Nova era na cultura e liderança organizacional

Com o mundo em movimento contínuo, as organizações e as suas pessoas precisam de relações próximas para prosperarem.

 

Conversa entre Edgar H. Schein e Peter A. Schein, publicada originalmente na MIT Sloan Management Review

 

Quando o psicólogo social Edgar Schein chegou à MIT Sloan School of Management nos anos 50, a instituição tinha acabado de lançar a sua grande experiência de ensinar Gestão através de disciplinas formais como Matemática, Psicologia Social, Economia e História. Era um afastamento radical da exposição à “prática de gestão” através de exemplos ensinados por professores que tinham sido gestores durante a maior parte da sua carreira.

A nova abordagem deu origem a colaborações próximas e improváveis e a profundas e inovadoras formas de pensar sobre liderança, culturas de grupo e mudança organizacional – tudo áreas de estudo emergentes na altura. Foi neste ambiente que Ed e os colegas embarcaram naquilo a que ele chama de «um excitante quarto de século de desenvolvimento de modelos», que ajudou a definir como as pessoas pensam e se empenham nas organizações.

Décadas mais tarde, na era digital, Ed afirma que está na altura de seguir um novo modelo que se baseie em relações profissionais próximas, abertura e confiança. Ele e Peter Schein, filho e colaborador, trabalham neste novo modelo há uns anos. Após concluir uma licenciatura em antropologia e um MBA, Peter passou a maior parte da sua carreira como executivo estratégico em diversas empresas de Silicon Valley. Em 2015, decidiu juntar-se a Ed na análise e descrição das mudanças em curso, à medida que as tarefas da gestão se tornam mais complexas, interdependentes e voláteis.

Nesta conversa, partilham as suas perspectivas sobre a vida organizacional, uma breve história de ideias que levaram a este momento e as suas “previsões” para o futuro.

Ed Schein · Peter, no recente trabalho que fizemos juntos, defendeste a combinação de cultura, mudança e liderança num processo integrado, em vez de os ver como três tópicos de diferente importância. Porquê esta abordagem?

Peter Schein · Actualmente, a maioria das pessoas que trabalha, em organizações grandes e pequenas, aceita implicitamente o que significa a cultura. Quer ultrapasse ou não a estratégia, a cultura é um substrato profundo: coercivo, fortalecedor, bom ou tóxico. “Temos um problema de cultura.” As preocupações culturais das organizações certamente variam de ambiente para ambiente: as startups podem preocupar-se com o desenvolvimento da cultura certa; as organizações médias podem preocupar-se com a melhor forma de integrar as várias subculturas ocupacionais, sociais e outras que, muitas vezes, entram em conflito ou são transversais; e as organizações mais antigas podem focar-se no modo de criar uma cultura de inovação, por exemplo, ou uma cultura de envolvimento dos colaboradores, enquanto que a estabilidade se transforma em estagnação e apatia.

Ainda assim, a cultura é uma grande força estabilizadora, à medida que as organizações amadurecem e não são manipuladas com soluções instantâneas, como a revisão de uma declaração de missão. A cultura sobrevive às fases de crescimento. As iniciativas de mudança que alteram metaforicamente a cor das paredes demoram muito tempo a alterar as crenças profundas que erigiram originalmente as paredes.

Contudo, as organizações precisam de operar num mundo que se encontra continuamente em movimento à volta delas. Os nossos processos de trabalho estão a evoluir em resposta às condições micro e macroeconómicas que mudam rapidamente. Muita da nossa acumulação de dados e tomada de decisões acontece agora a uma velocidade estonteante, normalmente à velocidade da luz, enquanto antigamente acontecia à velocidade do som, das conversas e da reflexão.

Neste contexto, se virmos a mudança como uma progressão linear – se acreditarmos que temos tempo para parar-mudar-continuar à medida que os eventos se desenrolam – podemos ficar para trás. Embora os modelos de mudança lineares e hierárquicos possam ainda funcionar para fluxos de produção simples, eles equivalem à correcção, alteração ou ajuste de processos existentes, e não é claro durante quanto tempo os humanos podem apostar neste tipo de valor até a Inteligência Artificial (IA) acabar a fazer um trabalho muito melhor.

