Entrevista com Filipa Jesus, Opensoft: «O mundo saiu à procura de talento e nós estamos a fazer o mesmo»
A falta de recursos humanos é uma realidade com impacto abrangente na economia. Com fortes consequências no sector tecnológico, esta escassez tem vindo a ser agudizada pela atratividade de Portugal junto de todo um ecossistema de empresas novas. Para perceber de que forma a Opensoft tem encarado esta questão e como tem sabido responder ao desafio, falámos com Filipa Jesus, Human Resource Manager da organização.
Por Sandra M. Pinto
Conhecida pelos projectos de engenharia de larga escala que tem implementado na Administração Pública, Saúde, Banca e Seguros, a Opensoft é uma tecnológica 100% portuguesa. A crescer a um ritmo de 15-20% ao ano num contexto de grande competitividade, a empresa tem encarado a esta escassez de talento em IT como mais um desafio.
Em que consistem os pilares da gestão de pessoas da organização?
Podemos destacar três pilares fundamentais na gestão de pessoas na Opensoft: a formação contínua, a avaliação de desempenho e a gestão de carreira. O investimento em formação é algo que caracteriza o percurso dos nossos recursos humanos desde a sua primeira hora na empresa, independentemente de serem recém-licenciados ou profissionais com experiência. As primeiras semanas são sempre formativas e a vários níveis, uma vez que abordamos não só as tecnologias de ponta que usamos, como as próprias metodologias de
trabalho (Agile, Scrum). Sendo que somos uma empresa certificada no modelo CMMI-DEV (Capability Maturity Model Integration), ter as pessoas por dentro do que são os nossos métodos é não só uma necessidade, mas um requisito.
Na avaliação de desempenho, temos um sistema que funciona a 360 graus, o que significa que cada pessoa faz uma auto-avaliação, recebe uma avaliação da sua chefia e dos colegas com quem trabalha mais diretamente. Porque temos um foco muito voltado para o colaborador, existe também um acompanhamento semestral realizada pelo departamento de Recursos Humanos, para ouvir cada pessoa e perceber se está motivada, satisfeita com os projectos, as equipas, as chefias, se as suas necessidades são atendidas e se existe bem-estar, que é muito importante para a retenção.
Em termos de gestão de carreira, trabalhamos com transparência, de forma que todas as pessoas que entram na Opensoft saibam exatamente em que categoria iniciam e o que é esperado delas em cada nível, para uma boa gestão de expectativas de parte a parte.
De que forma a Opensoft regressou à nova normalidade após pandemia?
Em reação à pandemia, ficamos totalmente remotos, pela primeira vez, em Março de 2020. Funcionou tudo muito bem, até porque tínhamos as ferramentas preparadas para as pessoas estarem operacionais, com uma produtividade normal, no dia seguinte à instituição do modelo remoto. Desde o momento em que o teletrabalho deixou de ser obrigatório e passou a ser recomendado, tivemos colaboradores que desejavam voltar ao escritório. Agilizamos esse regresso com todas as medidas de segurança previstas e a máxima flexibilidade.
Qual é hoje o modelo de trabalho adaptado?
Actualmente trabalhamos num modelo híbrido. Recomendamos um dia presencial por semana, mas é totalmente facultativo. Naturalmente que as nossas instalações estão disponíveis todos os dias para os colaboradores que prefiram trabalhar no nosso escritório.
A nossa ideia com este regime é manter a flexibilidade que as pessoas valorizam e não impor a ninguém uma situação que não seja a mais vantajosa em termos de gestão pessoal.
Estamos a meio de 2022, quais os maiores desafios que têm encarado nos seis meses passados?
Os maiores desafios com que nos deparamos são, sem dúvida, a atração e a retenção de talento. Não é segredo para ninguém que o recrutamento no setor IT está cada vez mais “selvagem” e todas as empresas do ramo sentem a dificuldade que é atrair recursos que são constantemente aliciados por outras empresas. Ainda assim, os níveis de rotatividade na Opensoft têm-se mantido baixos, o que significa que o esforço acrescido da empresa nesta matéria está a dar frutos.
A falta de recursos humanos é uma realidade com impacto abrangente na economia. De que forma tem esta situação impactado a organização?
A escassez de pessoas é, de facto, uma situação com consequências que nos preocupam, mas, felizmente, temos conseguido transpor isso com a ajuda dos nossos colaboradores que têm conseguido ultrapassar os desafios que vão surgindo, ou com um pouco de esforço adicional em alguns momentos, ou dividindo-se para chegar a tudo o que é necessário.
Temos também investido muito nos recém-licenciados. São perfis que, naturalmente, exigem muito dos colaboradores seniores até estarem
operacionais, mas que a tempo dão um contributo importante para a gestão diária dos projectos.
Diria que esta escassez de talento IT representa um desafio maior para as empresas mais instaladas no mercado?
Sim, sem dúvida. A escassez de profissionais de IT e a competição entre empresas do sector já se verificava antes; o que a pandemia veio trazer de novo foi um sem número de empresas estrangeiras, de todo o mundo, que decidiram fixar-se em Portugal ou que começaram a contratar portugueses para trabalharem em regime 100% remoto, com salários impossíveis de acompanhar pelo mercado nacional. O mundo saiu à procura de talento e nós estamos a fazer o mesmo!
Num contexto de competitividade enorme com empresas substancialmente mais jovens, ágeis e (ditas) disruptivas, mas a crescer a um ritmo de 15-20% ao ano, qual a fórmula de sucesso da Opensoft?
Acima de tudo, procuramos garantir o interesse das pessoas. Quando um técnico entra na Opensoft, sabe que vai trabalhar em projetos com um volume de dados extremamente elevado, com impacto positivo no dia-a-dia das pessoas, e isso são argumentos de peso.
Adicionalmente, vemos na estabilidade outro fator bastante relevante, nomeadamente no que diz respeito à garantia de flexibilidade e ao equilíbrio entre a vida pessoal e a vida profissional.
Que factores de atratividade tem usado para atrair e reter tanto profissionais experientes, como perfis em início de carreira?
A Opensoft posiciona-se como um espaço primordial para o desenvolvimento profissional da sua equipa, especialmente sendo uma empresa especializada e certificada no desenvolvimento de software.
Além disso, propomos um pacote remuneratório competitivo e um conjunto de regalias adicionais, por exemplo dias extra de férias.
A nossa preocupação genuína com o bem-estar dos nossos colaboradores levou-nos a instituir num plano de formação e de gestão de carreia onde apoiamos os colaboradores no desenvolvimento da sua formação técnica e em soft skills.
Olhando para o futuro de que forma encaram esta situação?
Acreditamos que, mais cedo ou mais tarde, vamos atingir um equilíbrio mais saudável entre a oferta e a procura de talento tecnológico. Mas, no imediato, o recrutamento no sector vai manter-se deficitário, sendo muito difícil uma empresa portuguesa competir com ofertas elevadas de empresas estrangeiras. Há que dizer que algumas das pessoas que assumem compromissos com negócios internacionais depois recuam e voltam ao mercado português, em regime total ou de freelancing, o que significa que nem tudo o que se imagina sobre as
empresas das tecnologias da moda, como o mobile, o data science ou o machine learning se concretiza.
Esta é uma situação particularmente desafiante para os gestores de recursos humanos e que, no curto prazo, achamos que deve ser endereçada através da promoção da formação em IT. Neste momento existe muita oferta para poucos recursos disponíveis!