Está o sistema de recompensas associado a qualidade de vida?
Um colaborador com menos de 30 anos, um colaborador com filhos e um colaborador a chegar à idade da reforma valorizam benefícios diferentes. Assim, um sistema de benefícios estático, sem uma componente flexível associada, não vai trazer vantagens nem para o colaborador nem para a empresa.
Por Madalena Caldeira, Sócia contratada da Abreu Advogados
O conceito não é novo e remonta à década de 1970, embora em Portugal a introdução de benefícios flexíveis nas empresas tenha começado apenas no início deste século. Foi então que se começou a ter consciência de que motivar trabalhadores e atrair e reter talento requer que o colaborador seja considerado e trazido para o processo de forma activa. Esta necessidade tem determinado que as organizações implementem mecanismos de recompensa que visam dar resposta às necessidades específicas dos seus colaboradores, tão distintas quantos os seus estilos de vida.
Tais mecanismos de recompensa não passam apenas por implementar políticas salariais atractivas ou sistemas de benefícios estáticos (benefícios atribuídos de forma cega e igual a todos os colaboradores), traduzindo-se, em vez disso, num sistema em que os benefícios atribuídos variam em função das necessidades de cada trabalhador e passam por um processo de escolha desse mesmo colaborador.
Por norma, o sistema é implementado com criação e disponibilização de um núcleo de benefícios iguais e transversais a toda a organização, que não são objecto de escolha. Em acréscimo a este núcleo, é criado um leque adicional de benefícios, com características distintas, endereçados a necessidades diferentes, e que podem ser escolhidos pelos colaboradores (embora possa ser totalmente flexível).
Por exemplo, um colaborador com filhos provavelmente elegerá, no topo das suas prioridades, um benefício que se traduza na disponibilização de uma creche ou em auxílio para suportar os custos com este tipo de estabelecimento. Ao invés, um colaborador com idade mais avançada, tenderá a eleger benefícios que se traduzam em prestações complementares de reforma ou seguros de saúde. Os benefícios de que ora secuida podem respeitar a saúde e bem-estar (como seguros, check-up ou ginásio), alimentação (como cartões-refeição ou pequeno-almoço gratuito), educação (formação própria, educação dos filhos, subsídio para material escolar), carreira (programas de mentoring, políticas de promoção) e várias outras formas de suporte e satisfação das necessidades dos colaboradores (entre as quais creche, estacionamento, horário flexível, teletrabalho, plano de pensões, entre outras).
Trata-se, por isso, de ir muito além do que são as normas do Código do Trabalho habitualmente apontadas como normas de flexibilização (trabalho a tempo parcial, horário flexível, teletrabalho, entre outras). Em todos estes casos, falamos de direitos e, portanto, da obrigação de respeitar esses direitos por parte do empregador e de garantir que, se o trabalhador pretender uma solução que passa pela flexibilização do tempo de trabalho, o trabalhador pode impor a sua vontade ao empregador (cumpridos, claro, os requisitos legais).
Inversamente, implementar um sistema de benefícios flexíveis, embora requeira a conformidade com a lei, não exige imposição ao empregador. Pelo contrário, é o empregador quem cria e propõe ao trabalhador a possibilidade de conceber o seu plano de benefícios, que pode abranger um modelo de tempo de trabalho com maior disponibilidade para a família. O trabalhador não fica impedido de exercer o direito tal como a lei o configura, mas na maioria das vezes não precisa, porque as hipóteses de benefícios que lhe são propostas dão resposta às suas necessidades.
Importa, ainda assim, prosseguir com cautela na implementação de um modelo de benefícios flexíveis e definir, de forma clara, as regras da sua vigência e cessação – se for o caso. É ainda essencial que o empregador avalie o impacto financeiro que a criação de um sistema de benefícios flexíveis pode ter. Falamos, em concreto, da tributação destes benefícios, quer em sede de imposto sobre o rendimento (IRS – Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares – e IRC Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas –, na perspectiva do que pode ser gasto) quer em sede de Segurança Social.
Sem prejuízo, o balanço tende a ser positivo, quer em termos laborais e sociais – trata-se da promoção da qualidade de vida e do equilíbrio entre a vida profissional e pessoal – e até mesmo fiscais, pois embora o princípio geral seja o da tributação dos rendimentos em dinheiro e em espécie, há vários destes benefícios que beneficiam de isenção ou exclusão de tributação.
Este artigo foi publicado na edição de Setembro da Human Resources.