Talvez seja preferível vermos a mudança como uma onda que não pára, com altos e baixos variáveis, que tentamos gerir da melhor maneira. Espero que os humanos ultrapassem a IA na adaptação contínua a contextos variáveis, em quatro dimensões, enquanto a automatização se torna excelente a ajustar, em três dimensões.

Estou curioso e optimista em relação aos novos modelos de trabalho e design de organização, nos quais a hierarquia, as descrições de funções e os fluxos de trabalho se transformam em processos fluídos de adaptação eterna, à medida que as circunstâncias mudam, tal como as organizações mudam o fluxo para os subsistemas que mais dele precisam. As mudanças rápidas irão afectar estas subculturas de formas muito diferentes, e os processos de mudança, por sua vez, darão origem à liderança formal e informal. Por isso, não é possível pensar nestas coisas individualmente.

Ed Schein · A liderança também se transformou num processo fluído e não em algo caracterizado pelo título, talento ou tenacidade de indivíduos em posições formais de autoridade.

Peter Schein · Sim, reflecte o que vemos nas organizações. Para algumas pessoas actualmente, e para outras em breve, o trabalho é feito em grupos e projectos,com equipas mutáveis e com cargos que mudam constantemente à medida que as tarefas se tornam mais complexas e interdependentes. Podemos agora pensar na liderança como a criação e implementação de uma forma nova e melhor de fazer algo, quer seja uma nova estratégia, um novo produto ou serviço ou uma nova maneira de um grupo gerir as suas reuniões e tomar decisões.

A liderança, neste sentido, resulta de ver uma necessidade, desenvolver o tipo de relações que tornarão possível algo novo e melhor, e abraçar a ideia de que o impulso e a acção nascem em qualquer lugar da organização ou de um grupo de trabalho. As relações que vemos prosperar, não apenas em organizações formais mas também em coligações e ecossistemas, apoiam a abertura e a confiança para maximizar o fluxo de informações e optimizar as decisões.

Falamos frequentemente da importância das relações. Ed, argumentou repetidamente que a melhoria das relações envolve o aperfeiçoamento de uma noção mais rica dos diferentes níveis e tipos e de como funcionam. Como o fazemos?

Ed Schein · A profundidade das relações laborais reflecte categorias muito abrangentes que surgiram em todas as sociedades. Aquilo a que chamamos relações -1 envolve, numa palavra, domínio. Existem quando alguém exerce poder absoluto e subjuga outras pessoas, como em fábricas clandestinas ou prisões.

A maioria das nossas relações, no trabalho e na sociedade civil, não são tão assimétricas, mas tendem a ser distantes e transaccionais. Nestas relações de nível 1, tendemos a desempenhar vários papéis para termos boas relações com os outros e gerirmos as nossas questões diárias. No trabalho, este nível é reforçado através do design organizacional. Os colaboradores são contratados pelas suas competências para cumprirem determinados cargos, claramente definidos, e espera-se que mantenham uma certa distância social e profissional dos seus pares e das pessoas que se encontram acima e abaixo na hierarquia.

Estamos muito familiarizados com a cultura empresarial que normalmente acompanha este design. Se o trabalho cria uma definição de cargos muito precisa, aceitamo-la porque é eficiente, embora a sua impessoalidade nos faça chamar-lhe burocracia. Contudo, a falha fundamental das relações de nível 1 é que a distância entre, e até dentro dos cargos, faz com que seja muito fácil colaboradores de todos os níveis evitarem uma comunicação aberta e criarem desconfiança. Não comunicar torna-se mais fácil e seguro quando a competição profissional é culturalmente natural num sistema hierárquico rígido. Isto deixa a organização vulnerável a défices na qualidade, na segurança, na satisfação do cliente e na inovação. Podemos ver o nível -1 como relações de poder e o nível 1 como relações de cargos, e compreender que nenhum deles funcionará no futuro.

