Cinco princípios fundamentais para desenvolver (bons) líderes

Espero que a esta altura do campeonato ninguém duvide do impacto que a liderança tem nos resultados. O mundo da política, dos negócios, do desporto e muitos outros têm vindo a revelar como ter líderes mais fortes, faz toda a diferença não só no “como” lidamos com os desafios, mas principalmente nos resultados que se alcançam.

Por Miguel Sequeira Nunes, vice-presidente de marketing e vendas da BTS para o sul da Europa

 

Após tudo o que pudemos observar nos últimos 12 meses, se ainda existem cépticos em relação ao poder da liderança e do seu efeito, permitam-me que acrescente alguns dados adicionais inclusive anteriores à pandemia.

Aproximadamente há três anos, a empresa multinacional de tecnologia e software SAP publicou o impacto financeiro do engagement e da rotatividade dos colaboradores. Os indicadores analisados permitiram as seguintes conclusões: cada ponto percentual de melhoria ou deterioração do indicador de engagement tinha um impacto entre 35 e 40 milhões de euros na rentabilidade da empresa, enquanto que cada ponto percentual na rotatividade dos colaboradores tinha um impacto quantificado entre 40 e 50 milhões de euros.

É sumamente evidente que as organizações que contem com bons líderes desenvolverão a sua actividade de forma mais efectiva e sustentável ao longo do tempo. Graças a essas evidências, vivemos quase que uma “febre” da liderança onde analisamos e publicitamos os bons e maus exemplos em redes sociais, partilham-se frases inspiradoras sobre o que significa ser um líder, etc.

Mas se é tão importante assim contar com bons líderes, quais são então os factores de sucesso para conseguir desenvolver líderes? Baseados na nossa experiência a trabalhar com organizações de referência ao redor do mundo e nas investigações que temos feito ao longo dos últimos anos descobrimos que existem cinco princípios de trabalho que, se aplicados correctamente a uma iniciativa de desenvolvimento de liderança, contribuem para uma construção mais acelerada e profunda dos comportamentos necessários.

O primeiro princípio é que qualquer esforço de desenvolvimento de líderes exige uma imersão no modelo de negócio da organização, ou seja, deve considerar o tipo de negócio, a estratégia e iniciativas estratégicas da organização e a cultura que se observa actualmente, bem como a que se deseja para o futuro.

Invariavelmente continua a observar-se uma generalização das skills de liderança. É quase que hilariante ouvir muitas organizações hoje em dia a partilhar que a sua estratégia é única, a sua cultura é singular, mas a sua formação de líderes é a mesma que muitas outras empresas, o “último grito do mercado”.

Existem inequivocamente características, atributos e capacidades de liderança ditas universais mas a sua aplicação deve ser contextual. Ter em conta o que fazem outros e aprender dessas experiências aplicadas ao nosso contexto de negócio, sem sombra de dúvida, mas quando falamos de pessoas, a técnica do copy/paste tem uma boa probabilidade de não resultar.

O segundo princípio sustenta que a liderança (e as suas capacidades) demonstra-se em momentos, em fazer determinadas coisas particularmente bem em momentos críticos do dia-a-dia aproveitando-os assim para marcar a diferença e ter um impacto real no negócio.

Dominar as capacidades de liderança não é fácil. Saber aplicá-las é ainda mais difícil. Por isso, o desenvolvimento de capacidades de liderança deve começar pela identificação dos momentos em que é imprescindível manifestar, evidenciar e pôr em prática os comportamentos associados às capacidades de liderança.

Por exemplo, numa empresa que queira incutir mais agilidade e resposta à mudança não se trata somente de ter uma tomada de decisão rápida e ágil por parte dos líderes, mas de ser capaz de reconhecer aqueles momentos críticos onde ter uma tomada de decisão rápida e ágil pode fazer toda a diferença.

Estes momentos críticos são, em realidade, momentos comuns na vida diária de uma empresa e podem ser momentos planeados (rotinas comerciais por exemplo) ou momentos inesperados (quando existe um conflito entre áreas). O importante é perceber que, para existir uma adopção de novos comportamentos mais rápida, ajudar os líderes a reconhecer os momentos onde esses comportamentos fazem toda a diferença é uma parte importante do processo.

O terceiro princípio refere-se à importância do mindset (ou mentalidade) no processo de mudança e adopção de novos comportamentos. Este princípio baseia-se numa investigação que a BTS realizou com a Universidade de Singapura, a partir da análise de mais de 120.000 conversas de coaching.

Este estudo permitiu-nos descodificar 33 mindsets que apareciam recorrentemente nessas conversas, e como a falta de foco em trabalhar ditos mindsets limita (e muito) o resultado desejado das iniciativas de desenvolvimento de líderes.

A razão é muito simples: sem mudar os nossos mindsets a probabilidade de adquirir novos hábitos e comportamentos é mínima.

O quarto princípio também tem várias demonstrações e evidências científicas: as pessoas aprendem melhor de e com outras pessoas. Por isso, e ainda que vivamos uma era de aprendizagem digital e virtual na qual já existem conteúdos muito interessantes e de alta qualidade, o factor humano continua a ser essencial e diria que não se pode nem deve substituir.

As iniciativas e projectos de desenvolvimento de líderes devem combinar experiências de aprendizagem presencial ou virtual (com outras pessoas) com conteúdos digitais acessiveis in the flow of work, ou seja, quando são necessários para a sua aplicação.

O último princípio é talvez o mais evidente mas ao mesmo tempo o mais negligenciado. Mudar comportamentos e adoptar novos hábitos não se faz da noite para o dia, não implica simplesmente carregar num botão e esperar que as novas formas de trabalho já estejam implantadas. Todos nós somos humanos e sabemos o difícil que é adquirir novos hábitos.

Com isto em mente, a chave do sucesso está em aplicar jornadas de transformação deliberadamente desenhadas para a adopção de novos comportamentos. Essas jornadas com certeza vão ter diferentes conteúdos, sessões formativas, etc. mas têm de ter dois ingredientes importantes: provocam os líderes a experimentar os comportamentos a adoptar e medem resultados e aplicação numa base constante para medir o processo de mudança.

Ainda se vêem muitas organizações com acções de formação isoladas, uma palestra aqui e ali sem um foco na aplicação e na experimentação. Lembre-se: ninguém adquire hábitos saudáveis de exercício físico e peso adequado fazendo exercício uma vez por outra ou ocasionalmente. É preciso manter uma cadência, uma intensidade que permita a experimentação e a aplicação dos novos comportamentos.

Em resumo, não ter em conta estes princípios é provavelmente um convite ao fracasso ou simplesmente deixar as coisas nas boas intenções. Se realmente queremos apostar numa adopção rápida e acelerada de comportamentos (até porque o mundo hoje não espera) estes princípios são chave para traçar esse caminho.

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