O que muda na lei laboral em 2023: As alterações (já aprovadas)

A Comissão de Trabalho, Segurança Social e Inclusão tem estado a analisar e votar na especialidade as normas da Proposta de Lei que prevê alterações ao Código do Trabalho. Várias já foram aprovadas. Mas se umas são expectáveis e justificáveis, outras há que nos parecem injustificadas e criticáveis.

 

Por Sofia Silva e Sousa, sócia contratada da Abreu Advogados

 

Em matéria de legislação laboral, o ano de 2022 fica marcado pela aprovação, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 15/XV (a “Proposta de Lei”) que prevê, entre outras, importantes alterações ao Código do Trabalho no âmbito da Agenda do Trabalho Digno e, também, alterações ao Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social.

Já o novo ano de 2023 ficará certamente marcado pela expectável conclusão do processo de discussão e aprovação das normas contidas na Proposta de Lei – prevista para o final deste mês de Janeiro – e pela entrada em vigor das alterações – prevista para o próximo mês de Março.

Desde Novembro de 2022 até agora (início de Janeiro), a Comissão de Trabalho, Segurança Social e Inclusão tem estado a analisar e votar na especialidade as normas da Proposta de Lei, tendo sido já objecto de aprovação um conjunto muito significativo de normas.

Assim, apesar de o processo de análise e votação na especialidade da Proposta não estar ainda concluído, já existem várias alterações que podem ser consideradas como (praticamente) certas.

A nosso ver, as alterações com maior potencial de impacto prático já aprovadas na especialidade respeitam às seguintes temáticas:

Teletrabalho. Os acordos de teletrabalho devem fixar um montante a ser pago ao trabalhador respeitante a despesas adicionais;

Contratos temporários a termo. A duração de contratos de trabalho temporário a termo sucessivos em diferentes utilizadores, celebrados com o mesmo empregador ou sociedade que com o mesmo se encontre em relação de domínio ou de grupo, ou mantenha estruturas organizativas comuns, passa a não poder ser superior a quatro anos;

Retribuição do trabalho suplementar. O trabalho suplementar que exceda as 100 horas anuais passa a ser pago pelo valor da retribuição horária com os seguintes acréscimos: 50% pela primeira hora ou fracção desta; 75% por hora ou fracção subsequente, em dia útil; 100% por cada hora ou fracção, em dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, ou em feriado;

Licença parental exclusiva do pai. Alargamento da duração da mesma (para 28 dias);

Período experimental relativo aos jovens à procura de primeiro emprego e desempregados de longa duração.
O actual período experimental de 180 dias é reduzido ou eliminado no caso de anterior contrato de trabalho a termo, estabelecido com outro empregador, ter tido uma duração igual ou superior a 90 dias;

Presunção de laboralidade no quadro das plataformas digitais.
É estabelecido que a presunção operará preferencialmente com a plataforma digital, podendo esta contestar judicialmente e requerer que o vínculo seja declarado existente com o intermediário;

Aumento do valor da compensação por cessação dos contratos a termo.
Passa para 24 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de trabalho;

Proibição de recurso a outsourcing por parte de empresas para satisfação de necessidades que foram asseguradas por trabalhador cujo contrato tenha cessado nos 12 meses anteriores por despedimento colectivo ou despedimento por extinção de posto de trabalho;

Proibição de extinção dos créditos do trabalhador emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação por meio de remissão abdicativa.

 

Análise
Fazendo uma apreciação genérica das alterações já aprovadas na especialidade, entendemos ser possível afirmar que se, por um lado, existem alterações que à luz da Agenda do Trabalho Digno eram expectáveis e justificáveis, outras há que nos parecem injustificadas ou que nos parecem não serem aptas a resolver cabalmente as questões visadas, sendo, por isso, criticáveis.

No grupo de medidas não aptas a resolver cabalmente as questões visadas encontra-se, por exemplo, a alteração referente à obrigatoriedade de o acordo de teletrabalho (e o contrato colectivo de trabalho) fixar o valor da compensação devida ao trabalhador pelas despesas adicionais (nos termos do texto aprovado, na ausência de acordo entre as partes sobre um valor fixo, consideram-se despesas adicionais “as correspondentes à aquisição de bens e ou serviços de que o trabalhador não dispunha antes da celebração do acordo”, assim como “as determinadas por comparação com as despesas homólogas do trabalhador no último mês de trabalho em regime presencial”).

Nesta matéria, a (recente) Lei n.º 83/2021, de 6 de Dezembro, veio determinar a obrigação de as empresas suportarem as despesas acrescidas com o teletrabalho, designadamente as respeitantes à energia, internet e aquisição de equipamentos, referindo que tais custos seriam considerados, para efeitos fiscais, custos para o empregador, não constituindo rendimento do trabalhador.

Sucede que, não existindo comprovativo dos custos acrescidos o montante, em princípio, terá de ser tributado em sede de IRS, o que, aliás, foi recentemente realçado pela Autoridade Tributária.

Deste modo, a previsão de um custo fixo no acordo, sem que do lado da legislação fiscal exista um ajuste, implicará que o montante seja tributado em IRS sendo, por outro lado, do ponto de vista laboral, sujeito à presunção de natureza retributiva, nos moldes gerais, pelo que o cerne da problemática permanece por resolver.

No grupo de medidas que, a nosso ver, são injustificadas, encontram-se, designadamente, as alterações respeitantes à proibição de recurso ao outsourcing e à impossibilidade de extinção dos créditos laborais do trabalhador por meio de remissão abdicativa.

Relativamente à primeira, entendemos que a alteração em causa – que poderá, inclusive, colocar questões de inconstitucionalidade – configura, de qualquer modo, uma intromissão e limitação excessiva e injustificada à liberdade de empresa, à iniciativa privada, e à liberdade de gestão do empregador, protegidas constitucionalmente.

 

Leia o artigo na íntegra na edição de Janeiro (nº.145)  da Human Resources, nas bancas.

Caso prefira comprar online, tem disponível a versão em papel e a versão digital.

Ler Mais