Em vez disso, precisamos do nível 2, que pode ser descrito como relações pessoais. Vemo-las na evolução daquilo a que os sociólogos chamam de organização informal, onde colaboradores e gestores formam ligações mais próximas para criarem mais comunicação e confiança. Nas relações de nível 2, as pessoas escolhem tratar-se mutuamente como seres humanos, e não como ocupantes de cargos, o que faz desabar a distância psicológica entre limites hierárquicos, como quando um executivo de topo forma uma relação pessoal com um engenheiro intermédio e descobre assim o que realmente se passa na organização.

Com o trabalho a tornar-se mais complexo e interdependente, e com as organizações a tornarem-se esferas orgânicas e flexíveis de grupos e equipas, os gestores do futuro terão de conhecer as suas pessoas para criarem uma comunicação válida e fiável, e uma confiança bidireccional. Todos os membros da organização terão de se sentir psicologicamente seguros para falarem quando as coisas não estão a funcionar e para serem líderes quando vêm um modo novo e melhor de fazer algo. Grandes líderes e gestores sempre fizeram isto, mas nunca se tornou uma parte necessária da cultura empresarial tradicional. Deveria tornar-se.

Peter Schein · Tens uma longa carreira na área de estudos organizacionais. Podes descrever como chegaste à ênfase nas relações no teu trabalho sobre liderança e cultura?

Ed Schein · Vamos começar com o meu trabalho como licenciado. Como psicólogo social e funcionário do Walter Reed Army Institute of Research, fui escolhido para fazer parte de uma equipa que trouxe prisioneiros de guerra repatriados de prisões norte-coreanas depois da Guerra da Coreia. O meu trabalho era diagnosticar inadaptações psicológicas e ser útil durante a viagem de 16 dias da Coreia para São Francisco. Entregaram-me um enorme conjunto de dados que mostravam como os comunistas chineses do início da década de 50 doutrinavam alguns dos seus prisioneiros civis no continente e iam buscar alguns prisioneiros de guerra para colaborarem com o inimigo e oferecerem aos chineses propaganda útil. Esta experiência encaixava nos meus interesses de pesquisa sobre influência interpessoal e tornou muito claro o que envolvia uma relação de nível -1.

O que me levou aos primeiros anos na MIT School of Industrial Management – era assim que a Sloan se chamava quando Douglas McGregor, um proeminente teórico de liderança, me recrutou em 1956, para incluir Psicologia Social na formação dos futuros gestores. McGregor incluiu-me nos primeiros “grupos populares” que se formavam na altura. Entrei juntamente com Warren Bennis e Richard Beckhard, que se tornaram grandes mentores e me apresentaram à aprendizagem experimental.

Os laboratórios de pesquisa de relações humanas que nasceram da pesquisa de dinâmica de grupo de Kurt Lewin no MIT desenvolveram métodos de aprendizagem experimentais para ajudar os gestores a desenvolverem as capacidades de observar a gerir processos interpessoais e de grupos. Após alguma resistência inicial, porque pensava já saber tudo aquilo, descobri que a aprendizagem experimental era muito mais poderosa do que a aprendizagem teórica, com palestras, leituras e exemplos, e que eu podia ser um instrutor eficaz para esses grupos. Nesses grupos de formação, vi como vários desconhecidos conseguiam passar rapidamente de relações de nível 1 para relações de nível 2.

Depois pressupus que a essência da boa gestão e boa liderança era a capacidade e o desejo das pessoas nesses cargos para observarem, compreenderem e gerirem as relações que têm com os seus superiores, subordinados e pares. Tomei como garantido que o nível 2 era uma relação apropriada entre gestor e colaborador muito antes de ser chamada assim. Só nos últimos tempos é que vi a necessidade de um modelo explícito de profundidade de relações que reflectem como a sociedade nos ensina a todos como adultos a diferenciarmos relações abusivas, burocráticas, pessoais e íntimas.

