A IA Generativa vai “atacar” e as primeiras vítimas serão os trabalhadores remotos. Saiba porquê

Existem três razões pelas quais este período de automatização é diferente dos anteriores, segundo a Harvard Business Review. No passado, os primeiros a ser “atingidos” foram os trabalhadores na indústria e no comércio. Depois, chegou aos escritórios com os primeiros computadores. Só que os salários e as competências não aumentaram para todos.

Entretanto, recentemente, a maioria dos chamados “trabalhadores do conhecimento” tem visto o oposto: a automatização anunciou um trabalho mais desafiante, criativo, que aumenta as competências e que paga melhor. A pandemia e o novo mundo do trabalho remoto deram a estes profissionais ainda mais autonomia e uma vida mais equilibrada.

Décadas de investigação em áreas como a economia do trabalho, psicologia e sociologia indicam que os trabalhadores de “colarinho branco” têm mais a ganhar com a automatização. Um gestor sénior com MBA lida com inúmeras tarefas não rotineiras baseadas em decisões e apreciações, tirando o máximo proveito da tecnologia que automatiza o trabalho rotineiro.

Porém, a história parece estar a mudar.

Agora, trata-se de uma questão de presença física. Se trabalha (ou poderia estar) remotamente, muitas das suas tarefas poderão em breve ser automatizadas, já os trabalhadores que têm de estar no escritório para obter resultados estarão em terreno mais seguro. Isto significa que alguns trabalhadores remotos irão perder os seus empregos, mas muitos deles irão experimentar enormes mudanças e enfrentar um grande desafio de reskilling.

Para entender o porquê, é preciso começar por novos modelos preditivos sobre a “exposição” à Inteligência Artificial Generativa (IA Gen). Segundo pesquisas recentes, quanto mais expostos estiverem os empregos à IA Gen, maior será o seu potencial aumento de produtividade.

Por exemplo, Daniel Rock (colaborador da Wharton) e os seus co-autores da OpenAI descobriram que se os serviços de apoio ao cliente adoptassem a IA Gen — na sua actual forma, pouco refinada e incompleta — poderiam ver ganhos de produtividade de 50% em metade das tarefas. Neste sentido, engenheiros de Blockchain, escritores e matemáticos também se enquadram no grupo de totalmente expostos.

No geral, a pesquisa dos autores sugere que 80% dos adultos têm empregos com 10% de exposição, enquanto 19% têm empregos com pelo menos 50% de exposição. Contudo, a maioria dos profissionais pode obter aumentos de produtividade com o uso da IA Gen.

Na verdade, esse cenário já se verifica. O estudo recente da Microsoft sobre a força de trabalho (com mais de 31 mil pessoas em 31 países) mostra que, em Maio, 75% dos profissionais inquiridos ​​usavam IA Gen no seu trabalho diário – um número que quase duplicou desde Janeiro – e 78% desses trabalhadores adoptaram essas ferramentas de forma independente. E os seus empregadores não ficam muito atrás, o inquérito da Gartner de Outubro de 2023 indicou que 55% das empresas estavam a testar ou a lançar projectos LLM.

O ritmo e o alcance da adopção da IA Gen são surpreendentes, mas de uma perspectiva histórica e macroeconómica, tudo isto poderá significar uma taxa invulgar de mudanças nos empregos. A IA Gen ficou instantaneamente disponível, gratuita e útil para 2,6 mil milhões de pessoas (80% dos trabalhadores adultos em todo o mundo), portanto, a forma de trabalhar será rapidamente ajustada, em comparação com anteriores tecnologias de uso geral. Os motores de combustão interna, o telefone e a Internet levaram várias décadas a difundirem-se; eram caros, difíceis de distribuir ou exigiam novas infraestruturas. Essas décadas extra deram a oportunidade de uma maior adaptação.

Agora há três forças maiores em acção que perturbam esse cenário de “disrupção”, que devem levar a antecipar mudanças de emprego ainda mais rápidas e abrangentes, especialmente para os trabalhadores remotos.

Facilidade de uso

A primeira está bem à vista: a IA Gen está a ser aproveitada através de aplicativos fáceis de usar. Pense na IA Gen como o aparecimento da electricidade e do motor eléctrico: um recurso extremamente poderoso que, em teoria, poderá ser usado para muitas coisas, mas que, no imediato, não é tão bom para nenhum trabalho específico. Depois da electricidade, surgiram as máquinas de lavar louça, bombas de água, serras circulares e afins. Muitas empresas estão a construir agora o equivalente para IA Gen. Alguns recursos do Copilot da Microsoft, como o “coach de escrita” – integrado ao pacote Office – são um exemplo claro. Um artigo sugere que, à medida que esta evolução acontece, a exposição (e, portanto, a utilidade) aumentará drasticamente para muitos trabalhadores: por exemplo, o emprego médio nos EUA terá 47-56% de exposição, e não 10%.

As organizações já estão preparadas para a IA Gen

Em segundo lugar, as empresas também se pré-configuraram para facilitar a automatização da IA Gen: pelo menos desde o advento da telefonia, mas especialmente em resposta à pandemia, concentraram tarefas digitais para permitir que milhões de pessoas trabalhassem remotamente. O “2020 Covid-19 digital transformation report” da McKinsey comprova-o: os gestores calculavam que um aumento útil no “trabalho ou colaboração remota” levaria 454 dias, quando na verdade demorou 10,5, 43 vezes mais rápido que o esperado.

De momento, a IA Gen só consegue lidar com tarefas digitais, isso significa que se um profissional puder trabalhar remotamente a full-time, a IA Gen pode ser usada de forma produtiva para ajudar nas tarefas, mais do que alguém que tem de trabalhar presencialmente.

A IA Gen está a tornar-se mais autónoma

A terceira força é um aumento iminente na autonomia da IA Gen. A ferramenta que conhecemos é principalmente passiva. Pergunte e ela fará o trabalho, mas apenas parte dele e com uma memória fraca e limitada.

Mas a OpenAI, Google e Anthropic – os três titãs da IA Gen – têm sido bastante transparentes e esperam disponibilizar nos próximos três a seis meses sistemas altamente autónomos que resolvam esses problemas.

Em breve, será possível delegar tarefas complexas a qualquer sistema de IA Gen, que lidará proactivamente com grande parte do trabalho, incluindo fazer perguntas para maior clareza e formar pequenas equipas de agentes a quem possa delegar. Qualquer utilizador de IA Gen terá efectivamente de aprender como gerir organizações automatizadas de agentes artificiais.

Alguns perderão os seus empregos no longo prazo, mas para cem milhões de trabalhadores remotos em todo o mundo, estas forças conspirarão para facilitar mudanças de emprego relativamente drásticas e rápidas.

O foco adequado em resposta a este tsunami de mudança é a requalificação. As empresas e os trabalhadores devem investir na aprendizagem e no desenvolvimento necessários para preparar os profissionais e ajudá-los a adaptar-se à medida que estas mudanças acontecem.

Para exemplificar: se um profissional trabalha remotamente, deve concentrar-se em desenvolver skills de gestão e aprender a supervisionar um grupo de agentes de software altamente autónomos para fazer o trabalho. Isso inclui competências como saber delegar, o que significa comunicar claramente o que pretende e dar feedback para orientar o desempenho, assim como ao gerir outras pessoas.

De um modo mais geral, as empresas que não conseguirem enfrentar este desafio de requalificação não só perderão a verdadeira vantagem de produtividade da IA Gen; ao não prepararem as suas pessoas, podem também alienar a própria força de trabalho humana que — pelo menos num futuro próximo — permanece no centro da sua vantagem competitiva.

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