitavelmente, ter mais tempo para lidar com problemas reais e pensar em estratégias eficientes.
Como já referi, acredito que a contabilidade 4.0 vem trazer mais segurança e produtividade para a Contabilidade. A Cloud será o arquivo por excelência, com a economia de tempo e optimização de processos.
Se a tudo somarmos a Inteligência Artificial, verificamos que os contabilistas vão passar a estar muito mais preparados e focados para realizar os cálculos de tributação, gestão dos documentos fiscais, realização de auditorias, por exemplo.

 

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