Enquanto isto acontecia no MIT, aprendi que as organizações valorizavam muito o que ensinávamos. Contratavam-nos para darmos palestras, sermos consultores e ajudarmos a definir questões relacionadas com carreira, gestão e liderança. Não foi um grande salto passar do meu interesse no doutrinamento para a forma como as empresas influenciam os recém-contratados a adoptarem um sistema de valores empresariais.

Peter Schein · Como é que tudo isto está ligado aos teus contributos na área do desenvolvimento de carreiras e gestão de talento e também às tuas ideias sobre cultura?

Ed Schein · Descobri muitos exemplos de uma forte influência empresarial na minha pesquisa, mas descobri também que as pessoas podem resistir-lhe facilmente ao deixarem uma empresa ou um sector para se tornarem professores ou consultores. O que levou a um grande estudo em que segui 44 antigos alunos do MIT e descobri que nos primeiros 10 a 20 anos da sua carreira, as pessoas usam as suas experiências para criarem uma imagem de quem são, do que as motiva, daquilo em que são boas e dos seus valores centrais, o que acabou por se chamar âncora profissional. Assim que os antigos alunos desenvolveram essa auto-imagem, ela tornou-se uma âncora nas suas decisões profissionais e organizou as suas vidas profissionais.

Para estudar ainda mais estas questões, juntaram-se a mim Lotte Bailyn e John Van Maanen, com quem trabalhei intensamente durante mais de duas décadas no desenvolvimento profissional, no papel das mulheres no local de trabalho, nas carreiras duplas, no equilíbrio entre profissional e pessoal e em vários tópicos que, juntos, formaram praticamente a área do desenvolvimento profissional. As nossas perspectivas diferentes e a capacidade de trabalhar em conjunto deram origem a um entusiasmante quarto de século de criação de modelos que faz uso da psicologia e sociologia.

A maioria da minha consultoria nos primeiros anos nasceu do meu interesse pelo desenvolvimento profissional e, do ponto de vista da organização, da socialização de novos colaboradores e gestão de talento. Escrevi um artigo sobre como a principal função do departamento de pessoal, na altura chamado relações humanas, era a difícil tarefa de alinhar as necessidades dos colaboradores individuais com as necessidades da organização. O conceito de cultura tem sido aplicado por antropólogos para sociedades pré-literárias e modernas há muito tempo, mas para mim tornou-se claro que o que as empresas ensinavam aos seus colaboradores podia ser descrito como cultura da empresa. Depois observei como todas as startups tinham um forte sistema de valores em que os novos colaboradores tinham de encaixar. Se a organização tem sucesso, o que começam por ser os valores dos fundadores rapidamente se tornam a base para o sucesso da empresa e pouco depois tornam-se a cultura organizacional. Depois observei como este processo de desenvolver um sistema central de valores à volta do qual as regras e normas de comportamento evoluíram se aplica não só nas organizações, como também em várias ocupações e profissões – Engenharia, Medicina, Direito, etc.

Durante vários anos senti que os estudos organizacionais na Sloan, e na maior parte das business schools, eram dominados pela psicologia. Com a chegada de John Van Maanen, conseguimos ampliar o nosso enfoque e criar um programa de doutoramento sobre métodos etnográficos. Isso deu origem a uma série de doutoramentos que usaram este ponto de vista em muitas outras business schools e gradualmente trouxeram muitas perpectivas sociológicas e antropológicas para esta área.

A sociabilização dos colaboradores, compreendemos, era basicamente o mesmo processo que ensinar aos novos membros a cultura desse grupo. Para justificar a sua sobrevivência e crescimento, a organização tinha de contratar e formar colaboradores com o tipo certo de talento e de âncoras profissionais.

Peter Schein · Nesse sentido, cultura e liderança há muito que estão ligadas.

