Em busca de equilíbrios na lei laboral (que parece esquecer o lado das empresas)

No âmbito da XXV Conferência Human Resources Portugal, que decorreu ontem, no Museu do Oriente, em Lisboa, o painel “A Lei Laboral na Gestão de Pessoas – Que mudanças Portugal precisa?” juntou Ana Gama Marques, directora de Recursos Humanos da Altice Portugal, e Nuno Ferreira Morgado, partner da PLMJ Advogados, com a moderação de Ricardo Florêncio, CEO do Multipublicações Media Group.

 

Para o arranque do debate, Ricardo Florêncio apresentou as conclusões de um estudo que o Multipublicações Media Group realizou junto dos principais responsáveis de empresas em Portugal para aferir as mudanças que estes consideram necessárias nas leis laborais. No inquérito, os temas urgentes mais referidos pelos inquiridos foram:

  • simplificar as leis laborais no sentido de serem mais fáceis de entender;
  • implementar e desburocratizar;
  • flexibilização dos horários atendendo aos novos modelos de trabalho;
  • ter em conta os modelos de trabalho e a combinação dos interesses dos colaboradores e das empresas;
  • flexibilização dos vínculos contratuais;
  • flexibilização dos tipos de remuneração/ revisão da tributação do trabalho;
  • flexibilização das políticas de despedimentos / redução da carga horária / redução de salários;
  • criar regimes de contratação, como o contrato intermitente, em função das especificidades de alguns sectores de actividade;
  • introdução da reforma a tempo parcial;
  • flexibilizar a acumulação de reformas com trabalhos parciais remunerados;
  • recuperar o regime de banco de horas por acordo individual;
  • instituir o período de regime de período normal de trabalho anual.

Ana Gama Marques considera que a legislação que está actualmente em cima da mesa para ser implementada protege o colaborador, mas esquece o lado das empresas e a evolução do mercado de trabalho nos últimos anos. O teletrabalho está hoje generalizado e todas as funções que se enquadram neste regime concorrem num mercado global, o que não parece ser compatível com as leis que estão a ser consideradas. «A legislação devia estar orientada para manter o nosso talento em Portugal e não para entregá-lo a países com leis mais flexíveis», comentou. «Além disso, a legislação deveria ter alguma estabilidade e previsibilidade. Não podemos estar no domínio da incerteza.»

A directora de Recursos Humanos da Altice salientou também que a nova legislação parece «fechar os novos contratos a um contrato sem termo, equiparando os vários regimes que existem. Mas, na verdade, nem todos querem contratos sem termo. Muitos colaboradores mais jovens querem o trabalho temporário e também há lugar para o outsourcing e até para a prestação de serviços individual». Desta forma, Ana Gama Marques defendeu que a legislação deve ter em conta que existem diferenças que as pessoas sentem que essas diferenças são necessárias.

Outro tema está relacionado com os novos modelos de trabalho. «Muitas vezes a legislação tenta impor regras que não são totalmente necessárias. Em alguns casos, a lei está a obrigar a que as pessoas, durante oito anos, se apresentem fisicamente ao trabalho uma vez de dois em dois anos. Isto nem é benéfico para a saúde mental dos colaboradores, nem favorece a conexão entre as empresas e as pessoas. Além disso, isto pode trazer problemas na atracção para funções onde esta flexibilidade não é possível. É preciso gerir equilíbrios».

Nuno Ferreira Morgado também considera que existe um desalinhamento entre a realidade legislativa e a das empresas. Temas como a felicidade, o propósito ou o desenvolvimento individual apresentam-se como radicalmente diferentes do paradigma da lei, que assume que «o empregador é um abusador e é preciso criar regras para limitá-lo e conter os seus poderes ao estritamente necessário». Para o partner da PLMJ, este paradigma está praticamente extinto e isto acontece porque «quem faz as leis são pessoas que não têm experiência profissional em empresas, fechadas dentro de um hemiciclo, apoiadas por pessoas que estão fechadas em escritórios de advogados». Além disso, «tudo é feito num espaço de tempo absurdo, num processo que não é aberto à sociedade, em que os trabalhadores são ouvidos através de confederações sindicais e as empresas são ouvidas através de confederações patronais». O resultado é uma lei desajustada da realidade.

Nuno Ferreira Morgado realçou que Portugal é um dos poucos países europeus onde ser um mau trabalhador não tem nenhuma consequência ou, quando tem, é diminuta. Muitas vezes, as pessoas não se enquadram nas funções que estão a realizar nas empresas, e o advogado defende que não existe nenhuma forma ágil de permitir às empresas alinhar as competências. «Em parte, o emprego em Portugal é mal pago porque não conseguimos ter este alinhamento, e manter estes trabalhadores tem um custo que impede que outros cresçam e se desenvolvam para outras carreiras».

Um outro ponto foi a questão da rigidez dos modelos e horários de trabalho. Para Nuno Ferreira Morgado, as empresas querem poder gerir os seus trabalhadores com liberdade e dar-lhes as ferramentas para gerirem os seus tempos de trabalho com responsabilidade.

Como consequência deste desalinhamento entre a lei laboral e a realidade das empresas, Ana Gama Marques realçou que algumas das leis, actualmente em cima da mesa, não deveriam ser implementadas. Além disso, «as leis não são claras, nem para o trabalhador, nem para o empregador. As empresas deviam ser ouvidas para serem criadas leis que permitissem o equilíbrio entre os dois lados e que dessem resposta a um mercado global».

Já Nuno Ferreira Morgado referiu que é bom «termos empresas que passam um pouco por cima da lei, porque se não fosse assim, tínhamos um problema muito grande».

 

Foto NC Produções

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