Ed Schein · Fundadores e empreendedores definiram o padrão à medida que formaram as suas organizações, por isso os líderes criam cultura desde o início. Contudo, à medida que essas organizações amadurecem, as suas culturas determinam que tipo de líderes escolhem. Desenvolvem uma ideia clara do que deverá ser liderança naquele ambiente, e escolhem pessoas para cargos de topo que tenham perfil para tal. Uma organização jovem aproveita vários talentos para atingir o sucesso, mas à medida que amadurece ganha fortes crenças, expressas nas descrições de funções, sobre o tipo de talento necessário e depois recruta apenas essas pessoas. A gestão de talento de uma organização madura torna-se então um processo subtil da recriação da cultura, de contratar apenas pessoas que “encaixam” na cultura técnica (como as tarefas são feitas) e na cultura social (como as relações funcionam). Quando o ambiente externo, ou a macrocultura, muda, as organizações chegam ao momento da verdade: precisamos de inovação, contudo não conseguimos que as nossas pessoas o façam! Se compreendermos como a cultura funciona, isto não é surpreendente, e na verdade algumas grandes organizações compreenderam como inovar, em parte dando às funções de pesquisa e desenvolvimento liberdade para desenvolverem as próprias culturas técnicas e sociais.

Mas chega de falar sobre como chegámos aqui… Peter, tens estado aqui em Silicon Valley desde os primeiros dias da internet. É um dos locais que parece inevitavelmente definir o futuro e não aceitá-lo. Quando pensamos na visão integrada das organizações, o que vês que te faz sentir alegria ou preocupação sobre os futuros organizacionais?

Peter Schein · Sem dar às novas empresas tecnológicas demasiado crédito, diria que é verdade que os inovadores revolucionaram ferramentas e processos de trabalho. Existem muitos exemplos. Termos como interligado, firmemente alinhado, fracassos rápidos, campo de distorção da realidade e honestidade radical, são pequenos pontos de luz num céu nocturno, que reflectem a ideia simples de que podemos trabalhar com mais inteligência.

Bob Johansen, amigo e colega do Institute for the Future de Palo Alto, descreve as organizações “mutáveis” do futuro, revelando a noção básica de que os gráficos organizacionais estáticos serão, na melhor das hipóteses, retrógrados em 2019. Esta ideia de mutação pode ser visto na “holacracia”, um esforço interessante feito pela empresa online de venda de vestuário Zappos e por outras organizações para libertar a inovação das tradicionais normas de comando e controlo.

Para muitos, isto pode ser demasiado extremo. As empresas globais e multifacetadas podem até vê-lo como irrelevante. Contudo, categoricamente, há poucas razões por que as ideias por detrás da “holacracia” – que é apenas uma abordagem para equipas dinâmicas, ad hoc e em autogestão – não devem ser um princípio para organizações de qualquer tamanho, assumindo que os líderes de topo estabeleceram uma confiança e abertura de nível 2 e estão dispostas a abrir mão do controlo hierárquico. Lidar com graus de controlo em vez de lidar com graus de liberdade, na minha opinião, é uma luta central para empresas jovens e inovadoras que tentam crescer como vencedoras com vários produtos e divisões.

Outro desenvolvimento interessante é a popularidade dos ORP, ou objectivos e resultados principais, para ajudarem as organizações a cumprirem os objectivos. Diversos fornecedores de software de Recursos Humanos, do Atiim ao Weekdone, oferecem plataformas para que indivíduos e equipas partilhem os seus objectivos e resultados principais com os colegas, com a premissa de que todos beneficiam por saberem o que os outros estão a fazer. Este modelo é uma iteração mais recente da familiar estrutura sociotécnica, que tenta ligar os objectivos e aspirações de todos os indivíduos de um grupo de trabalho ou de uma organização como um todo, aos principais imperativos estratégicos da organização. Os ORP incluem a partilha de prioridades, projectos e progressos, vertical e horizontalmente. Andy Grove usou-os como CEO da Intel e o investidor John Doerr apresentou-os à Google. O acrónimo complementar do ORP é o CFR, que representa conversas, feedback e reconhecimento. Com este imperativo da conversa, esta estrutura de gestão e controlo é reformulada com termos mais humanísticos e com aquilo que parecem ser valores mais humanos também.

Podemos acabar por considerar que a alquimia aqui consiste em ligar os benefícios técnicos da visibilidade, previsibilidade e responsabilidade com os benefícios sociais do envolvimento e empenho. Pode ser um passo em frente muito positivo, embora talvez não resolva a falácia da transparência. A transparência pode parecer um benefício humanístico na eliminação de segredos e, porém, pode ser apenas valioso quando é uma exigência num grupo ou organização que não possui abertura e confiança.

Mais uma vez, vemos a luta entre liberdade e controlo. Algo que é similarmente visto no paradoxo dos CFR. Se o principal objectivo é partilhar abertamente o que está a correr bem e o que precisa de ser alterado, o CFR pode ser muito eficaz no aceleramento de resultados. Contudo, se há mais ênfase no feedback, isto pode ser apenas uma camada de verniz num objectivo mais profundo de controlo de cima para baixo.

Se aprendemos algo num mundo de inovação, é que o ritmo importa. As inovações sociotécnicas podem estar a revigorar o humanismo no trabalho criativo, contudo se alguma dessas inovações nos processos abranda o passo, esperamos que a próxima inovação nos acelere de novo. Um novo líder pode ver um modo novo e melhor de fazer algo, baseado na confiança, abertura e reflexão. Acreditamos que isto acontece frequentemente. Todavia, um dos obstáculos que as organizações enfrentarão quando tentarem adaptar a sua cultura social é a preferência macrocultural por velocidade em detrimento da reflexão. Estas forças estão em tensão constante. Líderes seniores, principalmente os que supervisionam o desenvolvimento organizacional (DO) terão de continuar a pensar como etnógrafos e observadores para obterem a mistura certa.

Portanto, Ed, isto cria uma última observação e pergunta: por várias boas razões, o DO evoluiu drasticamente desde o teu último livro de cultura e liderança, principalmente para ajudar as organizações a aceitarem novas realidades e experimentarem novas abordagens. Qual a próxima direcção?

Ed Schein · As tendências no DO têm, há décadas, as suas próprias tribos de investigadores e praticantes, e vimos desenvolvimentos positivos em muitos vectores. Ainda bem que existe um interesse crescente na mudança na gestão, reflectindo a natureza mutável do trabalho em si. E fico satisfeito por ver tantas pessoas a falar da cultura, embora avise que alguns podem não ter conhecimentos adequados de dinâmicas culturais.

A necessidade de abertura e confiança ocorre em todas estas áreas. Porém, muitos dos modelos actuais de liderança, mudança e cultura ainda se prevêem partindo do pressuposto de que as relações de nível 1 – burocráticas e profissionalmente distantes – podem funcionar. Não podem. Outros modelos falam da importância da confiança mútua, mas nenhum a define nem faz propostas para a desenvolver.

A confiança acontece através de trocas de informações fundamentais e de uma partilha aberta, já que criamos relações que nos permitem intuir e antecipar as respostas dos outros, para prevermos que as próximas jogadas dos outros serão de apoio e colaboração e não de concorrência e egocentrismo. Desenvolver essa confiança ajuda-nos a trabalhar positivamente para objectivos mutuamente definidos. Reforça-se a si mesma e, para lá chegar, é preciso relações de nível 2.

Em suma, uma teoria positiva de abertura e confiança de nível 2 é a cola conceptual que junta cultura, mudança e liderança. Já percorremos um longo caminho, mas não posso deixar de pensar na pequena ironia de que a direcção para onde esperamos dirigir-nos seja a que Douglas McGregor tinha em mente com a sua maravilhosa Teoria Y como base para o lado humano das empresas.

 

Este artigo foi publicado na edição 105 da Human Resources. 

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